Alexandrina de Balasar

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QUINTO DOMINGO DA QUARESMA
— B —

Leitura do Livro de Jeremias      Jer 31, 31-34

Dias virão, diz o Senhor, em que estabelecerei com a casa de Israel e com a casa de Judá uma aliança nova.

Não será como a aliança que firmei com os seus pais, no dia em que os tomei pela mão para os tirar da terra do Egipto, aliança que eles violaram, embora Eu exercesse o meu domínio sobre eles, diz o Senhor.

Esta é a aliança que estabelecerei com a casa de Israel, naqueles dias, diz o Senhor: Hei-de imprimir a minha lei no íntimo da sua alma e gravá-la-ei no seu coração. Eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo. Não terão já de se instruir uns aos outros, nem de dizer cada um a seu irmão: «Aprendei a conhecer o Senhor».

Todos eles Me conhecerão, desde o maior ao mais pequeno, diz o Senhor. Porque vou perdoar os seus pecados e não mais recordarei as suas faltas.

 

Salmo 50 (51), 3-4.12-13.14-15 (R. 12a)

Compadecei-Vos de mim, ó Deus, pela vossa bondade,
pela vossa grande misericórdia, apagai os meus pecados.
Lavai-me de toda a iniquidade
e purificai-me de todas as faltas.

Criai em mim, ó Deus, um coração puro
e fazei nascer dentro de mim um espírito firme.
Não queirais repelir-me da vossa presença
e não retireis de mim o vosso espírito de santidade.

Dai-me de novo a alegria da vossa salvação
e sustentai-me com espírito generoso.
Ensinarei aos pecadores os vossos caminhos
e os transviados hão-de voltar para Vós.

 

Leitura da Epístola aos Hebreus          Hebr 5, 7-9

Nos dias da sua vida mortal, Cristo dirigiu preces e súplicas, com grandes clamores e lágrimas, Àquele que O podia livrar da morte e foi atendido por causa da sua piedade.

Apesar de ser Filho, aprendeu a obediência no sofrimento e, tendo atingido a sua plenitude, tornou-Se para todos os que Lhe obedecem causa de salvação eterna.

 

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo
segundo São João         Jo 12, 20-33

Naquele tempo, alguns gregos que tinham vindo a Jerusalém para adorar nos dias da festa, foram ter com Filipe, de Betsaida da Galileia, e fizeram-lhe este pedido: «Senhor, nós queríamos ver Jesus».

Filipe foi dizê-lo a André; e então André e Filipe foram dizê-lo a Jesus.

Jesus respondeu-lhes: «Chegou a hora em que o Filho do homem vai ser glorificado. Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica só; mas se morrer, dará muito fruto. Quem ama a sua vida, perdê-la-á, e quem despreza a sua vida neste mundo conservá-la-á para a vida eterna.

Se alguém Me quiser servir, que Me siga, e onde Eu estiver, ali estará também o meu servo. E se alguém Me servir, meu Pai o honrará.

Agora a minha alma está perturbada. E que hei-de dizer? Pai, salva-Me desta hora? Mas por causa disto é que Eu cheguei a esta hora. Pai, glorifica o teu nome».

Veio então do Céu uma voz que dizia: «Já O glorifiquei e tornarei a glorificá-l’O».

A multidão que estava presente e ouvira dizia ter sido um trovão. Outros afirmavam: «Foi um Anjo que Lhe falou».

Disse Jesus: «Não foi por minha causa que esta voz se fez ouvir; foi por vossa causa. Chegou a hora em que este mundo vai ser julgado. Chegou a hora em que vai ser expulso o príncipe deste mundo. E quando Eu for elevado da terra, atrairei todos a Mim».

Falava deste modo, para indicar de que morte ia morrer.

 

PONTOS DE REFLEXÃO

LEITURA I – Jer 31,31-34

A primeira leitura do 5º Domingo da Quaresma dá-nos conta da eterna preocupação de Deus com a realização plena do homem. Nessa linha, Jahwéh propõe-se intervir no sentido de mudar o coração do homem, tornando-o apto para fazer as escolhas mais correctas. Só com um coração transformado, o homem será capaz de acolher as propostas de Deus e de conduzir a sua vida de acordo com esses valores que lhe asseguram a harmonia, a paz, a verdadeira felicidade. Ao homem pede-se, naturalmente, que acolha o dom de Deus, que se deixe transformar por Deus, que aceite o desafio de Deus para integrar a comunidade da nova Aliança. Integrar a comunidade da nova Aliança implica, no entanto, renunciar a caminhos de fechamento, de auto-suficiência, de recusa, de indiferença face aos desafios e às propostas de Deus. Estamos dispostos, neste tempo de Quaresma, a acolher o dom de Deus e a deixar-nos transformar por Ele?

 Fazer parte da comunidade da nova Aliança não tem a ver com o cumprimento de ritos ou de obrigações externas; mas tem a ver com a adesão incondicional do coração às propostas de Deus. O que nos faz membros efectivos da comunidade da nova Aliança não é o ter o nome inscrito no livro de registos de baptismos da nossa paróquia, ou o ter celebrado o casamento na igreja, ou o ir à missa ao domingo… Mas é o estar atento aos projectos de Deus, interiorizar as propostas de Deus, conduzir a vida de acordo com os valores de Deus, testemunhar a vida de Deus nos gestos simples do dia-a-dia, viver em comunhão com Deus.

 O projecto de uma nova Aliança entre Deus e o seu Povo concretiza-se em Jesus: Ele veio ao mundo para renovar os corações dos homens, oferecendo-lhes a vida de Deus. As outras duas leituras que nos são propostas neste 5º Domingo da Quaresma vão dizer-nos como é que Jesus concretizou este projecto.

LEITURA II – Heb 5,7-9

Antes de mais, o nosso texto recorda-nos a solidariedade de Jesus com os homens. Ele veio ao nosso encontro, assumiu a nossa humanidade, conheceu as nossas fragilidades, partilhou as nossas dores, medos e incertezas. Ele compreendeu os homens e as suas fraquezas, sem nunca os acusar nem condenar, sem se demitir da sua condição de irmão dos homens. Desta forma, tornou-Se capaz de Se compadecer da nossa miséria e de nos trazer a ajuda necessária para que pudéssemos superar a nossa situação de debilidade. A Palavra de Deus que hoje nos é proposta garante-nos a solidariedade de Cristo em todos os instantes da nossa existência. Não estamos sozinhos, frente a frente com a nossa fragilidade e debilidade; Cristo entende-nos, caminha à nossa frente, pega-nos ao colo quando não conseguimos caminhar. Sobretudo Cristo, o irmão que veio ao nosso encontro e que caminha connosco, aponta-nos o caminho para essa vida plena e definitiva que Deus nos quer oferecer.

 Toda a vida de Cristo cumpriu-se num intenso diálogo e numa total comunhão com o Pai. Através desse diálogo, Ele pôde discernir a vontade do Pai e conhecer os seus projectos. Pela oração, Ele encontrou forças para obedecer, para dizer “sim” e para concretizar os planos do Pai, mesmo nos momentos mais dramáticos da sua existência terrena. O caminho da doação total ao Pai não é um caminho impossível para os homens (Jesus, tornado homem como nós, demonstrou-o); mas é um caminho que os homens podem percorrer, apesar das suas fragilidades. É esse caminho que Jesus, o homem como nós, nos aponta. Temos espaço, na nossa vida, para dialogar com o Pai, para perceber os seus projectos para nós e para o mundo, para escutar os desafios que Deus nos faz? A nossa vida cumpre-se na indiferença para com Deus e para com os seus projectos, ou numa procura sincera e empenhada da vontade de Deus?

EVANGELHO – Jo 12,20-33

A primeira leitura mostrava-nos a preocupação de Deus no sentido de propor aos homens uma nova Aliança, capaz de gerar um Homem Novo. Como é que chegamos a essa realidade do Homem Novo, de coração transformado (isto é, com um coração que pensa, que decide e que age segundo os esquemas e a lógica de Deus)? O Evangelho responde: é olhando para Jesus, aprendendo com Ele, seguindo-O no caminho do amor, acolhendo essa vida que Ele nos propõe. Jesus tem de ser o modelo, a referência, o exemplo de quem quer aceitar o desafio de Deus e viver na comunidade da nova Aliança. Na verdade, o que é que Jesus representa, para nós? Uma pequena nota no rodapé da história humana? Um idealista com boas intenções que fracassou no seu sonho de um mundo melhor? Um pensador original, mas cujas ideias e perspectivas parecem desfasadas face às novas realidades do mundo? Ou é o Deus que veio ao encontro dos homens com um projecto de vida nova, capaz de dar um novo sentido à nossa vida e de nos encaminhar para a vida plena, para a felicidade sem fim?

 O caminho que Jesus aponta aos homens é o caminho do amor radical, do dom da vida, da entrega total a Deus e aos irmãos. Este caminho pode parecer, por vezes, um caminho de fracasso, de cruz; pode ser um caminho que nos coloca à margem desses valores que o mundo admira e consagra; pode parecer um caminho de perdedores e de fracos, reservado a quem não tem a coragem de se impor, de vencer a todo o custo, de conquistar o mundo… No entanto, Jesus garante-nos: a vida plena e definitiva nasce do dom de si mesmo, do serviço simples e humilde prestado aos irmãos (sobretudo aos pequenos e aos pobres), da disponibilidade para nos esquecermos de nós próprios e para irmos ao encontro das necessidades dos outros, da capacidade para nos solidarizarmos com os irmãos que sofrem, da coragem com que enfrentamos tudo aquilo que gera sofrimento e morte. Estamos dispostos a seguir a proposta de Jesus?

 Jesus rejeita absolutamente o caminho da auto-suficiência, do fechamento em si próprio, do egoísmo estéril, dos valores efémeros. Na lógica de Deus, trata-se de um caminho de perdedores, que produz vidas vazias e sem sentido, sofrimento e frustração, medo e desilusão. Quem vive exclusivamente para si próprio, quem se preocupa apenas em defender os seus interesses e perspectivas, quem se apega excessivamente a uma realização pessoal cumprida em circuitos fechados, “compra” uma existência infecunda e que não vale a pena ser vivida. Perde a oportunidade de chegar ao Homem Novo, à realização plena, à vida verdadeira, à salvação. Talvez nesta Quaresma Jesus nos peça que dispamos o nosso egoísmo e que nos convertamos ao amor…

 É através da comunidade dos discípulos que os homens “vêem Jesus”, descobrem o seu projecto, encontram esse caminho de amor e de doação que conduz à vida nova do Homem Novo, à salvação. Isto recorda-nos a nossa responsabilidade de testemunhas de Jesus e da sua salvação no meio dos homens do nosso tempo… Aqueles irmãos que se cruzam connosco nos caminhos da vida descobrem no nosso testemunho o rosto de Jesus? Todos aqueles que vêm ao encontro de Jesus à procura da vida plena encontram na forma como nos doamos, como servimos e como amamos a proposta libertadora que, através de nós, Jesus quer passar a todos os homens?

Padre José Granja,
Reitor da Basílica dos Congregados - Braga

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