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Alexandrina Maria da Costa

SENTIMENTOS DA ALMA

FEVEREIRO 1945

1º de Fevereiro de 1945

– Dai-Me forças, dai-me graça, meu Jesus, se quereis que eu dite o que me vai na alma, se quereis que eu cumpra o meu dever de consciência. Não tenho forças, Jesus, e ditar os sentimentos da minha alma causa-me tanta repugnância!

Parece-me que não só morri, mas que nunca existi no mundo. Mas existe agora e existiu sempre a minha negra ingratidão, as minhas maldades e horrorosos crimes; fazem-me tremer e arrepiar de pavor. Desejo tanto os sofrimentos, sinto que os quero tanto, parece-me que estou louca por eles. Quanto mais sofro mais quero sofrer, mas sofro apavoradamente. Amo a dor e quero a dor e tenho dela o maior medo, o maior pavor. Corro para os sofrimentos numa alegria doida de os abraçar e ao mesmo tempo parece-me que com eles choro lágrimas de sangue e deles me queria esconder. Ó horror, tremendo horror! Quero sofrer, quero fugir à dor.

Nestes dias, em que tanto tive de dar a Jesus, não pude ter um momento de alegria ao oferecer-Lhe os meus sofrimentos. Muitas vezes repetia: por Vós tudo, meu Jesus, e pelas almas. Esse tudo, que oferecia a Jesus, não era meu, não era nada. Passei dias, passei noites neste estado, a dar, a oferecer, sem ter que dar, sem ter que oferecer. O que fiz eu? Entreguei-me à cruz, de mãos e pés cravada nela, dizia:

– Aceitai-me, Jesus, tal qual me sinto. Não sofro? Aceitai os desejos que tenho de sofrer! Não amo? Aceitai as ânsias que tenho de amar. Não sou eu, não vivo. Não tenho que oferecer? Aceitai tudo de quem é como se eu vivesse, se eu sofresse, se tudo me pertencesse. Estou na cruz, dei-me à cruz, espero da cruz passar à Vossa glória, ao Vosso amor, ao Vosso céu. Confio, confio, meu Jesus. Sinto na minha alma tantos maus-tratos! E sinto também remorsos ou não sei quê de várias pessoas que me têm feito sofrer. O que é isto, meu Jesus? Não bastam os sofrimentos que me causaram, ainda tenho de sofrer a traça que lhes rói a alma! Sou a Vossa vítima, Jesus. Pecar não, mas tudo o que seja para eu Vos amar e Vos dar glória: quero tudo, aceito tudo, meu Jesus.

O demónio não veio ainda com os seus ataques tremendos. Tem-me aparecido, sim, em forma de tremendas feras, feios esqueletos, a fazer-me gestos maus e a dizer-me se ainda não estou restabelecida das minhas forças para continuar a minha vida de vícios, de gozos e de crimes. Nesta noite, apareceu-me em forma de homem, de pé junto da minha cama. A altura dele era quase a do meu quarto. Na cabeça tinha um chapéu grande, parecia-me de ferro. Vestia três cores: vermelho-encarnado, verde e preto. O rosto parecia um monstro, olhos muito feios. Demorou-se junto de mim, mas não me tocou. A visão foi assustadora, ele podia engolir-me inteira. Que mais poderá ele pintar!

Sou sempre a vítima de Jesus. Os espinhos não cessam de cair sobre mim, caem com tanta força! Ferem-me o corpo, ferem-me a alma. E, há dois dias, sem receber o meu Jesus! Onde hei-de ir buscar a força para os suportar? Estão sempre gravados diante de mim os quadros tristíssimos que Jesus desenhou na minha alma: o mundo, o limbo, o inferno. Quantas vezes nem posso respirar, para nada vejo remédio, nada posso fazer por eles. Só agora, caminha para dois dias que a minha alma sente uma chuva miudinha, chuva de nevoeiro, uma chuva de sangue que orvalha a humanidade inteira. Sofro incessantemente com isto, não por ver e sentir esse orvalho de sangue, porque é orvalho de amor, é orvalho que dá de tudo, mas sim porque esse sangue que orvalha sai de mim mesma, sai do meu coração, das veias do meu corpo.

— Ó que dor, ó que dor, que só ela tirava a vida ao mundo! Ó tarde de quinta-feira que me trazes tudo; que mar de sofrimento! Estou tão manchada, causa-me tanta repugnância ver-me assim! Tenho tanta vergonha que o Eterno Pai me veja e observe a traição que me preparam! Se pegassem em mim e me pusessem à boca duma fera, não teria tanto medo, não me causariam tanto horror os sofrimentos de lá como me causam estes e a sexta que se aproxima. Ó sofrimento que por tão poucos és compreendido! Aumentai em mim, Jesus, amor, só amor.

2 de Fevereiro de 1945 – Sexta-feira

Escusado é fugir, nem esconder-me; não posso, não tenho para onde. Tudo é noite. E sinto-me à porta do inferno. Ó meu Deus, que tormentos arrepiantes me esperam.

Chegou a sexta-feira, triste sexta-feira! Vi a minha cruz, vi-a ainda cedo; preparavam-na a toda a pressa. Ela era precisa, fosse qual fosse a sentença que eu recebesse. Dentro da minha alma sentia a mansidão, a bondade sem igual; dentro dela também, e ao mesmo tempo, sentia contra a mesma bondade e mansidão o ódio, o rancor, o desespero e uma autoridade orgulhosa; orgulho sem igual. Feras contra o Cordeirinho mais pequenino e inocente. Meu Deus, que dor por esse cordeirinho tão cheio de bondade! Senti essa autoridade orgulhosa ainda antes de lavrar a sentença contra o cordeiro inocente; com um furor diabólico rasgaram de cima a baixo os seus vestidos.

Ao encontro destes sofrimentos vieram os sofrimentos causados pelo demónio. Ele anda desesperado, não sei porquê, mas certamente por Jesus não ter deixado, ainda não continuou as suas manobras infernais. Veio para a minha frente em figura de fantasmas, mas de tal altura que não lhe via o princípio nem o fim. Mostrava-se muito nojento por mim. Senti-o a querer escarnecer-me dentro da boca, piores ainda, não as digo aqui, é porco, é escandaloso. Ele não se satisfaz com tudo isto; a sua raiva é por não conseguir fazer o que tantas vezes tem feito.

— Jesus, aceitai o meu sacrifício, custa-me tanto falar; é obediência, santa obediência; se não fosses tu, sofria sozinha, em silêncio, só Jesus o sabia.

E hoje, dia da Mãezinha, e eu ainda sem comungar, sem receber do meu Jesus força para tanta dor, dor que desfaz, dor que rasga e volta a rasgar a minha pobre alma. Subi a montanha do calvário com tanto custo, sempre a parecer ir expirando. Clamei, clamei sem cessar:

— Pai, ó meu Pai, até tu me deixas, até tu me abandonas!

O meu sangue corria, encosta abaixo. Escondeu-se o sol, encobriu-se envergonhado de tanta malícia. E eu, envergonhada, estava na cruz, despida, à vista da canalha mais vil. Os meus vestidos foram cortados e distribuídos. A minha tristeza e amargura não cessaram. A alma tremia com dor e com medo como o corpo treme de frio. A bradar sempre por Jesus, Ele veio e trouxe com Ele um sol luminoso e abrasador. Cessaram as tremuras da alma, o medo e toda a dor; só tinha paz, só tinha luz e amor. O coração principiou a receber uma vida que não sei explicar, todo o peito se me abrasou em chamas. Que suavidade eu gozei e por muito tempo. A abóbada do céu desceu sobre mim toda ela almofadada em algodão, a qual envolvia os anjos com instrumentos. Ouvia os seus hinos maravilhosos, não os compreendia bem, mas sei que eram a Jesus Sacramentado. Ouvi as palavras Corpus Domini Jesu Christi, senti que Jesus se deu a mim e me prendeu mais e mais a Ele. Os anjos continuavam a cantar; por entre eles sobressaiu um canal fortíssimo directamente a mim, dele caíam chamas de fogo e muitas e muitas coisas, tudo entrava para mim. E então principiou Jesus a dizer-me assim:

— Este canal, minha filha, é do coração da tua e minha Mãe Bendita; dele recebes o nosso amor na maior das abundâncias; dele recebes as nossas graças, virtudes e dons, riquezas divinas e tudo o que é do céu. Dele recebes vida para viveres, vida para dares às almas. É este o orvalho, o sangue que sentes cair sobre a humanidade. É uma mistura que faço das minhas riquezas, das minhas graças com a tua dor. És a nova redentora. Passo para ti tudo pelo canal da minha Bendita Mãe; és tu com Ela que salvas o mundo. Não te entristeças, minha filha, por não me receberes na Eucaristia. Quanto mais fores humilhada e a minha divina causa combatida mais maravilhas, maiores prodígios opero em ti. A minha divina ciência tem sempre que dar-te e tu, minha pomba bela, tens sempre que oferecer. Já que é sem igual a tua dor, o teu martírio, é sem igual o meu amor, as minha maravilhas em ti. São luzes confusas para aqueles que as não quiseram ver claras. Vida maravilhosa e prodigiosa é a tua, ó filha querida. Tu és orvalho que fecunda e dá vida. Tu és de Jesus, tu és das almas. És a bolinha de Jesus, és a bolinha dos meus entretimentos, dos meus encantos, assim como és a bolinha de encantos atraentes para os pecadores. És de Jesus e és deles. És vítima que amas e encantas o céu, és vítima que dás a vida momento a momento pela humanidade. Recebe toda esta vida divina, dá-a ao mundo faminto, dá-a ao mundo em perigo. A ti o entreguei, a ti o confiei. Tenho eu, Jesus, toda a confiança em ti. Confio tanto quanto tu me amas, quanto amas as almas. És rica comigo, comigo as salvas, comigo e minha Bendita Mãe. Vai, minha jardineira, para a minha agricultura. Vai dar, vai distribuir.

— Deixai-me, meu Jesus, dar tudo o que de Vós recebi a todos aqueles onde vai agora o meu pensamento.

E nomeei as pessoas a Jesus. Ainda abrasada no Seu divino amor, cantei à Mãezinha:

No meu calvário, na minha cruz,

Clamei alto, clamei sempre

Por ti, ó Mãe, ó Mãe de Jesus!

Mãe, ó Mãe de Jesus,

Mãe, ó Mãe do meu Senhor,

Vem, dá-me luz, vem dá-me amor,

Suaviza a minha cruz!

Desprendi-me de Jesus. Desapareceu o céu com todo o brilho, e o canal do coração da Mãezinha desapareceu com ele. Fiquei de novo sozinha na minha cruz, mas com o coração a arder, todo o peito está em chamas. Com a força que recebi pude ditar tudo isto sem grande sacrifício das minhas palavras. Sinto ainda o fogo no coração, mas os lábios já mal têm força para mover-se.

5 de Fevereiro de 1945

Na noite de dois para três ainda longe de aparecer o dia, ao recordar-me que era o primeiro sábado, senti em mim uma alegria indizível, até a mim me causou espanto; eu, que tenho tanto medo e tanta repugnância aos êxtases, como podia ansiar e alegrar-me com a lembrança de que Jesus ia falar-me? Numas ânsias loucas do céu, esperava com alegria o colóquio com Jesus. Enganei-me: nesse dia ainda não comungara, e Jesus não me falara como de costume. Esperei uma hora, esperei outra, sem O ouvir. Oh! quanto eu sofri! Como não Lhe falei, sofri por não Lhe falar. Se Ele tivesse vindo, sofria talvez com receio de me ter enganado. Bendito seja o sofrimento de cada dia. Estava tão triste! Parecia-me que o mundo tinha coalhado de gelo. Queria possuir o mundo e aborrecia-me dele. Estava cansada de viver, sem sentir a vida.

— Ó Jesus, seja tudo para Vossa maior honra e glória. Servi-Vos de tudo para eu Vos amar e fazer amado. Aceitai tudo, para que as almas sejam salvas. Valei-me, Jesus, valei-me, só o céu pode dar remédio a tantos males.

Esperei todo o sábado, todo o domingo, sem que Jesus viesse, sem que me falasse.

— Ó meu Deus, não pode ser maior o meu abandono.

O demónio rodeava-me em forma de feras; sempre gestos pecaminosos e porcos. Arreliava-me por Jesus não me ter falado; dizia-me que Ele não voltava a falar-me. Veio a noite. Quando rezávamos o nosso terço, já ele me ameaçava e dançava à minha frente de contentamento. Depois que fiquei sozinha, ele principiou a chamar os camaradas dos infernos para virem pecar comigo. Que ia ser uma noite de pecados, prazer e gozo.

— Agora já descansaste, já queres voltar à mesma vida de vícios.

Parecia-me que tinha as mãos atadas; não tinha o terço nem a Mãezinha e não podia bradar ao céu. O coração custa-lhe muito a resistir às suas manhas infernais, parecia-me morrer. Pude então dizer a Jesus:

— Morrer não me importa e morrer da forma que Vos agradar mais, mas pecar não, isso nunca; valei-me, Jesus.

A Sua divina voz fez-se ouvir. Ele falou em meu coração:

— Anjo bendito, obedece à voz do teu Senhor; levanta a minha vítima inocente, livra-a das garras de Satanás.

Nestes momentos, eu estava sobre uns abismos medonhos traçados a sangue. Fiquei de repente nas minhas almofadas, já de mãos soltas e libertada do demónio. Não sei dizer a dor que sentia, desfazia-me o coração. Que pena eu tinha de Jesus! Que receio de O ter ofendido! Não fiquei assim por muito tempo. Voltou Jesus a falar-me:

— Não te entristeças, minha filha, tu não pecaste. Não queres dar-me consolação? Não queres dar-me reparação? Necessito tanto dela nesta hora! Olha, vim ao teu coração buscar alegria, vim ao teu coração buscar amor, consolação e a reparação que desejo. Alegra-te, confia, em ti encontro tudo. Não queres alegrar-me? Alegra-te comigo.

— Bem sabeis, meu Jesus, que tudo Vos quero dar, que só quero viver para Vós e para as almas. Mas sabeis também que a minha tristeza, a minha dor, é o receio de ter pecado. Não posso viver sem Vós.

— Não pecas, filhinha, não te deixo pecar; não vives sem mim. Olha, queres saber porque ontem não te falei? Olha, dei-me a ti com mais amor, com mais intimidade do que se comungasses e não te falei para mais de ti receber. Por não te falar, foi que te tirei o medo e o receio de falares comigo e pus em ti as ânsias, os desejos de me ouvires e de mais te unires a mim. Procedi assim, primeiro para aclarar mais e melhor a tua vida, para dar mais luz àqueles que não querem ver. Quero que eles vejam, que eles conheçam como me comunico a ti, como é a minha vida em ti. Em segundo lugar, para saciar mais a minha sede em ti e tu a tua em mim. Tu és a fonte pura, és fonte de água cristalina. Vem o Rei beber à fonte da sua rainha, e a rainha sacia a sua sede no seu Rei. Vem o Esposo matar as suas ânsias divinas na sua esposa amada, na esposa sem igual. Vem o jardineiro ao seu jardim, ao jardim que aos pecadores pertence. Venham eles a ele colher as flores angélicas. Venham eles a ele abrilhantarem-se, venham eles a ele perfumarem-se; são aromas celestes, são aromas divinos. Ó mundo, que não conheces a preciosidade que te foi dada. Estuda, aprende, pratica. Diz, minha filha, ao teu paizinho que tudo vai a caminhar para o seu fim; comparando-se com os meus breves, o tempo que falta para ele estar junto de ti a desempenhar e a terminar a tua missão na terra é um abrir e fechar de olhos, é a rapidez do relâmpago. Eu não falto, as minhas palavras cumprem-se. Entrega-lhe o meu divino Coração com a abundância do meu amor, do amor com que o amo, do amor com que quero que ele se dê às almas. Criei-o para elas, são elas a causa da sua dor. Diz, minha filha, ao teu médico que lhe dou o meu amor, os meus agradecimentos para ele e para os que com ele trabalham na minha divina causa. Diz-lhe que continue comigo a operar milagre. Vigilância, toda a vigilância. Como prémio do sacrifício dele um orvalho salutar cairá sobre ele e os que lhe são queridos até a finalidade dos seus dias. É orvalho de amor, orvalho de riquezas do céu. Sacrifício, sacrifício. Ele mereceu ser escolhido por Jesus para cuidar da sua esposa mais amada, da sua vítima mais querida. Mãe, minha bendita Mãe, vem comigo dar as tuas carícias, a tua vida celeste à nossa filha querida. Vem dar-lhe o que ontem lhe havíamos de dar; dá-lhe a vida do céu, a vida que na terra vive sem a sentir.

Inclinou-se a Mãezinha para mim, tomou-me nos seus braços, cobriu-me das suas ternas carícias, acalentou-me, bafejou-me e dizia-me:

— Recebe a vida que te é dada, recebe-a e dá-a aos pecadores, ó pombinha do meu Jesus. Consola-O, sofre tudo por Ele. A nossa consolação e alegria são uníssonas; o que dás a Jesus eu recebo também, o que me dás a mim recebe Jesus.

— Ó Mãezinha, é só por Ele e por vós que eu quero e amo os meus sofrimentos. Dai-me força, velai por mim. Estou em tanta dor! Tenho tanto receio de pecar!

— Ó pombinha querida, tabernáculo riquíssimo do meu Jesus, repara, repara, não temas pecar. Posso lá consentir que manches a tua pureza, eu que tanto a amo e tanto me consolo ver-te ao meu lado aureolada, enriquecida de pureza angelical! Coragem! Como eu te amo, como te ama Jesus!

Fui de novo estreitada fortemente por Jesus e pela Mãezinha e logo me senti na minha cruz. Quase logo me vieram as dúvidas e a dor dolorosa de ter pecado e de enganar. Exclamei:

— Jesus, ó meu Jesus, eu não quero enganar-me nem enganar ninguém.

Jesus segredou-me de novo:

— Paz, paz na tua alma, sossega, filhinha, não enganas, não te enganas. É Jesus que te fala, é o Jesus louquinho por ti, que to afirma.

Hoje já comunguei, bendito seja Jesus. Enlouqueci-me tanto ao recebê-lO! Senti por alguns instantes a grandeza do Seu amor e a Sua união íntima comigo. Pouco depois fiquei envolta em espinhos e rasgos contínuos na minha alma a parecer-me não poder suportar esta vida e a querer partir para o céu.

— Ó meu Jesus, quero tudo e não tenho nada. De quem é esta vida? Vivei, vivei em mim, eu não vivo. Eu sinto um doloroso martírio, mas o que sinto não me pertence; é Vossa a minha agonia.

8 de Fevereiro de 1945

A minha dor! Nem eu sei dizer. Que noite tão tenebrosa e triste. Que horrores dentro em mim. Sinto que não posso resistir a tanto. Ó dor, ó dor, horrível tormento. Não posso demorar aqui mais tempo. Assim o disse ontem a Jesus:

— Não posso, não posso, meu Amor, demorar-me aqui.

Quero deixar o mundo e quero levá-lo comigo; não o quero e amo-o; não lhe pertenço e ele é meu; aborreço tudo o que é do mundo e quero prendê-lo, abraçá-lo a ponto de não mais o deixar.

— Ó mundo, o que hei-de fazer por ti. Quero voar para o céu, quero partir para fora deste desterro, quero ir para a minha Pátria e quero levar-te comigo; quero entrar no céu, mas com toda a humanidade.

— Ai, meu Jesus, o que hei-de eu fazer? Ó meu Jesus, deixai-me ir ao limbo, não Vos esqueçais que são Vossas as almas que lá estão. Quero ser vítima, levai-me ao sacrifício por elas. Dai-lhes o céu, o céu, meu Jesus, dai-lho pela Vossa morte, pelas dores da Mãezinha querida. Eu não queria ter um minuto de sossego para o meu corpo, enquanto o mundo existisse, queria que a minha vida fosse percorrê-lo todo dum lado ao outro, sem parar um momento, sempre de rasto, sempre a pisar espinhos, num banho de sangue, numa só chaga, para libertar da escuridão as almas queridas, filhas do Vosso sangue, meu Jesus. Não sei que mais sofrimentos possa desejar para o meu corpo. Ouvi o meu brado, meu Deus e Senhor. Eu aceito tudo o que seja dor, eu aceito tudo o que seja o martírio, mas quero o mundo salvo e na Vossa glória as almas do limbo. É pelo amor com que Vos quero amar, é com a ânsia de Vos dar a maior das consolações que eu quero salvar e levar ao céu todas as filhinhas do Vosso Divino Coração. Amo-as, porque em todas Vos vejo a Vós; amo-as, porque primeiro de tudo e acima de tudo sois o preferido, ó meu Amor. Sim, parece-me estar louca por Vos amar. Não sinto o amor que Vos tenho, mas sinto a loucura por Vós. Sim, meu Jesus, fazei-me perder e desaparecer para sempre no Vosso amor infinito.

O demónio odeia-me, atormenta-me. Apresentou-se na minha frente na figura dum monstro aterrador; era grande como uma casa. Saíam dele tantas serpentes da grossura de pessoas, de bocas abertas e as línguas de fora alguns palmos; estendiam-se até perto de mim. Passado algum tempo, caiu sobre o meu corpo a manha maliciosa desse maldito. Arrumou de mim o terço: não o queria. Ele dizia-me: “vamos ao prazer”, acrescentando palavras do que há de pior.

— Vale mais um momento de prazer – dizia ele – do que milhões e milhões de céus.

Soo quando me pareceu ele ter conseguido o que desejava é que eu, de olhos fitos no céu, clamei muitas vezes:

— Valei-me, valei-me, ó querida Mãezinha.

Senti a dor que já expliquei ao reverendíssimo Padre. Não era dor de tirar só uma vida, era dor de tirar todas as vidas, eu parecia-me perder a minha. Quando esta dor caiu tão fortemente sobre mim, o maldito mais se enfureceu, não gostou que eu a sentisse. A raiva dele ainda mais consumiu o meu corpo. A Mãezinha veio a socorrer-me, tomou-me nos seus santíssimos braços e disse-me:

— Aqui estou, minha filha, a defender-te. Vem para os meus braços, vem descansar. É a Mãe a defender a sua filhinha, é a Mãe a defender e a consolar a esposa mais amada de Jesus. Não pecaste, filhinha. São momentos de tanta reparação, de tanto amor para Jesus! Coragem, sofre contente!

— Ó Mãezinha, que martírio que me custa tanto, tenho receio de pecar. Tenho vergonha de estar na vossa presença e na de Jesus.

— Oferece-nos tudo isto, sossega, não pecas. Recebe graça, pureza e amor.

Estreitou-me ao seu santíssimo coração com tanto carinho, cobriu-me de beijos e mimos e retirou-se. Apesar da vida e conforto que recebi, fiquei por muito tempo a sentir a dor de que acima falei. Custou-me a resistir. Contudo, confiei na Mãezinha, Ela não vinha enganar-me. O que teria sido de mim e o que será ainda sem este conforto do céu. Ó vida triste e amargurada. Sofro com tudo. Continuo a sofrer os remorsos, essa traça que vai roendo nas almas de alguém. Quero-lhes tanto em Jesus e receio tanto a presença delas. Sofro com as infelicidades de alguém que me tem ferido tanto. É tão grande a dor que sinto por saber que sofrem, entristeço-me por eles. Lá vem a morte para mim. O que vejo em mim. O que sinto na minha alma. Que tristes recordações. Sinto e vejo os tormentos que me esperam. Sinto que sou apedrejada, as pedradas batem em meu coração. Sinto que me retiro do convívio das pessoas, fujo para a solidão para em silêncio poder chorar. Oh! quantas lágrimas de perda, oh! quantas lágrimas de vergonha por me ver revestida de todas as maldades e estar assim na presença do Eterno Pai. O amor obriga-me à dor. De lábios mudos, olhos cerrados, entrego-me a tudo, lá vou para a morte. Uma chuva de espinhos cai sobre mim, o meu corpo vai ser um leproso. Mas estou de braços abertos com um terno sorriso e uma mansidão sem igual, escondendo o disfarce de tudo.

— Ai, meu Jesus, eu só queria para maior honra e glória Vossa saber dizer o que vai dentro em mim, o que sofrestes por nós. Ó que ternura, ó que bondade. O inocente, o inocente Jesus.

9 de Fevereiro de 1945

Se todos os dias, ao despertar dos meus ligeiros sonos, desperto mergulhada numa grande dor e tristeza, às sextas-feiras redobra este sofrimento. Não tenho palavras nem sabedoria para o saber exprimir. Quando hoje despertei, sentia-me cansadíssima. Parecia-me que os meus cabelos estavam ensopados em sangue assim como a roupa que tinha ensopada estava também e colada ao meu corpo. Eu estava sozinha numa escura prisão. Sentia a dor do abandono em que me tinham deixado aqueles que me eram mais queridos. Onde estavam as palavras afirmativas de não me deixarem? Tudo isto é um livro de letras bem claras que tenho gravado em minha alma; não são coisas da imaginação. Oh! quantas vezes me esforço por me distrair, para ver se desaparece este sofrimento da alma. Que grande engano. É ferida profunda, é dor vivíssima que só Jesus ou a Mãezinha ma podem suavizar.

Veio depois o demónio em forma de lobo e de leão para a minha frente fazer cenas horrorosas. Confio que não pequei, porque confio na afirmação de Jesus de não me deixar pecar. Se assim não fosse, ai de mim. Maldito demónio, que grande escola de pecado. Eu só queria que as almas conhecessem as suas manhas diabólicas, para não se deixarem iludir por ele. Com a visita de Jesus sacramentado, com o calor do Seu amor divino, que me fez sentir com abundância, revivi um pouco. O conforto que Ele me deu animou-me para poder durante a manhã percorrer o caminho do calvário. Fui tão maltratada! Caí tantas vezes com o peso da cruz e com cordas fui arrastada para trás a tanta distância! Caía com o rosto em terra, e as minhas carnes ficavam pelas pedras aos bocadinhos. Todos os sofrimentos à minha frente aniquilavam-me o coração; era um aperto que o sufocava e tirava a vida. Na cruz, de todos abandonada, ao ouvir as maiores injúrias, sentia correr no meu corpo bagadas do suor da morte. Juntavam-se às gotas do sangue que da minha cabeça e das minhas chagas caíam com abundância. Sentia no sofrimento grande doçura por ser a moeda das almas, mas não podia ter um sorriso. Neste abismo de dor, veio Jesus.

— Minha filha, estou no meu trono, no palácio da minha realeza. É o Rei do Céu unido à sua rainha, à rainha da terra. Aqui, sim, minha pomba bela, aqui não sou ferido, estou bem ao calor do teu amor, aqui está bem guardado o meu divino Coração. A sentinela do teu palácio é a tua pureza, os guardas são as tuas angélicas virtudes, o fogo das armas é o teu amor. São armas que estenderão as suas balas, o seu fogo aos confins do mundo. Não é fogo de morte, é fogo que dá a vida, é fogo que atrai os corações e as almas ao meu Divino Coração. Tu és um mar imenso de riqueza, és porto de salvação. Quando estiveres no céu, junto do trono divino, e lá chegarem em teu nome súplicas a favor de pecadores em perigo, quando a tua voz se fizer ouvir: “meu Pai, quero que aquele pecador se salve”, no mesmo momento ele sentirá o toque da graça; todos por ti serão salvos. Serás um fio de oiro finíssimo que a mim os prende para sempre.

— Ó meu Jesus, já que na Vossa bondade e poder infinito me fazeis no céu assim poderosa, fazei que já na terra todos os pecadores que eu Vos nomear se convertam e sejam salvos.

— Pede, pede, filhinha, és poderosa. Lembra todos quantos quiseres ao meu Divino Coração. A tua vida na terra é fazer bem à mesma terra, nela espalhares o bem. A tua vida no céu será enriquecer o mundo, será orvalhá-lo com um orvalho de purificação e salvação. Ó que riqueza tenho para te dar no céu, para distribuíres para a terra. Já aqui, e depois, de lá incendiarás o fogo do meu divino amor. Escuta, minha filha amada, fulanos – e nomeou-mos – estão em perigo de se perderem. Estão tão cegos nas paixões! Ofendem-me tão gravemente, tão escandalosamente! Queres oferecer-me por eles alguma reparação, para eles se não perderem?

— Ó meu Jesus, eu quero oferecer-Vos tudo, para Vos consolar e para os salvar. Escolhei a reparação que quereis, dai-me a Vossa graça e força divina, com ela estou pronta para todo o sacrifício.

— Aceitas quinze ataques do demónio a mais do que terias de sofrer? Algumas noites sofrerás dois combates. Oferece-me cinco por cada um deles em honra das minhas divinas chagas. Desejava tanto que elas fossem mais amadas e mais amado fosse o meu divino Coração. Espalha, espalha, incendeia no mundo o meu divino amor. Aceita e oferece-me mais um combate em honra da chaga do meu sagrado ombro; oferece-ma pelo sacerdote. Concorreu tanto para ma aprofundar! Oh! quanto eu sofri com ela!

— Bem sabeis, meu Jesus, que os combates do demónio são o maior sacrifício que podeis pedir-me, mas, se com eles Vos posso dar consolação, se só eles podem reparar, como é preciso para tão grandes crimes, aqui me tendes, Jesus, aqui me tendes, Amor, sou a Vossa vítima. quero salvar essas almas ceguinhas pelo pecado, quero desviar para longe do Vosso divino Coração esses cruéis golpes que vêm ferir-Vos.

— Minha pomba, minha pomba, flor angélica, alvura da graça, jardim de delícias, trono de amor para o meu divino Coração, bati, abriste-me a porta, pedi e tudo recebi. Recebe também em troca o meu amor, todo o meu amor. Amo-te como se não houvesse na terra nem no céu mais a quem amar. Vive a minha vida, vive a vida do céu aqui na terra, vive-a, para ensinares, vive-a, para que em ti aprendam. O teu céu vem, não demora, depressa te levo comigo.

Jesus acariciou-me, beijou-me docemente, ao mesmo tempo que me abraçou e abrasou no fogo do Seu divino amor. Poucos momentos fiquei alegre, depressa caí na minha cruz, depressa o meu coração principiou a sangrar de dor. Lembro-me tanto das almas de que Jesus me falou! Mas mais da do sacerdote que, por ser sacerdote, mais ofende a Jesus.

13 de Fevereiro de 1945

Que hei-de eu dizer da minha dor? Nada em comparação do que sinto. Ó meu Deus, que dias tão cheios de dores, tristezas e amarguras. Oh! quanto eu tive de oferecer a Jesus. Oh! se eu Lhe soubesse oferecer tudo quanto magoou o meu coração, o meu corpo e a minha alma! Pobre de mim, não sei falar ao meu Amado, ao meu tudo. Ai, quem me dera que estes dias fossem cheios de amor a Jesus, como foram cheios de grande martírio. Que miséria a minha, eu não O sei amar. Sinto que é Ele a minha loucura em tudo e acima de tudo; sinto que tudo o que faço é por Ele e para Ele. Sinto que todo o amor que dedico a todos os que me são queridos nada é em comparação daquele com que desejo amar o meu Jesus. E não tenho nisto consolação alguma. Não tenho gosto em nada do que sofro e Lhe ofereço, nada é meu, nada vejo em mim a não ser os maiores horrores de miséria.

— Ó Jesus, ó Mãezinha, como nada mais tenho para oferecer-Vos, aceitai esta minha miséria, fazei que ela sirva de honra e consolação para Vós e proveito para as almas.

Ando louquinha à volta do mundo, numa canseira incessável, levo comigo fortes cadeias, quero cercá-lo, quero prendê-lo nessas cadeias. Quero o mundo todo num molhinho, no meio dele Jesus e a Mãezinha. Ó meu Deus, se eu conseguisse não deixar sair deste molhinho nenhuma alma. Se o fogo de Jesus e da Mãezinha incendiasse todos os corações deste molhinho, que bendiria eu por toda a eternidade todos os meus sofrimentos. A chuva orvalhosa continua a cair sobre a humanidade.

— Jesus, Jesus, fazei que seja chuva de amor, chuva de salvação. Não digo nada do que me vai na alma, não digo nada das aspirações que sinto. Se eu deixasse o mundo preso e pudesse ir para o limbo baptizar as almas! E se, depois disso, pudesse ir ao inferno arrancar para Vós as que lá estão! Meu Deus, não sei o que hei-de fazer. Jesus, resisti Vós à minha dor. Vede o meu coração e a minha alma a rasgarem-se continuamente com esta amargura. É por Vós, é pelas almas.

Jesus disse-me que o demónio viria em algumas noites com dois ataques e logo na primeira noite ele não faltou: foram dolorosos. Atormentou-me tanto e por tanto tempo! Vi o inferno e nele uma chuva de almas. E tantos demónios, não tinham conta. Dizia-me coisas tão feias, um que era o senhor deles todos. Sentado numa bancada de delícias, como ele lhe chamava, dizia as palavras mais feias e maliciosas. Tanto queria recorrer ao céu e só tarde o consegui fazer. Ele dava-me a afirmação de me levar ao prazer, ao pecado, à ofensa a Deus. O primeiro ataque ofereci-o a Jesus em honra da chaga do Seu santíssimo ombro e para reparar pelo sacerdote, como Jesus me pediu. Quando eu dizia a Jesus que era pelo sacerdote, então é que o demónio se enraivecia contra mim. Senti a dor, dor mortal, que já expliquei. Sem poder resistir a ela, disse:

— Morro, morro, Jesus. Se morrer, morro contente, morro vítima do Vosso amor, morro vítima daquela alma.

Ao dizer isto, uma aragem passou por mim, colocou-me nas minhas almofadas. Horas depois, ofereci o segundo combate em honra das cinco chagas de Jesus por uma das outras almas. Quando me parecia estar sem vida, num cansaço indizível, ouvi Jesus dizer:

— Anjo bendito, suaviza a dor da minha esposa querida, coloca-a no seu lugar. És, à minha ordem, o seu enfermeiro celeste.

Fiquei libertada das artes manhosas de Satanás e direitinha sobre as minhas almofadas. Não sinto mãos, mas sim um enlevo fofo, uma frescura suave. Fiquei em tanta amargura, na tristeza mais profunda. Se houvesse um lugar onde eu pudesse esconder-me de Jesus, fugiria para lá. Ó meu Deus, que vergonha! E quando Jesus veio para eu O receber! Ansiava pela Sua vinda, mas queria fugir e desaparecer-Lhe; não era digna de O receber em meu coração. Já ofereci mais três combates a Jesus, pois só Lhe ofereço os mais dolorosos. O maldito aparece-me em formas de bichos e feras tão desconhecidas! É horroroso vê-los à minha frente. Um em forma de crocodilo, só mais alto do que eles; tinha uns poucos de metros de comprido. E o inferno com umas cabanas tão feias, tão medonhas! Fogo, um fogo tão escuro e atormentador. Por entre ele tantos cornos de demónios a sobressair. Ele dizia-me coisas tão feias. Que vergonha ao eu ouvi-las e que medo de as ouvir. No auge da minha aflição, bradei por Jesus, porque a dor atormentadora tirava-me a vida.

— Morro, morro, Jesus, e não quero pecar.

O meu coração dava estalos estrondosos, só a morte podia causar tão grande sofrimento. Ao meu brado de agonia, veio Jesus.

— Não pecas, não morres, minha esposa amada. A morte que sentes não é real, a tua morte dá a vida, vida de pureza, vida de amor. Se soubesses o valor desta reparação! Levanta-te, toma o teu lugar, sou o teu Jesus, tenho poder para o fazer, assim como tive poder para mandar levantar e caminhar os mortos.

Já nas minhas almofadas, Ele estreitou-me ao Seu Divino Coração, acariciou-me e beijou-me.

— Se o mundo conhecesse, minha filha, o que é a vida do amor divino!

Dito isto, senti-me sozinha, confortada, sim, e só em ânsias de consolar o meu Jesus, mas logo mergulhada num mar imenso de dor. De vez em quando a receber espinhos, que vêm cercar o meu coração, e continuamente a ser esmagada por desgostos e humilhações. Esperava receber um pouquinho de alegria, não por mim, mas por ver os meus contentes. Jesus não o permitiu, tirou-me a ocasião dessa alegria, desse bocadinho de consolação que eu queria sentir. Ao ver que Jesus me tirava tudo, não tive outras palavras a não ser repetir muitas vezes:

— Bendito seja o Senhor, a Sua santíssima vontade se faça. Ó meu Jesus, aceitai a consolação e alegria que eu poderia sentir, seja ela consolação e alegria para Vós. Aceitai a alegria e aquele regozijo que eu poderia ver entre os que me são queridos. Seja tudo pela salvação das almas.

Ontem, depois das três horas ou mais que passei a falar das coisas de Jesus com uma alma arredada d’Ele há muitos anos e que nunca conheci a frequentar a igreja, fiquei banhada em suor e cansada sem poder mover meus lábios para dizer palavra. Mas este meu esforço não ficou sem recompensa. Jesus permitiu que eu sentisse por algum tempo alegria em meu coração. Essa alma deu-me sinais de arrependimento e prometeu-me esforçar-se por em breve mudar de vida. Parece-me bem que, dentro de breves dias, ela vai ser arrancada das garras de Satanás.

— Ai, se eu visse assim nestas disposições todas as que estão arredadas de Jesus! Quero sofrer, quero sofrer, quero salvá-las. Amo-as, são de Jesus.

15 de Fevereiro de 1945

Não acredito nas minhas dores nem no que digo nem no que faço; tudo me parece mentira, uma completa intrujice. Sinto que o é, mas por graça de Deus não encontro nada em mim a que possa chamar intrujice. O que sofro é por Jesus e pelas almas, o que faço é com os olhos n’Ele e por Seu amor. Alguém me julga da forma que eu me sinto, por isso sofro ainda mais. O que seria de mim, se Jesus não visse e não soubesse tudo. O que eu quero é agradar-Lhe a Ele e consolá-Lo com esta penosa vida, que não é vida ou, se o é, não me pertence. Tudo passa, tudo me foge; tudo passa, tudo me roubam. E eu sempre aqui, não chega o meu céu. Para não faltar à minha palavra com Jesus não lho peço. Mas ai que saudades e que sofrimentos, mais do tempo a parecer-me insuportáveis. É no meio da dor que o coração vai perdendo a vida, não pode resistir; não explico o meu tormento. É certo que Jesus sofre em mim, mas mesmo assim a dor domina-me, caio no desfalecimento. Sinto que a morte vai caminhando para mim, a morte por que tanto suspiro, a morte que eu quero chamar vida, a morte que me leva a gozar de Jesus e da Mãezinha. Deixo então as minhas tristezas, dores e amarguras, vou pedir por todos os que amo, vou pedir pelo mundo inteiro; não vou esquecer os causadores de tanto sofrimento para mim; hei-de pedir por eles, quero que Jesus lhes dê amor, quero que lhes dê o céu. Sinto que sou o mundo, um mundo do rochedo mais duro e fechado e sinto que estou dentro desse mundo. Tenho de transformar esse rochedo, de pedra dura transformá-lo em pedras preciosas, em oiro fino. Que esforço o meu no meio desse rochedo sem poder mover-me para nada; tenho de o mover, de o desfazer, tenho que fazer dele um mundo belo, agradável a Jesus, de encantos para todo o céu.

— Ó Jesus, vede esta louquinha, vede o martírio que a consome. Que hei-de fazer pelo mundo, como hei-de transformá-lo? De que forma hei-de consolar e alegrar o Vosso divino Coração? Faltou-me a acção do Divino Espírito Santo; parece-me que não tenho as Suas graças, as Suas luzes. Sou pobrezinha que nada tem e nada pode vir a ter. Que será de mim, meu Jesus! Não posso viver sem Vós, sem Vós nada posso sofrer.

Ofereci a Jesus mais um ataque do demónio para acudir às almas que Ele me pediu. Os mais violentos são por elas, os outros ficam por quem Jesus quiser. Que coisas feias me diz o maldito, de pessoas, para me ensinar a pecar, e de Jesus, acusando-O de grandes crimes. Horror, horror, é o que mais me custa ouvi-lo dizer coisas contra Jesus. Durante alguns ataques, sinto que eu mesma sou o inferno com todos os sofrimentos e horrores e que eu mesma sou o demónio com todas as manhas e toda a malícia. Não sei explicar-me melhor, o que sei é que em alguns momentos sou um verdadeiro inferno, um verdadeiro demónio. Ele apareceu-me em forma de homem muito feio, vestido de caçador, de arma às costas, passeando à minha frente. Ao lado, estavam muitos em forma de esqueletos, de armas em pontaria direitas a mim. Causavam-me muita impressão, mas não me assustei grande coisa. Eles não podiam matar-me. Temo mais que me matem a alma com outras coisas que ele faz e diz. Oh! como eu receio ofender o meu Jesus! Não posso lembrar-me que hoje é quinta-feira. Que sofrimentos tristes me trazem estes dias. Durante a tarde, sentia-me a passar por entre ruas, seguia o meu caminho e por todos quantos me viam era escarnecida e apontada como ré de todas as culpas e a maior criminosa. Pouco tempo depois do anoitecer, senti-me num convívio de amigos e nessa amizade sentia um traidor, que pouco depois havia de beijar-me, e senti a dor que esse beijo ia causar-me. Senti que era Jesus, e sobre o Seu peito se inclinou um rosto que eu muito amava. O meu coração enterneceu-se de amor por esse rosto. Que conversação de tantos mistérios, de tanta grandeza. Senti que nesse convívio lavei os pés a todos os que me rodeavam. Em mim estava a água, a toalha e a bacia. Senti que um, a quem causava muita impressão lavar-lhe os pés, a um olhar e poucas palavras, até já se despia para, se preciso fosse, lavar-lhe todo o corpo. Ah! se eu pudesse exprimir aqui todo o amor, toda a bondade e ternura de Jesus que bem podia fazer às almas; mas não sei melhor.

— Supri Vós, Jesus, a minha falta.

16 de Fevereiro de 1945

 Quanto sofro, meu Jesus. Sede a minha força. Só Vós sabeis o sacrifício que faço para ditar o que em mim se passa. Este esforço parece arrancar-me tudo o que tenho dentro em mim. Servi-Vos dele para arrancardes ao demónio todas as almas. Faço sacrifício por não poder e faço-o por revelar os segredos da minha alma. Gosto tanto de sofrer sozinha, em silêncio, encobrindo o mais possível as minhas mágoas. Ó meu Jesus, quanta dor abafada, quantas lágrimas escondidas. Perdoai-me a minha falta de eu hoje exclamar: “ó meu Jesus, não acabam as sextas-feiras! Se eu pudesse fugir delas e esconder-me, para não passarem por mim!” A Vossa bondade, Senhor, o Vosso amor, meu Jesus.

Logo de manhã cedo, senti tão maltratado o meu coração; a dor, as humilhações espremiam-me, já não tinha sangue para dar ao corpo. Senti o caminho do meu calvário, saiu-me ao encontro a Mãezinha; fitou-me, eu fitei-a a Ela. Uniram-se os nossos corações na mesma dor. A troca dos nossos olhares não se demoraram, tive de caminhar à frente, maltratada, empurrada, arrastada. Mas a dor dos nossos corações não se separou. Era como que dois fios eléctricos que dão ligação um para o outro. Quase logo que cheguei ao calvário, fui cravada na cruz. Que grande tempo de agonia. O sangue corria, as chagas rasgavam-se cada vez mais. As lágrimas da Mãezinha corriam em meu coração. Ela era um farol para mim e eu outro para Ela, farol que dava luz para descobrir todos os nossos sofrimentos. Ainda sem ter expirado, senti que me rasgaram o coração. Essa dor antecipou-se, porque, depois de morrer, não a podia sentir. Quando assim sentia o coração, lancei um olhar ao mundo e disse-lhe:

— É por ti que estou assim.

Veio então o meu Jesus. Senti a entrada d’Ele em meu coração. Sentou-se e inclinou-se a mim e disse-me:

— Minha filha, loucura de amor pelas almas, loucura de amor por mim. És louca pelas almas à minha semelhança. Assemelhei o teu calvário ao meu. A tua vida é vida de Cristo, vive Cristo transformado em ti. Sobes o calvário, porque não posso subi-lo eu agora. Levas a cruz, porque não posso levá-la eu também. És o cordeirinho sacrificado e imolado, dás a vida na maior das agonias, porque agora não posso eu sofrer assim. É revestida de mim que sofres, é comigo que levas a cruz, é comigo que nela expirarás.

Por um grande intervalo de tempo, vi Jesus com a cruz aos ombros. Não O senti, vi-O. Mas eu era Jesus e era a cruz. Que cruz tão grande! E Jesus tão curvado debaixo dela; o Seu santíssimo rosto quase chegava ao chão.

— Minha filha, assim me obrigam os pecados do mundo, assim me obriga o meu amor às almas. São os crimes, é o amor a causa de caminhar quase de rosto em terra. Sofre, minha amada querida, sofre à minha semelhança, és vítima escolhida por mim. Minha filha, fonte salvação, fonte de toda a humanidade, és fonte que não seca, és água que sacia todo o mundo; todo em ti pode beber, todos nesta água se podem purificar. Minha filha, língua de louvor. Pela tua língua sagrada toda a terra me louvará até ao fim do mundo. E já no céu os anjos e santos me louvam ao verem o teu sofrimento e a glória que me dás. Minha filha, coração de fogo de amor, fogo que se estenderá e abrasará milhares e milhares de corações. Minha filha, corpo de pureza, pureza angélica, assaltada sempre e sempre guardada no meio dos mais agudos e penetrantes espinhos. O teu corpo de pureza, adornado de todas as virtudes, as mais ricas e preciosas, estende as suas pétalas de lírio com toda a sua alvura e perfume. Crescem açucenas tenras e viçosas, abrem as suas pétalas e com a aragem que passa estendem ao longe o seu perfume, vicejam em prado mimoso; fazem sombra ao mundo que te confiei. Ditosos todos aqueles que estão à sua sombra, ao teu abrigo se colocaram. Causa espanto a tua vida, as minhas maravilhas em ti. Não há igual, porque igual não há ao teu sofrimento. Tu partes para o céu. Coragem, ele aproxima-se. Tantos te verão partir com amor e saudade e quantos com remorso e dor por terem sido causa do teu martírio, por terem servido de estorvo à minha divina causa, por tentarem encobrir ao mundo as minhas maravilhas em ti. Rastejam pela terra, não olham ao alto, não compreendem, nem procuram compreender a minha vida divina, apesar de eu em todos os caminhos lhes pôr um guia e uma luz. Fecham os olhos, deixam os guias, seguem caminhos errados. Que mágoa para o meu divino coração e que mal para as almas. Dou todas as graças, dou todo o remédio para as salvar, e tudo é desprezado, não olham à minha dor nem à minha divina vontade.

— Meu Jesus, não estejais triste, dai-me a Vossa tristeza, dai-me toda a dor do Vosso divino Coração. Não posso consentir no Vosso sofrimento. Conheço a loucura do Vosso amor pelas almas; aqui me tendes pronta a sofrer por elas, a dar a vida por elas. Ficais assim consolado, meu Jesus? Deixai os homens ferir o meu coração para assim Vos poder salvar mais almas. Mas não consintais que o Vosso seja ferido.

— Não, não, minha filha, não, não, minha amada, não posso consentir que esta cegueira se prolongue. A luz vai brilhar, a minha divina causa triunfa estrondosa e brilhante. É necessário, é urgente, as almas necessitam de conhecer as minhas maravilhas e de aprender em ti a amarem o meu divino coração, a amarem tudo o que é meu, amarem a dor e a cruz que lhes dou. Filhinha, filhinha, dor e amor sem igual, descansa em meu coração como eu descansei no teu. Descansou o rei no seu trono, no palácio da sua Alexandrina. Descansa a rainha no trono do seu rei, no palácio do seu Jesus.

Jesus abriu-me o Seu divino Coração, eu entrei e inclinei-me a Ele, n’Ele descansei. O meu Jesus cobriu-me de beijos e carícias e apertou-me com tanta força e com tanto amor que me parecia perder-me nesse amor e nesse amor morrer. Ai, que dita a minha morrer de amor e dentro do Coração do meu amado Jesus. Como será a morte que me dá a vida eterna?

— Ó meu Jesus, fazei que seja de amor, só de amor.

20 de Fevereiro de 1945

Que horrível, que extrema é a agonia da minha alma. Eu queria esconder a minha dor, não queria falar mais dela, queria abafá-la por completo. Parece-me que o coração chora de amargura. De longe a longe as mágoas que ele sente fazem-me bailar nos olhos as lágrimas. Quero encobrir tudo, bastava que Jesus soubesse; mas não posso, manda-me a obediência. E, embora como que arrastada, vou descobrindo, vou arrancando de dentro para fora alguma coisa do que sofro, do que sinto. Não sei se pelo estado grave do sofrimento em que me encontro, ou se é a realidade, sinto-me no pôr-do-sol da vida; parece-me que a morte se avizinha de mim. Curvo-me, inclino-me de boa vontade a receber o golpe que Jesus lhe aprouver dar-me. Sinto no meu coração a separação dos que me são queridos. Vou para a minha Pátria, mas alguma coisa quero deixar entre eles para os animar e consolar na sua dor. Não sou daqui, vou para o meu lugar, depressa nos veremos nessa glória sem fim.

— Meu Deus, meu Jesus, o que será isto?

Quero partir, tenho de partir e custa-me tanto esta separação. A dor que isto me causa, parece-me arrancar o coração e com ele todas as veias do meu corpo. Seja tudo pelo amor do meu Jesus e pela salvação das almas. Sinto que o mundo está em tanta desordem, tanta miséria e crimes! E eu quero pôr termo a tudo isto e não posso; queria remediar todo este mal e não sei como; não tenho mais que dar por ele. Ah! se houvesse alguém que por ele quisesse sofrer, que o pudesse salvar, o que lhe daria eu? O meu amor, tudo o que possuísse, o céu com toda a glória, se esse me pertencesse. Ai de mim, não sei a quem pedir e não tenho que lhes dar. Sinto a repugnância que há ao sofrimento e à cruz. Se houvesse quem de boa vontade a aceitasse, e eu pudesse levar a minha e ajudar os outros a levarem a sua, seria a maior alegria e consolação para o meu pobre coração.

— Meu bom Jesus, vede o que por Vosso divino amor e amor às almas quero sofrer e aceitai como se o fizesse, porque não posso mais.

Para atender aos pedidos de Jesus, ofereci-Lhe mais ataques do demónio. Para esse fim, só Lhe ofereço os mais custosos. Os de menos sofrimento deixo-os para reparar todas as almas. Ele aparece-me em forma de bichos tão variados, tão feios, em monte, misturados uns com os outros. Mas é o que me faz sofrer menos. Atormenta-me muito mais, quando ele diz que eu não faço certas coisas, porque o sofrimento mas não deixa fazer, o cansaço e males do meu corpo, que são o que o impedem. Isto causa-me mais dor, faz sangrar mais o meu coração. Quer ele dizer que tudo é feito por mim, por minha malícia. Nos dois ataques mais fortes, veio sempre Jesus a confortar-me. Depois de eu ter ouvido os insultos mais feios e as palavras mais vergonhosas, depois de ele usar de todas as manhas para me levar ao pecado e ao prazer, como ele me diz, fiquei sobre abismos assustadores.

— O que será de mim, meu Jesus? Valei-me, valei-me – repetia eu.

Senti Jesus a meu lado, sobre mim espalhou o Seu sopro divino, sopro quede repente me levou às almofadas. Jesus continuou a bafejar-me e a dizer-me:

— Coragem, minha filha, não pecaste. É para livrar as almas de caírem neste abismo e perderem-se eternamente que tu estás sobre eles.

As palavras de Jesus encorajam-me, mas não me tiram da dor em que fico mergulhada. Na segunda afronta do demónio, causou-me uma amargura como ainda não me tinha causado. Foi muito demorado o combate. Os gestos, as palavras, os nomes, os conselhos eram vergonhosíssimos. Eu estava cansada de tanta luta. E o demónio, furioso por não conseguir de mim o que desejava. Principiei então a sentir desejos de pecar, eram uns desejos de fora para dentro e não de dentro para fora. Algumas vezes, dizia a Jesus: “não, não, eu não quero pecar”. Estas palavras saíam-me do coração, mas a vontade de pecar parecia ser mais forte do que o brado que eu levantava ao céu. Ó agonia, triste agonia. Ao parecer-me que estava tudo conseguido, os desejos do demónio realizados, gritei por Jesus e pela Mãezinha:

— Ai de mim, o que é isto? Valei-me, valei-me.

Senti a dor indizível que muitas vezes já tenho sentido. Meu Deus, com certeza a morte não custa tanto. Estava banhada em suor, parecia ter saído dum lago. O coração batia alto e apressadamente. Em espírito, oferecia tudo a Jesus e não cessava de chamar por Ele, pois era dolorosa a posição em que estava e a vergonha e dor que sentia com o receio de ter pecado. O demónio não saía de junto de mim, mas à voz de Jesus retirou-se.

— Basta, basta, maldito, deixa a minha vítima, a vitória é dela; a honra, a glória são minhas, a reparação é pelas almas. Sofre por amor, é minha filha querida.

Sem saber como, tomei a minha posição, recebi as carícias de Jesus, enquanto o demónio, voltado para Ele, amaldiçoava-O e raivosamente queria retalhar-me. Retirou-se Jesus, e eu fiquei absorvida numa noite triste e assustadora e numa dor sem fim.

Sinto na minha alma que se levantam à volta de mim ondas fortíssimas como as ondas do mar. Cercam-me com a mesma fortaleza, mas como as do mar que muita vez se infrangem uma contra a outra; longe da praia, estas também desaparecem sem causarem estragos. Esta visão e o seu ruído, chegando aos meus ouvidos, atormentam-me dolorosamente. Tenho a sensação de que sejam coisas que se levantam contra mim.

22 de Fevereiro de 1945

De manhã cedo, comecei a sentir a minha alma atormentada pela dor que me causava a viagem que a Deolinda ia fazer. Ia com pessoas que tanto estimava e visitar pessoas que tanto amava. Fazia muito gosto que ela fosse, mas gostava de eu ir também. Ofereci a Nosso Senhor o sacrifício de não manifestar os sentimentos que me iam na alma. Mas, por fim, não fui capaz de me vencer, mostrei a minha pena e saudade. Fiquei na minha cruz, aumentada pela preocupação do que se passaria na viagem pela fraqueza da minha irmã, e que correria mal a viagem para todos, e pelo paizinho que eu esperava fossem visitar, o que teria dado a ele um grande gosto, coisa que se não pôde realizar. Senti-me também mais pequenina por ver que pessoas de respeito tanto se incomodavam por nós. Este sentimento persegue-me nestes dias, sentindo cada vez a minha indignidade diante de qualquer pessoa que me vem visitar. Na noite deste mesmo dia, sofria amarguradamente as consequências daquela tarde. Sem querer, recordava o que se tinha passado. Nem ao menos Jesus deixou a minha alma sentir o conforto da confissão. Oh! Não. O bondoso sacerdote não me deu conforto; já não foi a primeira vez. Vejo que Jesus até isso tirou para Ele. Anseio sempre a visita do confessor para mais purificar a minha alma e depois confessar-me. Meu Deus, que amargura! Amargura, sim, grande, muito grande, mas estava em paz, tinha a tranquilidade da alma, porque não menti nem pensei em enganar.

— Aceitai, Jesus, a minha amargura; eu quero-a, eu amo-a, porque Vos amo e amo as almas.

Estavam duas noites em contacto uma com a outra: a noite que ia lá fora e a noite dentro de mim. O demónio afirmava-me ter havido desastre na viagem dos que eram tão queridos. É o pai da mentira, queria atormentar-me. Pouco depois, acabavam de chegar. A alegria não foi para mim, Jesus não permitiu que eu a sentisse. Estive algum tempo com o santo sacerdote que veio para dar luz à minha alma e tirar-me das minhas dúvidas. Parecia-me mentira ele estar junto de mim; sentia-o a uma distância tão longe que nada havia que pudesse alcançá-lo. O seu rosto parecia-me apenas uma casca de ovo.

— Ó meu Deus, como são variados os Vossos sofrimentos.

Ia alta a noite, eu estava sozinha, veio o demónio, insultou-me, convidou-me ao mal, à carne, ao prazer. Lutei tanto, tanto, estava num banho de suor. O coração de momento para momento parecia perder a vida. O maldito, sem conseguir de mim o que desejava, disse-me:

— Hei-de levar-te ao prazer. Já que eu não basto, chamo a minha tropa. Vêm já, eu sou chefe de comando.

Chamou pelos camaradas: principiaram a subir dum profundo abismo por entre chamas muitos demónios em forma de esqueletos. A minha aflição era grande, temia que fossem ouvidos os meus gemidos. O maldito dizia-me:

— Caladinha, que não venha aqui aquele fulano - e chamou um nome feio ao santo sacerdote – Desde que me satisfizer em ti, vou matá-lo, vai morrer debaixo do meu pé, ao fio da minha espada.

Eu estava sobre abismos assustadores. Meu Jesus, que escuridão! Só de longe a longe caíam sobre eles umas folhas brancas que mais faziam mostrar os seus horrores, as suas negras trevas. Ou porque os demónios se satisfizessem de me atormentar, ou porque Nosso Senhor assim o permitisse, deixaram-me. Já não podia mais; era tão violenta a minha posição! O que fazer, se eu não podia mover-me? Triste, muito triste, na dúvida de ter pecado, clamei, clamei por Jesus. Enquanto isto fazia, corriam os demónios, virados ao quarto do bondoso sacerdote, dizendo-me, já de longe, que o iam matar. Levavam nas mãos espadas, ou não sei o quê. Ainda com esta visão, ouvi Jesus dizer:

— Anda, meu anjo, desempenhar a tua missão.

Fiquei logo direitinha nas minhas almofadas. Jesus disse-me então:

— Não pecaste, minha filha, coragem. Viste as pétalas brancas que sobre os abismos caíam? São pétalas da tua reparação. Com a sua alvura, iluminam as almas que neles estão, atraem-nas a si e vêm ao meu Divino Coração.

Mais confortada com Jesus, o ferimento de todo aquele passado continuou a causar-me imensa dor. Não tinha susto que os demónios tivessem feito a morte que tinham dito. Só de manhã, como achava que ele estava muito em silêncio, veio-me o temor que ele estivesse morto. Nosso Senhor nada disso tinha permitido. Recebi o meu Jesus, desprendida d’Ele, despreocupada, só de momentos a momentos é que Lhe dizia:

— Ó meu Jesus, como eu estou, não Vos amo, não Vos dei graças. Perdoai-me, tende dó de mim.

Veio o sacerdote para falarmos das coisas da minha alma, e eu continuei a sentir-me longe, sempre longe, mergulhada num mar de dores na alma e no corpo. De vez em quando, sentia dentro de mim estremeções, horrores, grande repugnância por ter de dizer o que se passava em mim, por me sentir pequenina e miserável, tímida e envergonhada diante das pessoas queridas, por não compreender a minha vida e não amar Jesus, e atormentada a mais não poder com a lembrança de ser quinta-feira. Oh! se desaparecessem estes dias – dizia eu. Sinto que se aproximam de mim todos, todos os sofrimentos e que estão a armarem-se laços para me prenderem. Era já noite, e eu sentia na minha alma a intimidade dos que me eram tão queridos, dos que junto a mim estavam reunidos. Tinha de deixá-los, tinha de partir para o céu, mas de alguma forma ficar entre eles, não me separar deles. Ó sofrimento amado, quem te compreenderá?!

23 de Fevereiro de 1945 – Sexta-feira

Na madrugada de hoje, quando me despertei do meu leve sono, logo me senti numa escura prisão. Senti o corpo tão magoado e cansado! A minha tristeza era tão profunda! Sentia tanta dor de ser tratada como louca! Essa loucura era amor, era a loucura das almas.

Pouco depois, veio o demónio para acabar de consumir o meu pobre corpo. Manhoso como sempre, tentou levar-me a praticar acções criminosas e feias.

— Hei-de satisfazer-me em ti, hei-de deliciar-me em ti apesar de me causares nojo.

Encheu-me de insultos e mostrava-se enojadíssimo de mim mesma. Foi dolorosa a luta, foi triste e triste me deixou. Chamei por Jesus e pela Mãezinha, afirmei-Lhes não querer pecar. Parecia-me chamar por Eles só depois do mal feito. Invoco os seus santos nomes sempre que posso, mas é quando o demónio deixa. Uma aragem suave veio apagar os meus suores e suavizar a minha dor. Fui suavizada por pouco tempo. Não sabia como preparar-me para receber o meu Jesus. Apoderou-se de mim a vergonha de O receber em meu coração, de viver na presença de Deus depois de passar por coisas tão feias.

— Jesus, que sofrimentos tão grandes, os ataques do demónio, as sextas-feiras. Aceitai tudo, é pelas almas, é uma prova do meu amor.

Veio Jesus, e, por Sua grande misericórdia, só um pedaço depois de O ter recebido é que me lembrei da triste cena que com o demónio tinha passado, e logo de novo continuou essa dor juntamente às dores horríveis da minha cabeça, causada pelos espinhos. Sentia-a toda cercada deles e bem profundos. O sangue, que dela corria, ou antes, que eu sentia como se ele corresse, passava-me aos lábios, sufocava-me, por vezes perdia a respiração. Logo que cheguei ao calvário, cravaram-me na cruz. Era tal a violência que sentia fazerem-me ao meu corpo, parecia-me os ombros deslocarem-se do corpo. O sangue das chagas corria a jorros, banhava o pé da cruz e corria pelo chão. A Mãezinha, ao pé, unia à minha a sua agonia. Abandonada, completamente abandonada, ia a expirar. Veio Jesus. Senti-O entrar no meu coração e nele se sentar ainda antes de O ouvir. Sentou-se e, como para descansar, inclinou nele a Sua santíssima cabeça e disse:

— Minha filha, desce o amor à dor, a luz à noite, à escuridão, às densas trevas. Dor, noite, escuridão e densas trevas permitidas por mim. É o remédio, é a medicina das almas. Aqui posso descansar, aqui não pode o mundo ferir o meu divino coração, aqui recebo tudo, tudo o que pode dar uma criatura ao seu Deus; aqui consolo-me, delicio-me.

— Meu Jesus, custa-me tanto, tanto ouvir-Vos falar assim. Sou tão miserável, sou só miséria. Como podeis dizer isso? Como podeis consolar-Vos, depois de tanta maldade e ingratidão que encontrais em mim, para me falardes desta forma?

— Escuta, filhinha amada, não quero, não posso consentir que voltes a dizer-me o que encontro em ti para assim te falar. Não posso eu honrar-te com honrosos títulos, levar-te à maior altura, à mais alta dignidade? És minha filha, falo do que é meu. És minha esposa, esposa que possui as qualidades do seu Esposo, esposa que só ao Esposo se assemelha. Enriqueci-te das minhas riquezas, elogio e honro as minhas coisas, o que é meu. Tu és a minha pomba bela, um coração de fogo, fogo que queima, fogo que purifica, fogo que atrai a mim os corações, fogo que é capaz de incendiar o mundo, o mundo que te confiei, o mundo que é teu. Pede, pede, minha filha, pede oração e penitência e emenda de vida, pede, e que peçam aqueles que desejam ver o reinado do meu divino coração. Oh! O que espera o mundo, se não se levanta e se reconcilia comigo.

Jesus levantou-se do meu coração, ergueu as Suas santíssimas mãos, e dos Seus santíssimos olhos corriam lágrimas em grande abundância: pareciam duas fontes. A soluçar muito, continuou:

— Vês o meu divino Coração aberto? É o pecado, é o prazer da carne; é o pecado, é o mundo. Salva-o, salva-o, minha filha, não deixes perder o meu Sangue. Pede-lhe que se converta, faz que as almas venham a mim, reúne em meu divino Coração as minhas ovelhas, todo o meu rebanho. Pede, pede em nome de Jesus. Penitência, oração e sincera reconciliação.

— Jesus, Jesus, basta, não façais isso. Ofereço-Vos a minha vida e a minha morte; ofereço-Vos todo o meu corpo e todo o meu sangue; dou-Vos o meu amor, aceito quanto Vos aprouver dar-me, toda esta vida de sofrimento, mas levantai-Vos já, meu Jesus, descei as Vossas santíssimas mãos, estancai as Vossas lágrimas. Que horror, meu Jesus, não posso ver-Vos assim. Como pode a grandeza infinita ajoelhar-se diante da maior miséria, do mais pequenino nada?!

Jesus levantou-se, sentou-se de novo em meu coração, estendeu sobre os meus ombros o Seu santíssimo braço e uniu o Seu santíssimo rosto ao meu, apertou-me fortemente, cobriu-me de beijos e incendiou no meu coração o fogo que no d’Ele ardia.

— Quanto consolou o meu divino Coração a tua oferta, o teu amor. Vejo em ti a graça, a pureza, a heroicidade das almas.

— Não é isso que eu quero, Jesus. Dizei-me a razão por que procedestes assim? Sendo Deus, ajoelhaste-te diante da criatura mais pobre e miserável. Só Vós sabeis quanto isso me atormenta.

— Minha pura, minha bela, maior é o sacrifício, mais tens que oferecer-me. Escuta então. Não é de joelhos, de mãos postas e com lágrimas que se movem os corações à compaixão? É tão grande o amor que tenho às almas como grande é o meu poder. O meu procedimento é a sede das almas. Não se pode comparar a sede humana à sede divina. Quantas vezes as criaturas, para saciarem a sua sede ardente, ajoelham-se, mergulhando seus lábios em água nojenta, lodosa e em lama. Eu, a grandeza sem igual, para saciar minha sede, para pedir a salvação das minhas almas, ajoelhei-me na minha esposa querida, revestida de mim, transformada em mim, a pedir-lhe as almas, a pedir-lhe o mundo, esse mundo que é lodo e lama nojenta. Assim transformada em mim, nada via em ti de miséria; vi as minhas maravilhas, a minha grandeza. Não é verdade que eu disse: “o que é grande faça-se pequeno”? Tu és o espelho que tudo reflecte. Em ti, como quando passei no mundo, vou dando o exemplo. Maravilhosa lição, ensina-a às almas. És tu, filha minha, que lhe dás o passaporte para a eternidade. Ai do mundo, ai de Portugal, se não corresponderem às graças que lhes dou. Ai do mundo, mas ai mais ainda de Portugal, se não agradecer os benefícios que por ti recebe. Espalha pureza, espalha a graça, incendeia amor, amor, amor. E descansa, vítima inocente, em meu divino coração, toma conforto para a tua dor sem igual e inigualável martírio.

Inclinei-me eu então para Jesus, descansei no Seu Divino Coração, e nova efusão de amor, vinda d’Ele, abrasou o meu coração. Já vai alta a noite, sinto-o a arder, mas já mal posso dizer palavra.

— Tomai, meu Jesus, tomai em conta o meu sacrifício. Se em mim houvesse querer, preferia andar sempre, sempre de rosto em terra e nada dizer do que se passa em minha alma.

26 de Fevereiro de 1945

Custa-me tanto falar da dor! É tão grande o meu sacrifício! Se eu pudesse encobrir as minhas amarguras!

— Meu Deus, não me deixes, tenho de obedecer, tenho de falar dela; é a dor a minha vida contínua.

Sofro de dia, sofro de noite, sofro a toda a hora e momento. Sinto-me rolar pela terra; rolo, corro mundo sem parar, e é a dor que me obriga. Rasga-se-me o coração e a alma e todo o ser. Sinto que um mundo de feras cai sobre mim, todas com trombas como elefantes, que penetram no meu corpo, me chupam todo o meu sangue; estou esgotadíssima, não tenho mais para lhes dar. De boa vontade eu mesma lhes abro as veias para elas chuparem. Mas, pobre de mim, estou como um rio que secou, e só se encontram nele areias espessas e ressequidas.

— Ai, meu Jesus, que hei-de eu fazer mais por Vós? Que mais hei-de fazer pelas almas? Ai, o mundo que não vê, e eu não tenho luz para lhe dar. Ai de tantas almas que têm sede, e eu não posso saciá-la. Deixai-as, meu bom Jesus, fazei que elas entrem todas no Vosso Divino Coração: aí encontram luz, nele podem saciar-se. De Vós podem receber toda a vida que necessitam e que eu não tenho para lhes dar.

A minha preocupação é Jesus, a minha preocupação são as almas.

— Ó dor, triste dor, eu quero-te, eu amo-te; vens de Jesus, beijo-te, abraço-te, sorrio-te de alma e coração. Mas, meu Deus, como viver esmagada debaixo deste peso universal?

Os olhos do meu corpo não podem ver o sol que com os seus raios teima entrar pela janela e vir até junto do meu quarto. Os meus olhos não podem vê-lo nem o meu espírito recordar que ele existe, porque os olhos da minha alma só vêem noite, tremenda noite dentro e fora de mim. Os meus ouvidos não podem ouvir os gorjeios das avezinhas que, com os seus trinados, fazem lembrar a primavera que se aproxima. Não posso ouvir o mar com o seu barulho estrondoso, porque o mar sem fim, ameaçador, sempre ameaçador, com ameaças destruidoras, está sempre sobre a minha alma. Tudo isto me faz lembrar a grandeza e o poder do meu Deus e obriga-me a entrar dentro de mim, a viver dentro em mim, a não sair fora de mim, juntando Jesus com Sua grandeza, com o Seu poder, com o Seu amor à amargura, à dor, à noite da minha alma. Vivo na presença do meu Deus sem O amar, sem O conhecer, sem nada Lhe dar. É a grandeza sobre o nada, é o fogo no gelo, a vida na morte. Jesus assim o quer.

— Ó vontade do meu Senhor, só a ti quero também.

Mais uma noite em que o demónio veio duas vezes, com os seus penosos e tremendos ataques. A princípio, lutei só com ele. Como demorasse a conseguir de mim o que desejava, disse-me que ia chamar mais demónios para satisfazer-me. Assim o fez: vieram mais. Combati por muito tempo ainda. Nova ameaça:

— Não vais ao prazer por tua vontade, convido mais para te levarem ao pecado, ao crime.

Tudo isto era acompanhado de palavras e nomes horrorosos. Pobre de mim. O suor escorria-me, o coração palpitava aflitivamente. Só depois do mal feito, ou que a mim me pareceu que foi mal feito, coberta duma dor sem igual, bradei, afirmei:

— Valei-me, Jesus, não quero pecar.

Era impossível eu mover uma aresta. Meu Deus, que posição violenta! Ouvi Jesus que falava a meu lado, enquanto eu estava sobre um abismo cercado em toda a volta dum enleio de espinhos. Vi-os claramente, porque, por entre os espinhos, brilhava mais branca que a neve não sei o que era, pareciam pedacinhos de nuvens; com a sua alvura, brilhavam e apareciam os espinhos agudíssimos, enleados uns nos outros. Era tão grande o abismo, não tinha fundo. Era negro, negro, assustador. Só me encantavam os espinhos com a alvura daqueles pedacinhos brancos. Quando Jesus chamava: “anjo, meu querido anjo, anjo da minha esposa e vítima, leva-a ao seu lugar, com todo o amor e carinho”, no mesmo instante tomei a minha posição, fiquei nas minhas almofadas. Principiei a ver o fundo do abismo que vinha subindo, subindo quase até cima como se fosse uma enchente de água. Jesus cobriu-me de carícias e disse-me:

— Não pecaste, não pecaste, minha amada. A tua reparação, as raízes fortíssimas do teu amor arrancam deste medonho abismo as raízes do pecado das almas que nele estão. Vêm subindo para mim, embora caiam, não voltam a cair tão fundo, caem para se levantarem e, a pouco e pouco, ficarão firmes. Coragem, filhinha! Não tens nisto consolação?

— Meu Jesus, não tenho outra senão a de Vos ter consolado. E Vós estais?

— Muito, muito, minha pomba bela. Espremo, espremo o meu cachinho de uvas, consolo-me, delicio-me nos preciosos licores que ele me dá. Chupo tudo para minha consolação e alegria, tudo aproveito para as almas. É por isso que não te dou alegria nem consolação com a presença daqueles que ta podiam dar, privando-os a eles de se consolarem e alegrarem de te verem alegre e consolada.

— Obrigada, meu Jesus, seja feita a Vossa vontade.

Horas depois, voltou o demónio, principiou com as mesmas manhas e actos feios. Logo que o pressenti, ofereci-o a Jesus em reparação pelas almas que Ele me pediu. Fi-lo depressa, enquanto o maldito mo deixava fazer. Quase nos mesmos momentos, dizia:

— Jesus, Jesus, não quero pecar.

No mesmo instante, repetia em mim sem eu querer:

— Quero, quero pecar, quero o prazer, quero gozar.

Imediatamente, voltava a dizer:

— Jesus, Mãezinha, valei-me, não quero ofender-Vos.

Logo repetia, sem minha vontade:

— Quero ofender-Vos o mais gravemente.

Pobre de mim, parecia-me estar toda, toda entregue a Satanás, toda em ânsias de satisfazer paixões. O meu coração já não podia com tanta luta. O meu corpo não era cinza, não era outra coisa a não ser dor, dor que só pode ser conhecida por quem a experimentar. Parecia-me que o demónio tinha realizado os seus desejos. Voltei a chamar por Jesus. O maldito dizia-me:

— Chama-O agora, depois de satisfeita, depois de teres pecado.

Veio Jesus, colocou-se ao meu lado, não fez outra coisa senão levantar a sua bendita mão à frente de Satanás; deu-lhe sinal de paragem, e, imediatamente, cessou o ataque, e o maldito fugiu.

— Ó meu Jesus, em que agonia me preparei para Vos receber. Que grande confusão a minha. Que vergonha ao dar-Vos entrada no meu coração. Não posso pensar na Vossa bondade infinita.

Durante o dia, surgiram-me espinhos dum lado e do outro. De boa vontade, sem tentar desviá-los, com os olhos em Vós e por amor às almas, todos deixei cravarem-se em meu coração. Ou sofrer ou morrer. Se não consolo o meu Jesus, se não salvo almas, que estou aqui a fazer, para que serve a minha vida? Para nada, nada.

   

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