O primeiro episódio que a Beata
Alexandrina recorda na sua Autobiografia decorre, na sua parte inicial, em
Gresufes, e, na restante, em Viatodos. Conta ela:

Até aos três
anos de idade não me recordo de nada, a não ser de algum carinho que dos meus
recebia. Com os meus três anos recebi o primeiro mimo de Nosso Senhor.
Como era
desinquieta e, enquanto minha mãe descansava um pouco, tendo-me deitado junto
dela, eu não quis dormir e, levantando-me, subi à parte de cima da cama para
chegar a uma malga que continha gordura de aplicar no cabelo – conforme era uso
da terra – e, por ter visto alguém fazê-lo, principiei também a aplicá-la nos
meus cabelos.
Minha mãe deu
por isso, falou-me e eu assustei-me. Com o susto, deitei a malga ao chão, caí em
cima dela e feri-me muito no rosto.
Depois
do mal feito, há que remediá-lo:
Foi preciso
recorrer imediatamente ao médico que, vendo o meu estado, recusou-se a
tratar-me, julgando-se incapaz.
Minha mãe
levou-me a Viatodos, a um farmacêutico de grande fama, que me tratou, embora com
muito custo, porque foi preciso coser a cara por três vezes e levou bastante
tempo a cicatrizar a ferida. O sofrimento foi doloroso.
Ah, se desta
idade soubesse já aproveitar-me dele!... Mas não. Depois de um curativo, fiquei
muito zangada com o farmacêutico; este ofereceu-me alguns biscoitos e vinho, que
depois de amolecidos no vinho queria que os comesse. Eu tinha fome e, às vezes,
até chegava a chorar porque não podia mexer os queixos. Não aceitei a oferta e
ainda maltratei o farmacêutico.
Ora aqui está a
minha primeira maldade.
O remate da citação é comum; a autora
faz questão de dar evidência aos seus defeitos… que eram insignificantes.
O
golpe que fez no rosto deixou-lhe marca para toda a vida.
A Beata Alexandrina terá voltado a
Viatodos na sequência do Salto e terá passado de novo por lá aquando da ida a
Braga, ao Congresso Eucarístico Nacional.
O «farmacêutico de grande fama» de que
se fala na transcrição era o Sr. Oliveira, da Farmácia da Isabelinha. Foi um
homem muito conhecido nas redondezas e que se tornou abastado. A casa retratada
na imagem, onde ficava a farmácia, foi muito alterada aí pelos anos sessenta do
séc. XX. Recentemente, um violentíssimo incêndio provocado por um tanque de
carburante que se derramou e incendiou na estrada, mesmo em frente a esta casa,
vai talvez impor a sua reconstrução de raiz.
Na sua ida para Viatodos, a pequena
Alexandrina terá passado por Grimancelos, a que se refere uma vez numa carta ao
Pe. Pinho. Daí que se coloque também aqui a fotografia da Igreja Paroquial desta
freguesia.
Um conhecido episódio da meninice da
Alexandrina decorre na Igreja de Gondifelos. Demos-lhe a palavra:
Foi aos nove
anos que fiz pela primeira vez a minha confissão geral e foi com o Sr. Pe.
Manuel das Chagas.
Fomos,
a Deolinda, eu e a minha prima Olívia, a Gondifelos, onde Sua Reverência se
encontrava, e lá nos confessámos todas três.
Levámos merenda
e ficámos para tarde, à espera do sermão. Esperámos algumas horas e recorda-me
que não saímos da igreja para brincar. Tomámos nosso lugar junto do altar do
Sagrado Coração de Jesus e eu pus os meus soquinhos dentro das grades do altar.
A pregação dessa tarde foi sobre o inferno. Escutei com muita atenção todas as
palavras de Sua Reverência, mas, a certa altura, ele convidou-nos a ir ao
inferno em espírito. Para mim mesma disse:
«Ao inferno é
que eu não vou! Quando todos se dirigirem para lá, eu vou-me embora!», e tratei
de pegar nos soquinhos. Como não vi ninguém sair, fiquei também, não largando
mais os soquinhos.
«Ao inferno é que eu não vou!», pois
claro.
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