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SAGRADA FAMÍLIA
DE JESUS, MARIA E JOSÉ
PRIMEIRA LEITURA
Eclo 3,2-6.12-14
[3.3-7.14-17]
A
primeira impressão que se tem quando se lê este passo de Ben Sirá é
que nos encontramos perante um discurso, ao mesmo tempo, de simples
humanidade e de fé (Deus é nomeado diversas vezes). Os conselhos
expostos não dizem respeito exclu-sivamente aos crentes, mas a todos
os homens de boa vontade. O texto quer ser uma explicação e um
comentário do quarto mandamento: «Honra o teu pai e a tua mãe: deste
modo prolongarás a tua vida na terra que o Senhor teu Deus te dá.»
(Ex 20,12)
Esta
página bíblica não se dirige às crianças ou aos adolescentes para
que honrem os seus pais, mas aos filhos adultos para que se ocupem
dos seus pais anciãos.
É
necessário precisar o significado exacto do verbo «honrar», repetido
algumas vezes (w. 2.3.4.5.6). Não equivale a um simples obedecer,
mas abraça uma gama de atitudes mais amplas
e flexíveis. A obediência é sem dúvida um dever, mas não é
o único, e em certos casos nem é
o principal. «Honrar» significa
obedecer, respeitar, ajudar, dar afecto, espaço e importância.
Dar importância, por exemplo, à expe-riência dos pais
anciãos; compreender que os pais (mesmo se anciãos e doentes) têm
uma função própria, porque são portadores de um património de vida e
de uma sabedoria que não deve perder-se de modo nenhum.
O passo
de Ben Sirá - e isto fica claro se lido por inteiro - é todo guiado
por uma cons-tante correlação entre a honra para com Deus e a honra
para com os pais: respeitar o pai e a mãe é temer o Senhor;
abandonar o pai é como blasfemar contra Deus.
SEGUNDA LEITURA
Cl
3,12-21
Na
segunda e na terceira geração cristã sentia-se a exigência de dar
resposta a muitas perguntas surgidas da vida quotidiana, por
exemplo, a respeito da organização fami-liar: como viver entre
marido e mulher, entre pais e filhos, entre patrões e servos? É por
isso que encontramos, espalhados pelo epistolário do Novo
Testamento, alguns «códigos familiares», um dos quais é apresentado
na leitura de hoje.
Depois
de um longa introdução, cujo tema principal é a caridade
(«suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos, revesti-vos de caridade,
vivei em paz»), na parte final do texto Paulo recomenda às esposas
que «sejam submissas aos maridos como
convém no Senhor», e aos maridos
que «amem as suas esposas e não as tratem com aspe-reza», e
depois, aos filhos, que «obedeçam
em tudo a seus pais», e aos pais que «não exasperem os seus
filhos», (v. 20b)
Os
valores fundamentais sublinhados são portanto a ordem, a submissão e
a obe-diência, o amor, a educação dos filhos. Nota-se o esforço de
conciliar duas realidades dificilmente conciliáveis. De um lado, a
ordem, ou seja, a exigência de unir solida-mente as relações
familiares: a família deve ser ordenada e compacta, com uma or-dem
hierárquica precisa, daqui a
insistência sobre a submissão e sobre a obediência. Do outro,
o amor recíproco, que é por sua natureza uma relação que ultrapassa
toda a organização hierárquica.
EVANGELHO
Mt 2,13-15.19-23
A narração de Mateus
é certamente cristológica. A intenção do
evangelista é mostrar, nos acontecimentos da infância, o destino de
Jesus; ainda criança, é rejeitado e perseguido pelos que estão perto
(Herodes), e procurado pelos que estão longe (os Magos), amado por
Deus e odiado pelos homens. Tudo isto é narrado envolvendo de perto
a família de Jesus, José e Maria.
O texto
evangélico recorda que a Família de Nazaré está plenamente inserida
na tragédia humana. José, Maria e Jesus vivem a condição de
refugiados. Também deste ponto de vista a Família de Nazaré é uma
família absolutamente normal. O Filho de Deus partilha o destino dos
homens, não vive um destino diferente.
Certamente trata-se de uma Família amada por Deus, objecto atento e
predilecto da sua Providência («Levanta-te, toma o Menino e sua
Mãe»; v. 13a), mas não é sub-traída ao destino dos homens («Herodes
vai procurar o Menino para O matar»; v. 13b). O amor de Deus salva
os homens, mas não os subtrai à história do homem, e nem sequer à
história da violência. Deus acompanha-os e ajuda-os nas
dificuldades. Assim fez com Jesus, não O subtraiu à morte, mas
acompanhou-0 na morte.
Padre
José Granja,
Reitor da Basílica dos Congregados, Braga. |