"Ó meu Jesus, fazei que os meus sofrimentos fechem as portas do inferno".
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Capítulo 21
DORES DO
INFERNO
O peso
dos pecados e a consequente vergonha que eles causam, a ira de Deus
pairando sobre esses pecados, esmagamentos, vascas de morte, ameaças e
até dores do inferno: tudo experimenta a grande vítima de expiação.
Depois da
Comunhão, assim desabafava a Alexandrina a 3.6.39:
— Ó meu Jesus, para onde fostes Vós? Parece-me que
fostes para tão longe, que nunca mais vos posso
encontrar.
Mas o meu Jesus não me deu resposta; só passados alguns
momentos me falou assim:
— Vingança e maldição é a paga que recebes da tua
maldade e dos teus crimes.
Abre-te, ó inferno, para sepultar em ti estes
abismos de miséria, estes abismos das imundícies mais
nojentas! Vingança, vingança, ó cruel!
Nosso Senhor descarregava sobre mim o peso da sua divina
justiça e da sua vingança. Eu disse-lhe:
— Ó meu Jesus, fazei que os meus sofrimentos fechem as
portas do inferno, para que não caiam lá as almas. Eu
não vos recuso nenhuns, mas quero que as salveis!
Lembrai-vos, Jesus, que são vossas filhinhas, filhinhas
do vosso sangue que derramastes até à última gota.
E no dia
8, também após a Comunhão:
No fim de receber o meu Jesus, fiquei sepultada numa
noite escuríssima. O coração tornou-se tão grande e tão
duro e escuro! Parecia um rochedo do mar e debaixo de
mim estava um medonho abismo. Nosso Senhor dizia-me:
— Miserável, desgraçada, estás à boca do inferno para
te engolir!
Maldita, é a tua sepultura eterna. Não bastam os
tormentos do inferno por toda a eternidade para
castigar os teus crimes. Não temes as ameaças, não te
moves à penitência!
Eu nada temia, estava sempre na minha dureza e não tinha
quem se compadecesse da minha dor. A minha morte não
causava dó a ninguém. Mas Nosso Senhor gritava:
— Vingança! Vingança!
O peso que sobre mim caiu deixava-me esmagadinha; todos
os nervos parece que se me encrespavam. Nosso Senhor,
com uma foice, deixava-me retalhada. Era grande, mas
muito grande a minha aflição. Rolei pela cama e não
tinha palavras para dizer a Jesus. Como há de ser
terrível ver Nosso Senhor na realidade a lavrar a
sentença às almas que se condenam!
Ai, meu Padre, como eu quero sofrer, para que o meu
Jesus não sofra e para que não tenha de pronunciar tais
palavras aos pobrezinhos que tão gravemente O ofendem.
Ó meu Padre, parece-me que todas as misérias são minhas;
que as palavras de Nosso Senhor são para mim! Como eu me
vejo coberta de imundícies! Não há ninguém tão miserável
e tão nada como eu. Mas o nada pode pecar? O meu Padre
compreende-me?... Eu não me sei explicar melhor…
A 13 de
Junho sente na alma a ameaça de guerra que se aproxima:
Hoje sim, recebi o meu Jesus, mas Ele estava tão zangado!
Eu estava aflita com tanto abandono e dizia-lhe:
— Que será de mim, meu Jesus, se me deixais sozinha? Não
me abandoneis. Ó meu Jesus, confio em Vós!
De repente pareceu-me ouvir o toque de uma trombeta tão
estrondosa que se ouvia pelo mundo todo. A aflição
fez-me rolar e ouvi Nosso Senhor então dizer-me:
— Ó Justiça, ó Justiça divina! O mundo está em cima
de um vulcão de fogo, o qual sé falta de um momento para
o outro abrir-se e incendiá-lo!
Vingança, vingança de um Deus que já não pode suportar
mais.
Desgraçada, não ouves a voz que te chama? Maldita,
maldita!
A presença de Nosso Senhor em minha alma era aterradora
e a sua Justiça divina caía sobre mim fortemente. Todos
os ossos e nervos pareciam estalarem e partirem-se em
pedaços e ficaram esmigalhados. Por alguns momentos não
sabia dizer nada a Jesus. Depois disse-lhe:
— Ó Jesus, isso é comigo? Eu quero ouvir-vos, eu quero
seguir-vos; quero ser-vos fiel como São Paulo no caminho
de Damasco. E, se não é comigo, fazei que com os meus
sofrimentos todas as almas oiçam a vossa divina voz e
vos sigam.
Disse-me Nosso Senhor, em tom mais brando mas ainda
muito severo:
— A trombeta que te chama é a voz da minha Igreja e dos
meus discípulos a convidar-te à oração, à penitência...
No dia
seguinte lemos:
Não espere outra coisa de mim: só queixumes e nada mais.
Recebi a Jesus e fiquei morta.
Passado um pedaço, comecei a sentir como que a Terra em
convulsões e a dar urros fortíssimos, o que fez logo com
que rolasse na cama. Nosso Senhor dizia-me:
— A Terra move-se e dá urros, o vulcão incendeia-se:
ficas num braseiro do qual passarás ao inferno.
Justiça, Justiça de Deus cai sobre a terra pecadora e
criminosa. Acorda, acorda, maldita, do sono mortal que
te precipita no inferno.
Nosso Senhor dizia-me isto com voz altiva, parecia falar
do alto do Céu. Eu conhecia bem que não havia nada
superior a Ele, que era Ele quem tinha todo o poder. Mas
eu morta estava e morta fiquei. Não tive palavras para
dizer a Jesus, senão passados alguns momentos.
Um mês
depois, a 13.7.39:
Hoje no fim da sagrada Comunhão estava bem morta. Sentia
na minha alma uma medonha tempestade: parecia-me que se
rasgavam as nuvens com o estrondo do trovão. Com a
desolação que sentia e o susto, ia desfalecendo: parecia-me
não resistir. Tristes momentos depois de recebido o meu
Jesus! Vinha-me à lembrança: não voltarei a sentir outro
estado senão este de morte?
— Jesus, Jesus, compadecei-vos de mim. Tende pena da
maior de todas as pecadoras.
Ó meu Jesus, eu quero, com esta Comunhão e com esta
desolação, consolar a Mãezinha querida para que por Ela
sejais Vós consolado.
Mas o meu Jesus não me dizia palavra; a tempestade tudo
derrubava, o peso esmagava-me até que ficava despedaçada
e me enterrava pelo chão. Passei hora e meia neste
estado e depois disse-me muito fortemente Nosso Senhor:
— A fúria da tempestade da alma é muito mais tremenda do
que a fúria dos ventos, a tempestade dos tempos e dos
astros.
Maldita! Já não a temes, não a ouves! Vê a gravidade dos
crimes que te matou. Desgraçada! O inferno todo te
espera, para te atormentar em todos os teus sentidos...
Eu sentia-me morta e ainda agora sinto; mas os
sofrimentos sentia-os como viva. Compreende este estado?
Não me sei explicar melhor.
Mas mesmo assim, sei que não há palavras com que eu
possa exprimir os desejos que sinto de agradecimento ao
meu Jesus por tanto que me faz sofrer e mostrar-lhe
quanto O desejo amar. Parece que já não estou em mim:
tinha coragem de entrar num fogo a arder em fortes
labaredas, para assim provar ao meu Jesus que sou dele e
que O amo...
Agora
repare-se na veemência da dor com que foram escritas as palavras que se
seguem, a 26.11.39:
Ai, que martírio, o da minha alma! Ai, que dor, a do meu
coração! Foi ferido: está aberto. Sangra sangue em tanta
abundância! Parece-me que todas as almas do mundo se
podiam afogar nele.
Estou sobrecarregada com um peso brutal: esmaga-me, não
me posso mexer.
Não há quem se possa aproximar de mim. A enormidade das
imundícies que me cercam não deixa. Estou coberta delas,
ao abandono de todos. Eu sou um veneno que envenena o
mundo, mas ai, que veneno mortal! Sinto que todos têm de
fugir de mim, mais do que de um monstro feroz.
O abismo em que me vejo é medonho. Não há luz que o
penetre e eu não posso fugir dele. Meu Deus, e eu
sozinha!
Não tenho um momento de alegria. A minha alma está
desesperada; sinto que cai sobre ela a maldição divina.
Quero amaldiçoar a hora em que nasci, a mãe que me
criou, a terra que calquei. (Parece que estamos a
ouvir o Santo Job)!
Ai, meu Jesus, que sofrimento, que dor tão tormentosa! É
uma guerra interior, guerra que jamais poderá acabar. Os
combates são todos sem luz.
Mãezinha, minha querida Mãezinha, dai-me a vossa bendita
mão; é por Jesus que eu combato, é para lhe dar as
almas: mas não posso só. Socorre-me, ó Mãezinha querida,
tem dó da pobre filhinha que sempre te amou e em ti
confia!
A
5.12.39, damos com esta carta terrível:
Não tenho nada de Nosso Senhor; não tenho virtudes; não
tenho amor. Tudo é do demónio: vejo a minha alma mais
negra que um negro carvão, Sinto que estou nas garras do
demónio; quer lançar-se ao meu pescoço e apertar-mo com
toda a força. Que furiosa tempestade! O vento enrola-me,
derruba-me. Estou no meio do lodo, da lama, das
imundícies: ninguém se pode aproximar de mim.
Sinto a dor e a pena que Nosso Senhor sente, ao ver-me
assim. O coração fica aniquilado: o peso é esmagador.
Este estado da alma só serve para Nosso Senhor derramar
lágrimas: falta-me a minha dor. Estou dura, dura. Não me
entristeço com o que faço sofrer ao meu Jesus. Que negra
ingratidão!
Na verdade, serei a causa de tanto sofrer para o meu
Jesus? Ai, que triste noite a da minha alma! Não posso
seguir com tanto desfalecimento. O abandono é em tudo e
por todos.
Parece-me que tenho que jurar que sou uma falsa, uma
enganadora. O meu Jesus não podia repousar nem operar
tantas graças numa alma, num coração tão nojento, como o
meu. Ai, meu Jesus, não há quem me possa valer!
Hoje quando O recebi, era assim com estes terríveis
sofrimentos que eu estava e caí num abismo medonho; mas
não cheguei a morrer.
A
28.1.40, esta tão terrível ou ainda mais que a precedente:
Hoje estou tão aterrada com as minhas misérias e o meu
nada! E, para maior dor ainda, Nosso Senhor ralhou-me,
quando veio à minha alma. Logo, logo que O recebi,
principiou Ele:
— O teu coração está podre! És má, és digna de
condenação e da ira de Deus. Onde hospedas o Rei da
Glória, a Majestade divina? O teu corpo já exala o
cheiro imundo dos condenados. Aparta-te para o
inferno!
Nosso Senhor repelia-me com a sua bendita mão e
sobrecarregava-me com a sua divina Justiça. Que aflição
na minha alma! Estava como que num desespero. Passados
alguns momentos disse-lhe:
— Jesus, não vos canseis de jogar a vossa bolinha;
brincai, brincai e, se me virdes cansada pelo
sofrimento, vinde ajudar-me; dai-me força. É bem doce
sofrer pelo vosso amor. Não quero outro fim no meu
sofrimento senão dar-vos almas, consolar o vosso divino
Coração...
Para a
incompreensão que possam suscitar estes sofrimentos tão esquisitos e,
quase diríamos, com aspectos tão novos na mística, copiemos esta frase
que Nosso Senhor lhe dirige durante a Paixão de 2.11.40:
Coragem, minha filha: a ira de Deus que cai sobre ti não
é para ti; não és tu que O desafias, mas sim aqueles de
quem és fiadora.
Repetidíssimas vezes lhe dá Nosso Senhor a explicação do seu misterioso
sofrer. Afinal, vê-se satisfeita no pedido tantas vezes feito a Deus:
que invente sofrimentos para mais a imolar pelos pecadores.
Bem
diferente é a linguagem divina quando se dirige à própria Alexandrina,
como vemos no dia seguinte:
Depois de uns momentos que Ele já estava no meu coração,
disse-me assim:
— Minha filha, que bem se está no teu coração! És digna
que Eu habite nele. Tem raios ardentes, fogo devorador.
Como consolas a tua querida Mãezinha por me amares
assim! Ela tomou-te para os seus braços maternos como
outrora a mim em criancinha. Está-te a acariciar: não o
sentes?
— Sinto, sim, meu Jesus; mas, mesmo que o não sentisse,
confiava em Vós…
Posta
esta explicação, continuemos a estudar essas que poderíamos chamar dores
do inferno. Delas fala S. João da Cruz, ao tratar da purificação mística
do espírito:
Porque, verdadeiramente, quando esta contemplação
purgativa aperta, sombra de morte e gemidos de morte e
dores do inferno sente a alma muito ao vivo. (ob.
cit. p. 374-375)
Diga a
Alexandrina a 27.4.40:
Que tristeza eu sinto com a separação do meu Deus!
Parece-me que nunca mais me posso juntar a Ele; nem
nunca mais O verei. O Céu não é para mim. Sinto Nosso
Senhor a repelir-me dele. Que sofrimento o dos
condenados! Avalio o tormento deles. Só este bastava
para eles sofrerem no inferno. Que horror! Quanto se
deve evitar o pecado, só para nunca perder a Jesus nem
ferir o seu amante Coração.
Ainda hoje, ao recebê-lo, era dolorosa a minha dor e
tremenda a minha aflição. A dor que eu sentia não era
minha: era a de Jesus; era o ferimento do seu divino
Coração: era a mágoa da ingratidão humana. A aflição era
tremenda, porque era tremendo o estado da minha alma.
Está
nesta passagem bem indicada ao vivo a pena de dano dos condenados.
A
15.5.40, experimenta a gravidade da ofensa de Deus:
A visita de Jesus, hoje, ainda me sobrecarregou mais com
dor, tristeza e amargura. Ele dizia-me:
— Ingrata, ó ingrata que me feriste! Ingrata, ó ingrata
que me ofendeste! Não tenho outro castigo para castigar
teu crime a não ser o inferno; e esse mesmo não basta. O
que é a ofensa de Deus! Aparta-te de mim: não te posso
ver! Vais ser esmigalhada com o peso da Justiça divina.
Vais ser sepultada no inferno eternamente!
Ai, meu Padre, quanto custa ouvir esta sentença de
Jesus! Ele, ao pronunciá-la, fazia-me sentir no coração
e na alma ais tristes e profundos. Mas eram dele. Ele
repelia-me, mas, oh, com que amargura!
Este quadro não me sai da alma: está-me bem gravado.
— Ó meu Jesus, quero evitar o pecado e todas as ofensas
feitas ao vosso Coração amantíssimo. O meu coração e a
minha alma sentem a necessidade extrema de chorar
amargamente. São os sentimentos que eu tenho por Vós,
meu Amor. Quero chorar lágrimas de dor, lágrimas de
sangue. Quero que todo o sangue do coração e das veias
seja vertido em lágrimas de dor e de amor. Quero com
elas obter de Vós para a cruel Humanidade perdão e
misericórdia.
Jesus, crucificai-me, Jesus, imolai-me, Jesus, consolai
o vosso Coração divino, o vosso Coração de Pai. Passai
para mim as vossas amarguras e esquecei as minhas
ofensas e de todos os vossos filhos. Perdão, Jesus! Sou
vossa e amo-Vos.
A carta
de 20.5.40 raia o sublime:
O inferno está aberto e dá urros debaixo de mim;
parece-me que caio sem remédio neste abismo infernal.
Estou sobre ele para ser engolida; e a lepra dos meus
pecados, os vícios de que estou coberta descarnam-me a
carne dos ossos, fazendo-a cair ainda da Terra para o
inferno aos bocadinhos!
O que poderá sentir ainda mais o meu pobre corpo e a
minha alma? Estou à boca do inferno e não temo. Estou a
sentir os horrores da Justiça divina e continuo na minha
louca e desgraçada vida. Estou cega, estou cega! Só me
encantam os desvarios e loucuras do mundo. Na alma não
penso nem na minha salvação eterna. Que triste vida, que
triste morte! Já ouço a maldição de Nosso Senhor:
— Aparta-te de Mim, maldita, eternamente!
E sou repelida por Jesus e já quero amaldiçoar-me a mim
mesma. Sou um mundo de horrores e trevas medonhas!
Isto é o que a minha alma sente. Graças, muitas graças
ao meu Jesus, por não ser assim. Eu teria sido tudo
isto, se Ele desde a minha tenra idade não velasse por
mim, não me amparasse. E a minha querida Mãezinha
trouxe-me sempre nos seus santíssimos braços, debaixo do
seu divino manto. Ai de mim, se não fora Jesus e Maria!
Em troca de tão grande amor, quero ser-lhes grata, quero
reparar todos os crimes que contra os seus santíssimos
Corações se cometem: quero desagravá-los na medida do
possível; quero ser vítima, quero dar por Eles a vida. E
a todo o momento de dor e de imolação, quero dar glória
a Jesus, à Mãezinha e a toda a Santíssima Trindade.
E como prova do meu agradecimento por tudo, quero
dizer-lhes um eterno obrigado e cantar-lhes sem cessar o
Magnificat!
E para
não prolongarmos demais este capítulo, ainda esta carta célebre e bem
característica de 3.6.40:
O dia 2 do mês de Junho! Recorda-se, meu Padre, que
Nosso Senhor me preveniu, logo de manhã, que eu ia
sofrer muito? Falou-me assim logo que eu O recebi:
— Toma conforto, minha filha: a tua dor será
dolorosíssima. O teu sofrimento horroroso. Aceitas, para
consolares e desagravares o meu divino Coração e para
que se salvem as almas?
— Aceito tudo, meu Jesus; com a vossa graça, nunca
ouvireis dos meus lábios um não.
— Ai de ti, se não tinhas o teu Jesus... para te ajudar
na tua dor! Enche-te de amor; também hás de transbordar
de dor. Ainda hoje hás de sofrer muito: a dor há de
atingir o seu auge. Coragem: o Tabor dá força para a
dor.
Já da parte da tarde, não sei bem a hora, quando menos
eu pensava, principiei a sentir um doloroso sofrimento.
O mundo estava todo numa tremenda nuvem negra e sobre
mim caíram todas as maldades e crimes dele.
Via e sentia a destruição dele: tudo em ruínas. Eu
estava condenada ao inferno! Sentia a minha alma a
arder nele. Por entre mim e muitas almas que lá estavam
saíam horrorosas labaredas, mas não eram de luz e os
meus ouvidos ouviam o rumor delas.
Eu não podia suportar em mim o olhar de Jesus e da
Mãezinha e nem ao menos podia chamar por eles. Por muito
tempo não fui capaz de dizer: Jesus, Mãezinha,
acudi-me. O meu coração era uma pedra dura: estava
completamente perdida. O inferno era a minha morada.
É impossível descrever os horrores que a minha alma
sentiu. Não sei o que me obrigava a descer da cama e a
atirar-me para aquele abismo.
Sinto que nada é tudo isto que digo em comparação do
sofrimento: mas não me sei explicar melhor.
Presenciámos toda esta cena grandemente impressionante para os
presentes. Num dado momento, vendo-a tão aflita, disse-lhe:
— Chame
por Jesus!
Respondeu-me,
com voz abafada:
— Não
posso.
Perguntei-lhe então:
— Está no
interno?
Resposta
imediata:
— Estou!
Compreendi então do que se tratava nesse êxtase tão atroz.
Quando
terminou e voltou ao normal, a primeira pergunta que fez, foi esta:
— Mas eu
ainda posso chamar por Jesus!? Ainda me posso salvar!?...
Para
concluir, ainda esta passagem de 15.8.40:
Nosso Senhor não estava satisfeito com os sofrimentos do
dia; veio já a altas horas da noite e disse-me:
— Anda, minha filha, para as portas do inferno, para
evitares que as almas caiam lá. Anda para ele sofrer os
sofrimentos que deviam sofrer aquelas que nele deviam
cair,
Então principiei a sofrer horrorosamente. Senti-me
dentro do inferno agarrada às portas. Empreguei quanta
força tinha para conseguir que elas não se abrissem. E
agarrados a mim sentia os demónios com toda a raiva
infernal a arrastarem o meu corpo para todos os
tormentos, mais para o meio do inferno; cravavam-me os
dentes, arrancavam-me as carnes aos bocadinhos.
Meu Deus, que horror e que tremendos os tormentos do
inferno! Tudo são urros, escuridão e maldições.
Claro está: os meus olhos não viram nada. Tudo isto foi
o que a minha alma sentiu. Tudo me ficou bem gravado
para nunca mais esquecer. As forças que empreguei para
fechar as portas do inferno não foram do corpo mas as
forças da alma.
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