Alexandrina de Balasar

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"Eu sou
o teu Mestre"

 

Capítulo 7

AS LIÇÕES

1934-1935

Conhecido o Mestre e indicada a Escola, venham as lições.

Uma das mais insistentes que o Mestre lhe dá refere-se às disposições da Discípula, para bem O ouvir e aprender: o desprendimento do mundo, o silêncio. É essencial na pedagogia divina este silêncio; já o lembra o Espírito Santo, quando diz que leva a alma à solidão, para aí lhe falar ao coração.

Mas oiçamos a Alexandrina:

Tenho momentos que me sinto tão abatida e sem nenhum fervor! E, pensando eu na minha indignidade, diz-me Nosso Senhor que escolhe os fracos, para os tornar fortes e que é debaixo das minhas faltas que Ele esconde o seu poder, o seu amor e a sua glória. Pede-me para eu esquecer o mundo e me entregar toda a Ele:

— Abandona-te nos meus braços que Eu te escolherei os caminhos. (27.9.34)

Nosso Senhor diz-me que quer que eu morra para o mundo e o mundo morra para mim. Ele é que é o mundo para quem eu hei de viver, e em quem hei de pensar, amar e imitar; que nele encontro todos os tesoiros. (4.10. 4)

Eu às vezes digo assim: ó meu Jesus, eu quero ser toda vossa e só para Vós quero viver. E o meu Jesus diz-me assim:

— O minha querida filha, Eu quero que sejas toda, toda minha e que só para mim vivas e que só a mim ames e só a mim procures. (26.10.34)

Quantas vezes Jesus lhe manda aprender esse silêncio e desprendimento no Sacrário!

Mas o que o Senhor mais lhe inculca, para que ela o compreenda, viva plenamente, é a missão a que a destinou desde toda a eternidade: a missão de vítima pelos pecadores. Longe iríamos se transcrevêssemos de suas cartas tudo o que a este ponto se refere. Algumas passagens ao menos. Já acima vimos como ela, sem saber como, se ofereceu a Nosso Senhor como vítima. De longe começara o Espírito Santo a despertá-la e a orientá-la para esta missão. Até que a 6.9.34, lhe dirige pela primeira vez o célebre convite a que ela se refere, em carta ao director espiritual, nos termos seguintes:

Vou fazer também um grande sacrifício, Nosso Senhor bem o sabe e V. Rev.cia também faz uma ideia do quanto me custa; mas antes de o fazer, ofereci-o ao meu bom Jesus.

Quinta-feira, dia 6, o Sr. Abade veio trazer Nosso Senhor a uma doente, minha vizinha e ao mesmo tempo trouxe também para mim. Depois de comungar, não sei como fiquei: estava fria, parecia que não sabia dar graças. Mas louvado seja o meu bom Jesus: não olhou para a minha indignidade nem para a minha frieza. Parecia-me ouvir dizer:

— Dá-me as tuas mãos que as quero cravar comigo,

dá-me os teus pés que os quero cravar comigo,

dá-me a tua cabeça que a quero coroar de espinhos, como me fizeram a mim;

dá-me o teu coração que o quero trespassar com a lança, como me trespassaram a mim.

Consagra-me todo o teu corpo, oferece-te toda a Mim, que te quero possuir por completo e fazer o que me aprouver.

Foi isto bastante — continua ela — para me ter tido muito preocupada. Não sabia o que havia de fazer. Calar-me e não dizer nada? Parece-me que o meu Jesus não queria que eu ocultasse isto. Isto repetiu-se na sexta-feira e hoje dia de Nossa Senhora (dia 8 de Setembro), assim como a (recomendação da) obediência em tudo, como já expliquei a V. Rev.cia.

Este convite do Mestre vai repetir-se amiudadas vezes, por exemplo, em Outubro (carta de 11.10.34):

Quando Nosso Senhor me pede o meu corpo, quando chega à coroação de espinhos, diz-me:

— Que dores horríveis Eu senti quando me coroavam de espinhos! Perdi tanto sangue, tanto inútil! Fiquei exausto de forças. As minhas carnes despedaçadas; até a minha beleza desapareceu. E no meio de tantos algozes, queres, minha querida filha, participar comigo de toda a minha Paixão? Oh, não me dês uma negativa: ajuda-me na redenção do género humano!

Este convite, tão vibrante e tão claro foi aceite generosamente, mas essa crucifixão irá, nas suas realizações, até grandes extremos, como veremos, sobretudo daí a quatro anos. Por isso, o trabalho de Jesus agora é confirmá-la, adestrá-la para o perfeito cumprimento dos seus divinos desígnios.

Minha filha, minha filhinha, se soubesses o bem que te quer a Providência; se soubesses como és amada no Céu pela Santíssima Trindade!

Corresponde a este amor. Anda para os meus Sacrários. Vive lá. É de lá que vem a força para tudo. Ama-me muito; pensa só em mim. Deixa o mundo e tudo o que nele existe que é nada.

A missão que te confiei são os meus Sacrários e os pecadores; elevei-te a tão alto grau. É o meu amor. Por ti serão salvos muitos, muitos, muitos pecadores; não pelos teus merecimentos, mas por mim que procuro todos os meios para os salvar. (20.12.34)

Já a 15.12.34, ouvia ela:

Sê a minha vítima de reparação pelos pecados do mundo e assim me consolarás muito. Peço-te o sacrifício de vires passar parte desta noite comigo, nos meus Sacrários. Tem pena de mim; tem pena do Prisioneiro do Amor, nesta quadra em que sou tão ofendido! Anda formar com as tuas dores um abrigo sobre os meus Sacrários, para que não venham sobre Mim os crimes. Eu te prometo grande recompensa. Nossa Senhora e a Santíssima Trindade ficam-te muito agradecidos.

E pediu-me — continua ela — que guardasse silêncio o mais que pudesse. Eu atendi ao pedido de Nosso Senhor e que bela noite eu passei! Até depois da meia-noite estive alerta: cantava, rezava, pedia ao meu Jesus que me desse a bênção de todos os Sacrários do mundo.

E estamos no ano de 1935.

No dia 4.1 — escreve ela ao director — pouco depois da sagrada Comunhão, falava-me Nosso Senhor e dizia-me:

— Queres encontrar-Me, minha filha? Procura-me no teu coração e na tua alma. Habito lá a penetrar em ti mais e mais o meu amor e a santificar-te mais. O teu coração é o meu sacrário e a ti é sempre nos meus Sacrários que Eu te quero encontrar a pedir-me pelos pecadores, e quero que me digas muitas vezes que és toda minha.

Se soubesses como Me consolas! E como acodes aos pecadores só em Me dizeres que és minha vítima!

A minha paga é o meu amor e um lugar no Céu tão lindo, tão lindo, muito perto de Mim, muito unidinha a Mim. Se tu pudesses vê-lo, seria o bastante para a tua morte: morrerias de alegria. Não penses em nada deste mundo que não és dele. Ama-Me muito. Olha que te confio os meus Sacrários e os pecadores.

Para mais despertar a sua generosidade, Jesus repetidíssimas vezes lhe mostra o estado do mundo: pecado, pecado e mais pecado!

Minha filha — diz Jesus a 3.1.35 — o sofrimento e a Cruz é a chave do Céu. Sofri tanto para abrir o Céu à Humanidade, e para tantos é inútil!

Dizem: quero gozar, não vim ao mundo para mais nada. Quero satisfazer as minhas paixões.

Dizem: não há inferno! Eu morri por eles e dizem que não Me mandaram; e contra Mim dizem heresias e proferem blasfémias.

Eu para os salvar escolho as almas: ponho-lhes sobre os ombros a cruz e sujeito-me a auxiliá-las. E feliz da alma que compreende o valor do sofrimento! A minha Cruz é suave sendo levada por meu amor.

E disse-me Nosso Senhor — prossegue ela — que se eu sofresse alegre e resignada por seu amor todos os sofrimentos que Ele me enviasse, que abriria o céu a milhares e milhares de pecadores.

Disse-me também que mandasse dizer a V. Rev.cia, que nesta quadra eram mais as almas que se perdiam do que as que se salvavam. Que queria guerra aberta contra o pecado da impureza, que era com que o inferno estava mais povoado.

Em carta de 27.1.35:

No dia 13, das 8 às 9 da noite, estava a rezar a estação ao Santíssimo Sacramento e já me parecia que Nosso Senhor me falava. No fim fiz a comunhão espiritual e então dizia-me Nosso Senhor:

— Ouve, minha filha, e atende ao pedido do teu Jesus: anda fazer-me companhia nos meus Sacrários, nesta noite, nestas horas em que Eu sou mais ofendido.

Não me deixes sozinho, tem pena de Mim! Anda com essas tuas dores e com as tuas orações sustentar o braço da minha justiça, prestes a cair sobre os pecadores, que ainda para alguns o baixarei sem castigar; mas para muitos não! Muitos no pecado e daí a poucos momentos no inferno!

Eu morri por eles e por eles dei o meu sangue e por eles fiquei nos Sacrários há tantos séculos; e lá estarei até ao fim. Mas eles desprezam as minhas graças: triste verdade!

Lições como estas repete-as o Mestre divino constantemente. Em resumo: Deus ininterrupta e horrorosamente ofendido; a Paixão de Cristo misticamente renovada a cada instante; os pecadores a caírem sem cessar no inferno, aos montes , como nuvens de mosquitos . Remédio para desagravar a Deus, consolar a Cristo e salvar ainda muitos milhares de pecadores? — As almas-vítimas a orar incessantemente e a sofrer generosamente, em união com o único Redentor, com Cristo Crucificado e imolado no Altar.

Mais que nunca, preciso de vítimas do meu amor, para sustentar o braço da minha justiça, e tenho tão poucas!... Ainda que tivesse muitos milhares de vítimas, ainda era pouco para tantos pecados e crimes. (1.11.34)

Mas o Mestre não ensina só quando lhe fala e a consola, mas também com os silêncios que se vão tornando cada vez mais prolongados.

A 21.2.35, assim escreve ela:

Desde o dia 14 ainda Nosso Senhor me não tornou a falar. Mas eu estou conforme com tudo o que for da sua santíssima vontade. Bendito Ele seja. Ao menos não me faltam os desejos de O amar cada vez mais e de O fazer amado e conhecido de todos os corações.

Oh, que desejos eu tenho que Nosso Senhor seja amado por todos, como eu própria O queria amar! E como me sinto bem, quando digo a Nosso Senhor: não me poupeis a mim os sofrimentos e sacrifícios e poupai aos pecadores as penas do inferno.

Bom proveito este tirado das lições recebidas.

A 2 de Maio encontramos um silêncio mais longo:

Passaram-se 14 dias sem que Nosso Senhor me falasse; procurei fazer em tudo a sua santíssima vontade e proceder sempre como se ouvisse a sua divina voz, passando os dias unida o mais que me é possível ao meu querido Jesus Sacramentado. E que consolação para a minha alma quando chega a noite e vejo que não tenho tido grandes distracções. Toda e tudo o que se passar em mim ofereço a Nosso Senhor, tanto de noite como de dia; e muitas vezes digo a Nosso Senhor: ó meu Jesus, eu não vos quero sozinho nem um momento nem de dia nem de noite, em todos os lugares onde habitais sacramentado. Quero viver sempre unidinha a Vós.

Jesus interrompe nesse 2 de Maio o silêncio. Quando a Alexandrina lhe dizia:

Ó meu bom Jesus, vinde à minha alma. Não desprezeis a minha indignidade; vivei em mim!

Nosso Senhor assim lhe respondia:

Ó minha filha, sempre em ti vivo. Escuta o teu Jesus: anda passar parte da noite nos meus Sacrários.

Contempla-os; pede-me pelos pecadores, nas horas em que tantos dormem e tantos me ofendem. Sê a minha vítima. Vela comigo.

Assim pedi aos meus discípulos. Não durmas tu: sê-me fiel no que te peço. Vou enriquecer-te dos meus tesoiros, dos meus frutos. Vou encher-te dos meus dons. Vela comigo. Faz-me companhia com os Anjos, nos meus Sacrários. Oferece-te-Me como vítima.

Oh, como Me consolas! Eu habito em ti. Finjo abandonar-te, mas nunca te abandono.

Mas daí a pouco voltava o silêncio.

Parece que Nosso Senhor se escondeu de mim por completo — escreve a 23.5.35.

— Faz amanhã quinze dias que Nosso Senhor me não tornou a falar; e não me tenho confessado nem comungado. Tenho grandes desejos de receber o meu querido Jesus e muito O queria receber sequer mais uma vez, neste bendito mês de Nossa Senhora. Mas o que hei de eu fazer? Seja feita em tudo a vontade do meu bom Jesus.

Estes silêncios eram uma nota do bom aproveitamento da discípula.

É chegado o tempo que deposites em mim toda a tua confiança — dizia-lhe o Mestre a 30.5.35.

E mais adiante, a 25.8.35:

É porque te apanhei firme no meu amor.

E a cerração vai sendo cada vez mais densa:

O meu amado Jesus, agora, esconde-se muito — desabafa ela a 25.7.35 — deixa-me lutar com os meus sofrimentos que, sem cessar um momento, me vão consumindo o meu pobre corpo. Que consolação para mim é sofrer!

Ainda a 3.10.35:

Nosso Senhor escondeu-se de mim, mas escondeu-se a valer. Bendito Ele seja e faça-se a sua santíssima vontade. Eu não aspiro a outra coisa senão a que seja feita em tudo e sempre. Eu só queria morrer de amor. Queria ser a vítima da Eucaristia. Assim o digo ao meu querido Jesus, que quero ser vítima por Ele em todos lugares onde Ele habita sacramentado. E que consolação ser vítima do amor de Jesus, para lhe acudir aos pecadores! E como é consolador dizer a Jesus:

— Eu sou a sentinela dos vossos Sacrários, assim como o soldado é a sentinela do seu quartel; só com a diferença que o soldado muitas vezes cumpre obrigado e com medo ao castigo; mas eu quero cumprir e ser fiel por amor doido a Jesus Sacramentado.

   

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