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PONTOS DE REFLEXÃO
PRIMEIRA LEITURA Sb
11,22-12,2
A terceira
parte do Livro da Sabedoria (caps. 11-19), composto em grego em
Alexandria do Egipto no século I a. C, contém uma longa digressão sobre
a «mode-ração divina» para com os egípcios e os cananeus (cf.
Sb 11,15-12,27). Mal
começou a descrever as chagas infligidas aos inimigos de Israel, o autor
pergunta-se: «Porque é que Deus não os castiga imediata e
definitivamente, e prefere enviar-lhe apenas vespas?» Este texto é o
coração da resposta.
O autor do
Livro da Sabedoria desenvolve uma reflexão sobre a moderação divina: nos
versículos propostos pela liturgia trata do tema da omnipotência e da
miseri-córdia de Deus.
Antes de mais,
mostra a desproporção entre o mundo criado e o Deus criador: o universo
é comparado a um «grão de areia na balança» e a uma «gota de orvalho»
matutino (copiando a imagem de Is 40,15), para reafirmar a absoluta
omnipotência divina (11,22). Mas a esta junta-se a bondade que
caracteriza a actuação de Deus: precisamente porque é omnipotente, Ele
tem «compaixão» de todos! (11,23a) Esta misericórdia divina diz respeito
também às criaturas pecadoras e estende-se a todos os homens; não tem em
vista apenas adiar o castigo, mas quer chegar à conversão dos corações.
O amor
universal do Senhor está expresso em 11,24 pelo verbo grego agapao
(amar), caso único no Antigo Testamento, mas habitual no Novo: este
amor está fundado na vontade daquele que criou e mantém constantemente
vital o mundo inteiro (cf. 11,25), tornando-se inclusive dom de Deus aos
homens mediante o «Seu espírito» (12,1).
O optimismo
teológico do autor faz-lhe acrescentar que Deus «poupa» todas as coisas
porque, sendo Senhor delas, Ele «ama a vida»! (11,26) Por isso, a opção
de um castigo leve tem como finalidade primeira a consecução da fé em
Deus (12,26).
SEGUNDA LEITURA 2Ts 1,11-2,12
Tem início
neste domingo a proposta da Segunda Carta de Paulo aos cristãos de
Tessalónica: como na Primeira, também nesta Carta o Apóstolo põe de
sobreaviso a comunidade sobre os falsos ensinamentos acerca da vinda
gloriosa de Cristo. A justa expectativa do cumprimento definitivo da
História não deve confundir-se com fanta-sias e previsões arbitrárias
(2,1-2): o próprio «poder» de Deus completará a obra de «bem» por Ele
iniciada (1,11-12).
A atenção de
Paulo dirige-se à Igreja deTessalónica que sofre e crê: para ela pede o
auxílio divino, afim de que os «chamados» possam resistir na provação e
consigam levar a termo a caminhada da fé, há pouco iniciada (1,11-12).
Termina assim o primeiro capítulo da Carta, de tom introdutório.
Com o capítulo
2, o Apóstolo enfrenta o argumento principal: a parusia (o regresso
vitorioso no final dos tempos) de Cristo (2,1). Antes de apresentar o
seu pensamento, Paulo liberta o campo de ideias inoportunas e de erros
que se teriam; infiltrado na comunidade, provocando incertezas e
desvios. Pelo que podemos intuir, as propostas da sua Primeira Carta
não tinham sido recebidas com plena satisfação pelos Tessalo-nicenses,
os quais andariam ainda à procura de uma resposta mais precisa; parece
até que a situação se tornara mais confusa devido a alguns pregadores,
que se diziam conhecedores da hora final, julgada iminente. Os perigos
que Paulo indica são três: carismas presumidos, que devem ser submetidos
a um discernimento prudente; afirmações e documentos erroneamente
atribuídos ao Apóstolo (2,2), Tratam-se de enganos, e os cristãos devem
evitar, com sabedoria, todas as especulações ou prognós-ticos falsos.
EVANGELHO
Lc 19,1-10
Já no final da
viagem de Jesus para Jerusalém, Lucas narra o encontro do Senhor com um
pecador e.a mudança radical deste. O episódio de Zaqueu apresenta-se
como uma autêntica síntese da teologia de Lucas, na qual o evangelista
reúne, com ha-bilidade, os ensinamentos que mais lhe agradam: a
possibilidade actual de salvação; a conversão do rico e o uso sábio do
dinheiro; a alegria do encontro; o cumprimento do projecto divino.
Zaqueu é a
alegoria do grande pecador: mas Jesus veio «procurar» esse mesmo
ho-mem, precisamente porque estava «perdido» (v. 10). Parece que foi o
próprio Zaqueu a tomar a iniciativa, mas na verdade é o próprio Jesus
que deseja e organiza o encontro; porquanto o projecto benévolo de Deus
tem em vista a salvação do homem, Jesus «deve passar» por onde se
encontra o pecador Zaqueu (v. 4) e «deve ficar em sua casa» (v.
5). Era mesmo aí que o Mestre devia ir, porque aquele homem doente
precisava do médico e o médico viera para curá-lo.
Lucas insiste
de bom grado na actualidade da salvação. Utilizando duas vezes o
advérbio de tempo «hoje» (w. 5,9), pretende dizer que não se trata de um
facto passado, acontecido outrora e longe do horizonte dos ouvintes: a
salvação oferecida por Jesus é, pelo contrário, um acontecimento
contemporâneo para quem lê ou escu-ta o Evangelho. Além disso, a
insistência de Lucas ao referir-se à «alegria» (v. 6), no contexto da
conversão, parece querer dizer precisamente isto: quem se converte ao
Senhor com todo o coração descobre finalmente uma alegria profunda, e
também Deus fica feliz, porque o encontro se tornou possível.
A salvação
consiste na mudança de mentalidade do pecador: aquele que até esse
momento tinha vivido somente para acumular, agora está pronto a dar;
tendo encontrado a misericórdia, Zaqueu torna-se misericordioso e começa
a usar bem os seus tesouros (v. 8). Repara na Humanidade que sofre e vai
ao encontro dos pobres.
Padre José Granja
Reitor da Basílica dos Congregados, Braga. |