A
presença da Alexandrina na Igreja impõe-se sempre mais. Mas impõe-se
como paradoxo e como desafio. Encarnam nela, como transparência de
Cristo, a beatitude na pena, a liberdade na obediência, a alegria na
dor, a Vida na Morte. Alexandrina é humilde, puríssimo ícone do
Crucificado e Ressuscitado Senhor que ama. Por isso, a jovem de
Balasar é uma presença e uma «memória perigosa, mas necessária»,
pelo Dom que é para a Igreja, pela representação – na sua carne e no
seu espírito – do Amor que nos envolve a todos no Mistério da Páscoa
de Salvação.
O
paradoxo evangélico está aqui: a alegria da cruz. Mas porquê? Porque
é a alegria do Amor. Alexandrina é como que toda contida nestas duas
palavras que delineiam o seu vulto interior, exprimem a sua
maturação mística, conformam o seu testemunho evangélico e a sua
mensagem eclesial.
Sem
dúvida, a Alexandrina não está toda aqui. Ela é uma alma imensa,
como o seu céu de Balasar. Mas exactamente neste imenso horizonte de
co-redenção destaca-se aquela amorosa e amada cruz que toda reluz e
vibra de alegria pascal, a alegria de Cristo que na Alexandrina vive
e nela se oferece ao Pai e salva os homens.
«Vós
que participais nos sofrimentos de Cristo, alegrai-vos». Este
convite apostólico (1ª Pe 4,13) encontra acolhimento na carne e no
espírito de Alexandrina, a ponto de colocá-la – por vocação e missão
– na onda central da Redenção.
Sim,
Alexandrina participou na alegria dos sofrimentos de Cristo. Uma
alegria que é reverbero daquela divina paixão de Cristo pelo
baptismo de sangue e fogo celebrado na sua Páscoa.
Oh,
divina paixão de amor de Cristo!
Ao seu
coração, aos seus membros tudo pediu o Amor. Pediu as pancadas e os
escarros, as mãos perfuradas e o coração trespassado. Não era justo
que Cristo padecesse assim, sofresse assim a morte, mas era
necessário ao seu Amor
para que o ódio e a mentira do mundo fossem transmutados em amor e
verdade do homem.
Se a
Cruz é a revelação mais alta do Amor, quem ousará sufocar aquela
alegria «indizível e gloriosa»
que irrompe do coração de Cristo, dos seus discípulos, da
Alexandrina? Ela afirma: «Como é feliz a alma que conhece o valor do
sofrimento!» Alegria gloriosa, porque gloriosa é a Cruz. E a glória
da Cruz é a humildade; é o aniquilamento de Jesus sobre quem se
lançam todos os pecados do mundo e são redimidos.
A
alegria na dor. Nenhuma complacência doentia no sofrimento está
aqui, mas o admirável paradoxo cristão que parte das profundidades
mesmas do Amor de Jesus Cristo e se regenera – para as almas fiéis –
na fornalha ardente do Mistério Pascal.
Na
linguagem franciscana a alegria é «letícia»: um cambiante de
duradoura, suave leveza. E se para Francisco de Assis a «letícia»
jorra da pobreza e da humildade,
na Alexandrina da Costa brotou do coração e do corpo devastado pelas
trágicas sequências da paixão de Cristo que revivem nela. Como no
santo italiano, assim na humilde mulher portuguesa, o martírio dos
estigmas é a experiência da alegria mais inebriante.
«O
último selo»
para Francisco e para Alexandrina é o selo da «alegria dolorosa», do
«choro gozoso»
de que foi feita participante a criação inteira.
Compreenderemos nós a mensagem da alegria na cruz, da «letícia» no
sofrimento, que nos confiam o corpo e a alma de Alexandrina? Basta
que não esvaziemos a cruz de Cristo;
que não profanemos mesmo só destemperando-a – aquela divina paixão
de Amor, aquele fogo que Jesus veio a trazer aos corações para que o
mundo arda!
Destas
páginas de biografia e de biografia espiritual, redigidas com tanto
entendimento de amor pelos caríssimos Eugenia e Chiaffredo
Signorile, urge ao coração nosso – hoje – o convite apostólico: “Na
medida em que participais nos sofrimentos de Cristo, alegrai-vos!”
Vós, que no coração e no corpo levais os estigmas dolorosos e
gozosos da Vontade do Pai, senti-vos confirmados e abençoados pelo
Amor crucificado do Senhor ressuscitado; senti-vos acompanhados pela
mão amiga da Alexandrina da Costa e da sua humilde voz – seu
programa e nosso empenho –: «sofrer, amar, reparar», em co-redenção
pascal, em beatitude plena.
Frei
Franco Fusar Bassini, capuchinho.
Festa
do Corpo de Deus de 1989»
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