Desde
os tempos Patriarcais, Deus persiste em chamar o Seu povo à
santidade: “Eu sou o Senhor que vos tirou do Egipto para ser o vosso
Deus. Sereis santos porque Eu sou Santo” (Lv 1,44-45).
O
desígnio de Deus é claro: uma vez que fomos criados à sua “imagem e
semelhança” (Gen 1,26), e Ele é Santo, nós devemos ser santos
também. O Senhor não deixa por menos.
A
medida e a essência dessa santidade é o próprio Deus.

São
Pedro repete esta ordem dada ao povo no deserto, em sua primeira
carta, convocando os cristãos a imitarem a santidade de Deus:
“A
exemplo da santidade daquele que vos chamou, sede também vós santos,
em todas as vossas acções, pois está escrito: Sede santos, porque eu
sou santo” (1Pe 1,15-16).
S.
Pedro exige dos fieis que “todas as vossas acções” espelhem esta
santidade de Deus, já que “vós sois, uma raça escolhida, um
sacerdócio régio, uma nação santa, um povo adquirido para Deus, a
fim de que publiqueis o poder daquele que das trevas vos chamou à
sua luz maravilhosa” (1Pe 2,9).
Para
São Pedro a vida de santidade era uma imediata consequência de um
povo que ele chamava de “quais outras pedras vivas… materiais deste
edifício espiritual, um sacerdócio santo” (1Pe 2,5).
Neste
sentido exortava os cristãos do seu tempo a romper com a vida
carnal: “luxúrias, concupiscências, embriaguez, orgias, bebedeiras e
criminosas idolatrias” (1Pe 4,3), vivendo na caridade, já que esta
“cobre a multidão dos pecados” (1Pe 4,8).
Jesus,
no Sermão da Montanha chama os discípulos à perfeição do Pai: “Sede
perfeitos assim como o vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48).
Essas
palavras fazem eco ao que Deus já tinha ordenado ao povo no deserto:
“Sede santos, porque eu sou santo” (Lv 11,44).
Jesus
falava da bondade do Pai, que ama não só os bons, mas também os
maus, e que “faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os
bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos” (Mt 5,45).
Jesus
pergunta aos discípulos: “Se amais somente os que vos amam, que
recompensa tereis?” (Mt 5,46). Para o Senhor, ser perfeito como o
Pai celeste, é amar também os inimigos, os que não nos amam. “Amai
os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos
perseguem e vos maltratam”(Mt 5,44). E mais ainda: “Não resistais ao
mau. Se alguém te ferir a face direita, oferece-lhe também a outra”
(Mt 5,39).
Sem
dúvida não é fácil viver essa grande exigência que Jesus nos faz,
mas é por isso mesmo que ao cumpri-las vamos nos tornando santos,
perfeitos, como o Pai celeste.
Todo o
Sermão da Montanha, que São Mateus relata nos capítulos 5,6 e 7,
apresenta-nos o verdadeiro código da santidade. É como dizem os
teólogos, a “Constituição do Reino de Deus”.
Santo
Agostinho nos assegura que:
“Aquele
que quiser meditar com piedade e perspicácia o Sermão que nosso
Senhor pronunciou no Monte, tal como o lemos no Evangelho de São
Mateus, aí encontrará, sem sombra de dúvida, a carta magna da vida
cristã” (CIC, Nº 1966).
É por
isso que na festa de todos os Santos a Igreja nos faz meditar no
Evangelho das Bem-aventuranças, que são o início, e como que o
resumo, de todo o Sermão do Monte.
São
Paulo começa quase todas as suas Cartas lembrando os cristãos do seu
tempo de que são chamados à santidade. Aos romanos, logo no início,
ele se dirige dizendo:
“A
todos os que estão em Roma, queridos de Deus, chamados a serem
santos…” (Rom 1,7).
Aos
coríntios ele repete: “à Igreja de Deus que está em Corinto, aos
fiéis santificados em Cristo Jesus chamados à santidade com todos…”
(1Cor 1,2).
Aos
efésios ele lembra, logo no início, que o Pai nos escolheu em Cristo
“antes da criação do mundo para sermos santos e irrepreensíveis
diante de seus olhos” (Ef 1,5).
Aos
filipenses ele pede que : “o discernimento das coisas úteis vos
torne puros e irrepreensíveis para o dia de Cristo” (Fil 1,10).
“Fazei
todas as coisas sem hesitações e murmurações a fim de serdes
irrepreensíveis e sinceros, filhos de Deus íntegros no meio de uma
geração má e perversa” (Fil 2,14).
Para
o Apóstolo a santidade é a grande vocação do cristão. Ele diz aos
efésios:
“Exorto-vos pois (…) que leveis uma vida digna da vocação a qual
fostes chamados, com toda humildade, mansidão e paciência” (Ef 4,1).
De
maneira mais clara ainda ele fala aos tessalonicenses sobre o que
Deus quer de nós:
“Esta é
a vontade de Deus: a vossa santificação; que eviteis a impureza; que
cada um de vós saiba possuir o seu corpo em santificação e
honestidade, sem se deixar levar pelas paixões desregradas como
fazem os pagãos que não conhecem a Deus” (1 Tess 4,3-5).
Aos
cristãos de Corinto, Paulo volta a insistir na sua segunda Carta:
“Purifiquemo-nos de toda a imundice da carne e do espírito
realizando a obra de nossa santificação no temor de Deus” (2 Cor
7,1).
E
também a carta aos Hebreus, nos manda procurar a santidade:
“Procurai a paz com todos e ao mesmo tempo a santidade, sem a qual
ninguém pode ver o Senhor” (Heb 12,14).
Santa
Teresa de Ávila afirma que: “O demónio faz tudo para nos parecer um
orgulho o querer imitar os santos”.
A
santidade é o meio de voltarmos a ser “imagem e semelhança” de Deus,
conforme saímos de suas mãos.
São
Paulo ensina na carta aos romanos que Deus nos quer como autênticas
imagens de Jesus:
“Os que
ele distinguiu de antemão, também os predestinou para serem
conformes à imagem de seu Filho, a fim de que este seja o
primogénito entre uma multidão de irmãos” (Rom 8,29).
A
santificação, portanto, consiste em cada cristão se transformar numa
cópia viva de Jesus, “um outro Cristo” como diziam os santos Padres.
Quando
a imagem de Jesus estiver formada em nossa alma, então teremos
chegado à meta que Deus nos propõe. É aquele estado de vida que
levou, por exemplo, São Paulo a exclamar: “Eu vivo, mas já não sou
mais eu, é Cristo que vive em mim. A minha vida presente, na carne,
eu a vivo na fé no Filho de Deus” (Gal 2,20).
Jesus
sofreu a sua Paixão e Morte para que recuperássemos diante do Pai a
santidade. É o que o Apóstolo nos ensina: “Eis que agora Ele vos
reconciliou pela morte de seu corpo humano, para que vos possais
apresentar santos, imaculados, irrepreensíveis aos olhos do Pai”
(Col 1,22).
Fomos
criados por Deus e para Deus, e a Ele pertencemos; por isso, somos
chamados à santidade.
Essa
pertença a Deus é que nos obriga acima de tudo a buscarmos como meta
da nossa vida a santidade, que é a marca de Deus, três vezes Santo.
O Papa
João Paulo II, que era um pregador incansável da santidade, disse
certa vez:
“Não
tenhais medo da santidade, porque nela consiste a plena realização
de toda a autêntica aspiração do coração humano” (LR,N.17, 7/4/96).
“Entre as maravilhas que Deus realiza continuamente, reveste
singular importância a obra maravilhosa da santidade, porque ela se
refere directamente à pessoa humana”.
E o
Papa resume tudo dizendo que:
“A
santidade é a plenitude da vida” (LR, N.20, 18/5/96).
Com a
mesma ênfase, São Paulo afirma para os coríntios que não nos
pertencemos, porque fomos comprados por um alto preço que é o sangue
de Cristo (cf. 1 Cor 6,19). Aos romanos o Apóstolo diz: “Nenhum de
vós vive para si, e ninguém morre para si. Se vivemos, vivemos para
o Senhor; se morremos, morremos para o Senhor. Quer vivamos, quer
morramos, pertencemos ao Senhor (Rom 14,7).
Rui
Manuel Tapadinhas Alves,
25 de Janeiro de 2014 |