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PONTOS DE REFLEXÃO
1ª- Leitura. 1Sm
3,3b-10.19.
Samuel, o filho que
Deus concedeu a Ana, mulher estéril, acolhendo a sua oração confiante, tinha
sido oferecido pela mãe ao serviço do templo. Ainda muito jovem, Samuel é
chamado por Deus para ser o profeta e juiz do seu povo. A cena desenrola-se no
santuário, de noite: o jovem é despertado por JHWH que o interroga três vezes, e
que Samuel confunde com o sacerdote Heli. O jovem ainda não conhecia a voz
divina: será o seu mestre a guiá-lo na compreensão e a indicar-lhe o caminho a
seguir.
Estamos perante uma
narração de vocação profética muito bem elaborada: como sempre, neste tipo de
composição é o Senhor a tomar a iniciativa e a bater insistentemente ao coração
do homem. Escolhe surpreendentemente quem é fraco, pequeno e, muitas vezes,
aparentemente inadequado para a missão que deverá cumprir. No texto de hoje, o
Senhor escolhe um jovem, ainda sem experiência.
A voz de JHWH aparece
de surpresa e não é logo identificada, nem por Samuel nem pelo sacerdote Heli. É
digna de admiração a docilidade pronta e generosa do escolhido em responder, mas
também a humilde e sábia instrução do sacerdote, quando finalmente se apercebe
do que está acontecer. Embora ás escuras, Heli ensina o seu discípulo a escutar
a voz de Deus: até agora Samuel obedeceu às ordens de Heli e escutou a sua voz;
daqui em diante escutará a voz do Senhor, para cumprir e transmitir as Suas
palavras.
2ª- Leitura. ICor
6,13c-15a.17-20
A Igreja de Corinto,
fundada pelo Apóstolo Paulo no ano de 51. d.C., é numericamente florescente,
social e culturalmente variada, e os seus membros são na sua maioria de origem
pagã-helenista. Bem depressa se manifestaram divisões no interior da comunidade,
devidas ao ensinamento de mestres que modelam a mensagem cristã segundo as suas
convicções filosóficas. Um dos problemas sobre o qual Paulo deve intervir é o
conceito de corporeidade e consequentemente da sexualidade.
A antropologia semita
é muito diferente da helenista. Para os gregos, o corpo é tudo como o invólucro
e a prisão em que está encerrado o espírito, a verdadeira essência do homem.
Para a Bíblia hebraica, pelo contrário, o homem é uma unidade de interioridade e
exterioridade que, embora complexa, é tão forte que se pode dizer que o homem
não “tem”, mas “é” um corpo. É o corpo que fornece historicidade e relações,
que constrói no tempo e no espaço comunicação e comunhão com os outros e com
Deus. Por isso Paulo pode afirmar que o “Senhor é para o corpo”, ou seja, que o
Senhor se une à pessoa na sua totalidade, às suas relações, aos seus afectos,
aos sonhos e às emoções.
A partir destas
premissas, é muito diversa também a avaliação da sexualidade em comparação com a
mentalidade do mundo grego. Se para os gregos o exercício da sexualidade é
indiferente no que diz respeito à vida espiritual, para Paulo, na sexualidade,
comercializada e sem amor, o discípulo de Cristo renega a sua própria pertença
ao Senhor e profana o seu corpo, santuário em que pode celebrar o culto da sua
vida oferecida a Deus.
Evangelho. Jo
1,35-42
A vocação dos
primeiros discípulos, segundo o quarto Evangelho, aconteceu nas margens do
Jordão. O encontro é propiciado por João Baptista, o qual encaminha para Jesus
dois dos seus discípulos, proclamando a identidade de Jesus: Este é o “Cordeiro
de Deus”, cujo sacrifício realizará a redenção do mundo.. A iniciativa do
chamamento pertence, todavia, ainda ao Senhor, que se volta para os dois e os
interpela sobre a sua procura, convidando-os a irem com Ele, a ficarem com Ele.
É um acontecimento que muda radicalmente as suas vidas e que merece ser
recordado, inclusive a hora em que o encontro se deu: “Era por volta das quatro
horas da tarde.”
A missão de João
Baptista na narração de João é a de fazer de ligação entre o Antigo e o Novo
Testamento: ele não só prepara o caminho do Messias, como também o revela
presente com um testemunho completamente recheado de referências bíblicas,
levando até Ele os primeiros discípulos. A vocação de André e do outro discípulo
acontece, com efeito, através da mediação profética de João Baptista que faz que
“os dois” passem do seu caminho para o caminho de Jesus.
O verbo “seguir”
exprime já o desejo de frequentar a escola do Mestre. A pergunta de Jesus, “Que
procurais?”, provoca depois os dois amigos a explicitarem a sua intenção e a
amadurecerem uma decisão radical. Também o verbo “morar” é uma palavra chave do
vocabulário joanino: serve para indicar uma comunhão de ordem espiritual, uma
intimidade profunda e duradoura, que a partir desse momento se estabelece entre
Jesus e os Seus discípulos.
Numa sucessão de
testemunhos alarga-se o círculo daqueles que são chamados: quem encontrou o
Senhor torna-se intermediário de um novo encontro.
Pe
José Granja |