PONTOS DE
REFLEXÃO
PRIMEIRA LEITURA
Pt8,2-3.14b-16a
No segundo
discurso dirigido a Israel, antes de entrar na Terra Prometida, Moisés
relembra os quarenta anos de peregrinação no deserto. Nesse longo tempo,
Deus provocou o seu Povo (v. 2) e alimentou-o com o maná (v. 3). Israel deve
por isso reavivar a lembrança de tudo o que o Senhor fez: libertou-o;
guiou-o; protegeu-o (w. 14-15).
A longa caminhada
iniciada com a libertação do Egipto prosseguiu num «deserto imenso e
temível» (v. 15a), onde Israel correu o risco de morrer se Deus não tivesse
vindo salvá-lo. O Senhor deu-lhe «água» que brotou «da rocha dura» (v 15b) e
«lhe deu a comer o maná que seus pais não tinham conhecido». (w. 3,16)
Através da caminhada no deserto, Deus educou o seu Povo: «pô-lo à prova para
conhecer o íntimo do seu coração» (cf. v. 2) e deu-lhe um alimento
desconhecido, para lhe dar a conhecer que a sua vida depende da relação
vital com Ele (v. 3).
O sofrimento pela
escassez de alimentos necessários à vida, a «humilhação» concretamente
sofrida no corpo revelaram-se uma sapiente acção pedagógica do Senhor,
através da qual Israel reconheceu em
jhwh a verdadeira origem de todos os bens materiais, e na sua Palavra
o verdadeiro alimento que nutre de sentido a vida.
Recordar ou
celebrar a acção livre e gratuita de Deus é a condição para reviver a
relação de fé que está na base da Aliança.
SEGUNDA LEITURA
ICor
10,16-17
Aos Coríntios, que
corriam o risco de se dividirem por causa da participação nos banquetes sagrados
da cidade, recorda Paulo a experiência da Eucaristia. A partilha do único
«cálice de bênção» e do único «pão partido» é comunhão com o Sangue e com o
Corpo de Cristo (v. 16). Num breve comentário, Paulo dá a entender que a
Eucaristia é também a raiz da comunhão entre participantes, os quais formam «um
só corpo», (v. 17)
O termo koinonía,
«comunhão», faz parte da linguagem tradicional para indicar a experiência
eucarística na sua dimensão mais pessoal. O Apóstolo utiliza-o para indicar quer
a comunhão com Cristo morto e ressuscitado, quer a comunhão entre aqueles que
participam do único pão.
Com a bênção e a
partilha do cálice com vinho entra-se em relação profunda e vital com Jesus
Crucificado, e com o pão partido e partilhado entra-se em comunhão com o corpo
de Jesus Ressuscitado (v. 16).
Todos os que tomam
parte no banquete formam o «único
corpo» que é a Igreja (v. 17). Paulo identifica a comunidade dos crentes com o
Corpo de Cristo a partir do significado e do valor unificador da Eucaristia.
EVANGELHO
Jo 6,51-58
Jesus é a Palavra que
se tornou carne, «o pão descido do Céu» que dá vida ao mundo (v. 51). A oferta
que Ele faz de Si mesmo na morte prolonga-se na Eucaristia. Aos judeus que
murmuram, Jesus reafirma que para ter a vida eterna se deve «comer a Carne do
Filho do homem» e «beber o seu Sangue», (vv. 52-53) A carne que se deve comer
identifica-se com Jesus (w. 54-56), o enviado do Pai (v. 57). Ele é o
verdadeiro maná descido do céu que dá vida (v. 58).
Jesus identifica-Se
com o «pão descido do Céu» (v. 51); Ele é a Palavra de Deus que responde à
necessidade profunda de viver que habita em cada ser humano. O pão descido do
Céu é de facto a «carne» (v. 51b), o Filho de Deus que na Sua humanidade
concreta, frágil e indefesa Se entrega à morte por amor.
Ao ouvir estas
palavras os judeus escandalizam-se (cf. v. 52), porque a Lei proibia comer carne
juntamente com o sangue. Mas Jesus reafirma que a Sua entrega se torna fonte de
«vida» para o mundo (w 53,54). Por isso «quem come a sua carne» e «bebe o seu
sangue» entra em comunhão com este gesto de amor, que tem a sua fonte no Pai (w.
56-57).
Uma mesma corrente de
vida parte de Deus, o Pai e, através de Jesus, o Filho, derrama-se no crente que
entra, mediante a fé e a experiência eucarística, em comunhão com Ele. Mediante
a comunhão com Jesus, o crente que come a Sua carne e bebe o Seu sangue entra em
comunhão com o Pai, fonte última da vida.
O Deuteronómio
(primeira leitura), livro que medita sobre
a caminhada de Israel libertado do Egipto,
recorda que o Senhor guiou o seu
Povo através do deserto e o alimentou com o
maná. A falta de alimentos tinha provocado
entre os israelitas insegurança e medo de morrer: a dádiva do maná,
alimento que não depende do cultivo dos campos, nem de trocas comerciais,
fez-lhes compreender que a vida depende da acção criadora de Deus (cf.
Dt 8,3.16).
O ser humano, ameaçado
continuamente pela morte, pode viver somente
na relação com o Senhor. A sua Palavra, a da
Criação e a da Revelação, garante a vida a cada ser humano
(salmo responsorial).
Jesus, no diálogo de Cafarnaum
(Evangelho), apresenta-Se
como «o pão vivo descido do Céu».
Os antepassados que comeram
o maná no deserto morreram, mas «quem comer deste
pão - diz Jesus - viverá eternamente». (Jo 6,58) O pão vivo
que dá a vida eterna coincide com
a dádiva da «sua carne para a vida do mundo». (Jo 6,51) A
condição para ter esta vida plena é comer a
Sua carne e beber o Seu sangue. Dessa mesma experiência fala Paulo na
Primeira Carta aos Coríntios (segunda leitura), embora com uma linguagem
mais próxima à tradição da «Ceia do Senhor». O Apóstolo coloca a ênfase na
«comunhão» com o corpo e o sangue de Cristo. Esta comunhão está na base da
unidade profunda e vital, que se realiza
entre os muitos e diversos participantes do único pão que é Cristo.
Neste horizonte de
caminhada no deserto da vida é que se coloca
a nossa oração hoje. Ao «Deus fiel, que alimenta o seu Povo com amor de
Pai» pedimos que reanime no coração dos
fiéis o desejo d'Ele, «fonte inesgotável de todos os bens». Os que
participam na assembleia litúrgica sabem que podem contar com a oferta
permanente da Eucaristia. Por isso se pede a
Deus que nós fiéis possamos «venerar de tal modo os mistérios do seu
Corpo e Sangue que sintamos continuamente os
frutos da sua Redenção» (Colecta) e assim sermos convidados para a
mesa do Reino.
Padre José Granja
Reitor da Basílica dos Congregados, Braga. |