1. Conhecendo a nossa cultura
No ano de 2000 o
povo brasileiro celebrou um grande acontecimento histórico: os seus primeiros
500 anos de existência. Este fato marcou a
entrada
do Brasil no novo milênio e levou muitos a fazerem a seguinte pergunta: hoje,
passados estes cinco séculos, qual é a nossa identidade cultural? Quais são as
nossas raízes? O que é "ser brasileiro"? Que coisa me faz "ser brasileiro" ?
Quantas vezes não escutamos falar que o Brasil é o "País do Futebol"; o "País do
samba e da alegria"; "O País do Carnaval"; ou que o brasileiro é o "rei do
jeitinho", ou até mesmo que "Deus é brasileiro"?
Isso é o que a
gente mais ou menos escuta falar por aí, não é mesmo? Mas, por de trás destas
frases tão populares, esconde-se um problema fundamental para nós brasileiros:
conhecer, valorizar e transmitir a nossa mais autêntica identidade cultural. E
como podemos fazer isso? O primeiro passo é, justamente, conhecê-la.
De uma maneira bem
generalizada, poderíamos dizer que somos brasileiros porque compartimos uma
mesma geografia eu por que nascemos em uma mesma "nação" que é reconhecida
internacionalmente com o nome de "Brasil" e que possui o seu espaço político e
econômico próprio; uma autonomia própria.
Ao mesmo tempo,
aprofundando um pouco mais no assunto, percebemos que nem tudo é pura
uniformidade, mas que convivemos também com uma enorme diversidade. São muitos
os que afirmam que o Brasil é um "País de contrastes". E não deixam de ter,
desde um certo ponto de vista, razão. Um nordestino é diferente de um cidadão do
sudeste, ou do sul; um baiano é diferente de um mineiro; um curitibano é
diferente de um paraense e um capixaba é diferente de um potiguar. Isso sem
falar nas diferenças étnicas, como entre os negros, os brancos e os índios, ou
mais ainda no caso dos descendentes de imigrantes de distintos lugares do mundo.
Por tudo isso,
parece que a melhor expressão para qualificar essa nossa realidade aparentemente
tão ambígua, entre unidade e pluralidade, seja a mencionada pelo Papa João Paulo
II quando nos visitou pela primeira vez, na cidade do Rio de Janeiro, em 1980, e
também compartida por muitas personalidades brasileiras, como, por exemplo,
Alceu Amoroso Lima. Eles afirmam que o Brasil é uma "unidade na pluralidade".
Somos um vasto território, que ao longo de sua história, soube reunir em si as
diferenças para conformar uma enorme "unidade" que não se caracteriza pela mera
"uniformidade", mas pela "pluralidade". Temos assim uma categoria muito
interessante para compreender um pouco mais a nossa identidade cultural.
Chegando até aqui,
é necessário que façamos uma pergunta: Se é verdade que somos essa "unidade na
pluralidade" que fator, ou que fatores são os responsáveis por manter essa
realidade estável e ao mesmo tempo dinâmica de nossa cultura? Resumindo, quais
são os elementos constitutivos essenciais desta nossa "unidade na pluralidade"?
O primeiro fator
constitutivo poderíamos encontrar na língua comum. A língua portuguesa é, sem
sombra de dúvidas, um desses fatores essenciais, sem os quais não poderia haver
unidade. Ainda que haja inúmeras diferenças, manifestadas inclusive no
"sotaque", falamos todos uma mesma língua e por isso podemos viver uma real
unidade.
O segundo fator
importante - claro que há muitos outros, mas por brevidade mencionaremos os mais
elementares - é a consciência de uma história comum. Nos identificamos como
brasileiros e nos distinguimos das demais nações por que somos uma cultura com
realidade histórica. Isso é tão importante que um povo, nação ou civilização que
não tenha memória histórica, corre o risco não só de ver-se desunida e sem
passado, como também sem identidade.
O terceiro elemento
importante - e na opinião de muitos historiadores, o mais essencial de uma
cultura - é a religião. É como a "alma" de um povo. Aí estão inscritos os seus
valores, o sentido da vida e a orientação última de todo o seu desenvolvimento e
progresso. E no nosso país quem cumpre esse papel preponderante, e disso a
história é testemunha absoluta, é a fé católica.
A fé católica,
semeada desde o nosso nascimento com o encontro entre índios e portugueses aos
pés da Santa Cruz, foi se propagando e dando uma real coesão à nossa cultura.
Frente às muitas diferenças, frente aos problemas e dificuldades de relações
entre nativos, portugueses e negros, entre muitos outros fatores, a presença da
fé católica garantiu, e segue garantindo, que exista essa realidade de "unidade
na pluralidade".
Um exemplo claro
desse papel sintetizador, conciliador e unitivo da fé católica na formação de
nossa cultura se percebe na história de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, a
Padroeira nacional.
2. Uma cultura fundada na fé e na piedade mariana
As primeiras
décadas do século XVIII no Brasil não foram nada fáceis. O declínio do açúcar
nordestino, a aparição de uma nova corrida aurífera no sudeste, especialmente em
Minas Gerais, a concorrência de muitos "senhores" pelo monopólio da nova região
do ouro, os conflitos entre negros e colonos portugueses, entre índios e os
chamados "bandeirantes", bem como a grande distância do território nacional e as
dificuldades nas comunicações, marcavam um panorama de tensão e de grande
preocupação pelo futuro da nação, que ainda estava em formação.
E foi assim que em
1716, um novo governador da província de São Paulo e Minas de Ouro havia sido
escolhido, D. Pedro de Almeida e Portugal, conhecido como o "Conde de Assumar".
Vinha direto de Portugal com a difícil missão de apaziguar os conflitos na
região mineira. Chega em São Paulo em 1717 e vai direto para Minas. Durante a
sua viagem, chega no domingo 17 de outubro na vila de Guaratinguetá, após ter
percorrido mais ou menos um terço do caminho, para descansar. A cidade recebe-o
com grande festa. Passou na cidade 13 dias, sob os atenciosos cuidados do
governador da Vila, o Capitão-mor Domingos Antunes Fialho.
Para a alimentação
da grande comitiva que acompanhava ao Conde de Assumar, o Senado da Câmara
mandou que alguns pescadores fossem conseguir peixes, já que a cidade estava
rodeada pelo Rio Paraíba do Sul. E assim aconteceu que...
"Entre muitos,
foram a pescar Domingos Martins Garcia, João Alves e Felipe Pedroso com suas
canoas. E principiando a lançar as suas redes no Porto de José Corrêa Leite,
continuaram até o Porto de Itaguassu, distância bastante, sem tirar peixe algum.
E lançando neste porto, João Alves a sua rede de rastro, tirou o corpo da
Senhora, sem cabeça; lançando mais abaixo outra vez a rede tirou a cabeça da
mesma Senhora, não se sabendo nunca quem ali a lançasse. Guardou o inventor esta
imagem em um tal ou qual pano, e continuando a pescaria, não tendo até então
tomado peixe algum, dali por diante foi tão copiosa a pescaria em poucos lanços,
que receoso, e os companheiros, de naufragarem pelo muito peixe que tinham nas
canoas, se retiraram a suas vivendas, admirados deste sucesso" .
Havia ocorrido um
milagre! Inexplicável como pode ser que em três lançadas de rede ao rio, se
retirasse, continuamente, um corpo, logo sua cabeça, e mais tarde uma incrível
quantidade de peixes. Felipe Pedroso, profundamente católico e tocado pela
experiência, viu e creu. Foi intercessão da Virgem Maria, Mãe de Deus! Levou,
então, a pequena imagem para a sua própria casa e poucos dias depois começou a
organizar orações, sobretudo a reza constante do terço. Novos milagres foram
acontecendo e a piedade foi aumentado incrivelmente. Já em 1748, pelo testemunho
de alguns padres jesuítas que aí foram visitar, "eram muitos os que aí se
reuniam para pedir ajuda e proteção à Senhora que eles chamam, piedosamente, de
a "Aparecida"".
A própria imagem de
Nossa Senhora Aparecida resume em si, todas as qualidades de síntese cultural,
de conciliação e da unidade da qual estamos falando. E sem dúvida, sua
"aparição" foi uma clara resposta, desde a fé, a todo esse difícil contexto
político-social que atravessava a Colônia no início do s. XVIII.
Olhemos para a
imagem. Nela se encontram o português (a imagem é uma réplica da Padroeira de
Portugal e do Brasil, Nossa Senhora da Conceição, que desde 1646 fazia parte da
devoção de D. João IV e de toda as suas colônias); o brasileiro (a imagem foi
feita, segundo estudos, com "terracota", barro paulista característico da região
encontrada); o índio (a imagem foi encontrada no rio indígena "Para`iwa", passo
entre Minas, Rio e São Paulo, hoje, Rio Paraíba do Sul); e o negro (a imagem
possui uma cor castanho escuro, tendendo ao negro).
E assim se espalhou
a devoção a Nossa Senhora da Conceição Aparecida, hoje, Padroeira do Brasil,
cujo Santuário, na cidade de Aparecida do Norte reúne milhares de fiéis, de
distintos lugares e etnias, em um bela manifestação de nossas raízes culturais,
de nossa "unidade na pluralidade" mantida e fortalecida pela fé. A História de
Nossa Senhora Aparecida nos ajuda, portanto, a entender esse papel tão
importante da fé católica na configuração de nossa identidade cultural. Somos um
país com vocação católica!
Peçamos a Nossa
Senhora da Conceição Aparecida, a "mãe amável, a mãe querida" do nosso Brasil
que interceda por cada um de nós e pelo nosso povo para que, seguindo os seus
passos, possamos ir ao encontro daquele que nos espera de "braços abertos", o
Cristo Redentor, o Filho de Maria.
Feliz dia de Nossa
Senhora Aparecida !
História
Nossa Senhora
da Conceição Aparecida
Por volta de 1717
com a notícia da passagem do Conde de Assumar pela Vila de Guaratinguetá, os
pescadores Domingos Garcia, Filipe Pedroso e João Alves saíram a procura de
peixes no Rio Paraíba. Depois de muitas tentativas sem nada conseguir, foram até
o porto de Itaguaçu. João Alves lançou a rede nas águas e apanhou o corpo de uma
imagem de Nossa Senhora da Conceição sem a cabeça. Lançando novamente as redes,
apanhou a cabeça que faltava da imagem. E o que se segui foi uma pesca abundante
para os três humildes pescadores.
A imagem ficou com
a família de Felipe Pedroso, que a levou para sua casa. Em um oratório
construído na casa as pessoas da vizinhança vinham rezar à Virgem. A devoção foi
crescendo no meio do povo e muitas graças foram alcançadas por aqueles que
rezavam diante a imagem. Assim a devoção foi se espalhando por todo o Brasil.
Logo a casa já se
fazia pequena para o grande volume de fiéis que vinham rezar e, por volta de
1734, o Vigário de Guaratinguetá construiu uma Capela no alto do Morro dos
Coqueiros, aberta à visitação pública em 26 de julho de 1745. Mas o número de
fiéis aumentava, e, em 1834 foi iniciada a construção de uma igreja maior
(actual Basílica Velha).
Em 8 de setembro de
1904, a Imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida foi coroada, solenemente,
por D. José Camargo Barros. No dia 29 de Abril de 1908, a igreja recebeu o
título de Basílica Menor. E, em 1929, o Papa Pio XI proclamou nossa Senhora
RAINHA DO BRASIL E SUA PADROEIRA OFICIAL.
Com o aumento da
devoção a Nossa Senhora da Conceição Aparecida, a primeira Basílica teve que ser
substituída por uma maior, que começou a ser construída em 11 de Novembro de
1955. Em 1980, ainda em construção, a Basílica Nova foi consagrada pelo Papa
João Paulo ll e recebeu o título de Basílica Menor. Em 1984, a Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) declarou oficialmente a Basílica de
Aparecida:Santuário Nacional; "maior Santuário Mariano do mundo".
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