A CRUZ E A CRUCIFICADA
Balasar!
Um
conjunto de muitos lugares disseminados entre verdes pradarias,
campos bem cultivados com cereais e vinha, interrompidos por matas
de pinho e eucalipto, num terreno um pouco ondulado que se estende
ao longo das margens do rio Este, o qual, após ter percorrido cerca
de 15 km e depois de se juntar ao rio Ave, desagua no grande oceano
Atlântico em Vila do Conde, perto da bela cidade da Póvoa de Varzim,
a uns 30 km a norte do Porto: Póvoa é sede concelhia, e Balasar
fica-lhe a cerca de 15 km para o interior.
Estamos
na fértil região do Minho[1],
no noroeste de Portugal. Para norte e noroeste entrevêem-se cadeias
de montanhas. Aqui e além há pedreiras de ardósia. As casas são
pequenas, baixas, com as fachadas muito limpas; algumas delas estão
decoradas com azulejos, característica produção de Portugal (Aveiro,
Sacavém...) Os habitantes são trabalhadores.
A
igreja paroquial, dedicada a S. Eulália, domina de uma pequena
elevação e foi inaugurada em 1907, em substituição da precedente,
tornada muito pequena para a população de cerca de 1000 habitantes;
a paróquia faz parte da antiquíssima diocese de Braga, dita a «Roma
de Portugal».
Desde
1832, por vários anos, Balasar foi meta de peregrinações em honra de
uma Cruz aparecida misteriosamente na terra, a poucos metros da
actual igreja[2].
Para protecção desta Cruz foi construída uma Capela, ainda
existente, que tem na frente a data 1832, esculpida em pedra.
Durante anos houve também uma Confraria, com o fim de promover a
festa da Santa Cuz de Balasar.
Pouco
mais de um século depois, Balasar torna a ser meta de numerosas
peregrinações: o povo é atraído pela fama de Alexandrina Maria da
Costa, que aí viveu muitos anos «crucificada».
Não é
arbitrário o relacionamento aqui feito entre a Cruz na terra e a
Alexandrina crucificada. De facto, em dois êxtases, respectivamente
de Dezembro de 1947 e de Janeiro de 1955, Alexandrina ouve Jesus
apontar aquela Cruz na terra, enviada como “sinal” da vítima, a
própria Alexandrina, que nasceria em Balasar para aí ser
crucificada. Eis, alguns excertos daqueles êxtases que se referem à
Cruz de Balasar:
(Alexandrina acabou de reviver a paixão; o êxtase continua com o
colóquio com Jesus)
[3]És
a minha vítima, a quem confiei a mais alta missão. E como prova
disso tende bem ao te que digo para bem o saberes dizer.
Quase
um século era passado que eu mandei a esta privilegiada freguesia a
cruz para sinal da tua crucifixão. Não a mandei de rosas, porque a
não tinha, eram só espinhos; nem de oiro, porque esse com pedras
preciosas serias tu com as tuas virtudes, com o teu heroísmo a
adorná-la. A cruz foi de terra, porque a mesma terra a preparou.
Estava
preparada a cruz; faltava a vítima, mas já nos planos divinos estava
escolhida; foste tu.
O mal
aumentou, a onda dos crimes atingiu o seu auge, tinha que ser a
vítima imolada; vieste, foi o mundo sacrificar-te.
E agora
partes para o céu e a cruz fica até ao fim do mundo, como ficou
também a minha.
Foi a
maldade humana a preparar-Me a minha, e a mesma maldade humana
preparou a tua.
Oh,
como são admiráveis os desígnios do Senhor! Como são grandes e
admiráveis! Que encantos eles têm! 5/1/12/47
Há mais
de um século que mostrei a cruz a esta terra amada, cruz que veio
esperar a vítima. Tudo são provas de amor!
Ó
Balasar, se me não correspondes!...
Cruz de
terra para a vítima que do nada foi tirada, vítima escolhida por
Deus e que sempre existiu nos olhares de Deus!
Vítima
do mundo, mas tão enriquecida das riquezas celestes que ao Céu dá
tudo e por amor às almas aceita tudo!
Confia,
crê, minha filha! Eu estou aqui. Repete o teu «creio». Confia!
21/1/55
Desde
1965, na Capela da dita Cruz, dois cartazes impressos reproduzem os
dois fragmentos agora transcritos.
Alguns esclarecimentos sobre a Cruz aparecida em 1832
Em 1965
o P.e Humberto Pasquale, durante a impostação do Processo Diocesano
Informativo para a beatificação, preocupou-se em indagar a que se
referiam as palavras dos êxtases acima reproduzidas.
Veio a
saber que P.e Leopoldino, pároco de Balasar desde 1932, tinha
publicado no semanário «Ala Arriba» da Póvoa de Varzim, em 3
Dezembro de 1955, pouco depois da morte da Alexandrina, um artigo
com a história da Capela[4];
tinha copiado os elementos úteis a tal artigo na biblioteca de
Braga; acrescentara-lhe depois as palavras que Alexandrina ouvira
dizer a Jesus em 21 de Janeiro de 1955.
Então o
P.e Humberto Pasquale, com a ajuda de um amigo, dirigiu-se à
biblioteca de Braga e conseguiu fazer uma fotocópia do documento
notarial de 1832.
O
escrito fora elaborado pelo pároco de Balasar e por várias
testemunhas que assinaram juntamente com um notário. Era endereçado
ao Vigário Capitular da arquidiocese, então vagante. Eis a parte
principal.
Dou
parte a Vossa Excelência de um caso raro acontecido nesta freguesia
de Santa Eulália de Balasar.
No dia
de Corpo de Deus próximo pretérito, indo o povo da missa de manhã em
um caminho que passa no monte Calvário, divisaram uma cruz descrita
na terra: a terra que demonstrava esta cruz era de cor mais branca
que a outra: e parecia que, tendo caído orvalho em toda a mais
terra, naquele sítio que demonstrava a forma da cruz não tinha
caído orvalho algum.
Mandei
eu varrer todo o pó e terra solta que estava naquele sítio; e
continuou a aparecer como antes no mesmo sítio a forma da cruz.
Mandei depois lançar água com abundância tanto na cruz como na mais
terra em volta; e então a terra que demonstrava a forma da cruz
apareceu de uma cor preta, que até ao presente tem conservado.
A haste
desta cruz tem quinze palmos de comprido e a travessa oito; nos dias
turvos divisa-se com clareza a forma da cruz em qualquer hora do dia
e nos dias de sol claro vê-se muito bem a forma da cruz de manhã até
as nove horas e de tarde quando o Sol declina mais para o ocidente,
e no mais espaço do dia não é bem visível.
Divulgada a notícia do aparecimento desta cruz, começou a concorrer
o povo a vê-la e venerá-la; adornavam-na com flores e davam-lhe
algumas esmolas; e dizem que algumas pessoas por meio dela têm
implorado o auxílio de Deus nas suas necessidades e que têm
alcançado o efeito desejado, bem como: sararem em poucos dias alguns
animais doentes; acharem quase como por milagroso animais que
julgavam perdidos ou roubados e até algumas pessoas terem obtido em
poucos dias a saúde em algumas enfermidades que há muito padeciam. E
uma mulher da freguesia da Apúlia, que tinha um dedo da mão
aleijado, efeito de um penando que nela teve, tocando a Cruz com o
dito dedo, repentinamente ficou sã, movendo e endireitando o dedo
como os outros da mesma mão, cujo facto eu não presenciei, mas o
atestam pessoas fidedignas que viram.
Enfim,
é tão grande a devoção que o povo tem com a dita cruz que nos
domingos e dias santos de guarda concorre povo de muito longe a
vê-la e venerá-la, fazem romarias ora de pé ora de joelhos em volta
dela e lhe deixam esmolas; e eu nomeei um homem fiel e virtuoso para
guardar as esmolas.
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