Martinho nasceu em Arouca, nos fins do século XI, de pais pouco
afortunados, mas cheios de probidade e piedade. Seu pai chama-se
Arrius Manuelis e sua mãe Argia. Os primeiros cuidados que estes
santos pais tiveram para com filho, foi de o educarem cristãmente e
de lhe inculcarem os princípios evangélicos no mais
profundo
do seu juvenil coração, o que resultou, visto que a criança se
mostrou receptiva e que os seus
progressos eram contínuos, o que não
significa que fosse como todos as crianças da sua idade. Assim,
procurando a sua própria felicidade espiritual, os pais de Martinho,
souberam alicerçar a do filho.
Os
primeiros preceptores nas verdades da religião reconheceram nele
disposições para as ciências, as-sim como outras qualidades que
pareciam contrariar a sua vocação para o estado eclesiástico. Todas
estas conclusões foram explicadas aos pais de Martinho assim como o
desejo que estes conselheiros acalenta-vam de o guardarem e de lhe
oferecerem um ensino adequado às suas possibilidades naturais:
estudos de ordem superior.
Movidos
pelo amor a Deus, os pais de Martinho sentiram-se felizes de
oferecerem a Deus o fruto do seu amor e aceitaram que ele fosse
estudar, o que logo a seguir aconteceu: começou a estudar filosofia
e teologia. Martinho foi tão estudioso e sério que pouco tempo
depois era apresentado aos seus con-discípulos, como um modelo de
abnegação e de seriedade.
Esta
nova “notoriedade” não ficou no silencio das al-covas, bem pelo
contrário, como vamos ver:
Um dia
Maurício, Arcebispo de Braga, viajando para Arouca, apresentaram-lhe
o jovem Martinho como sendo um digno discípulo sobre o qual a Igreja
poderia contar e sobre o qual se fundavam grandes esperanças. Os
modos serenos e humildes do jovem estudante cativaram tanto o
Arcebispo, que logo o enviou para Braga e, mais tarde ofereceu-lhe o
título de Cónego, antes mesmo de receber a ordenação sacerdotal, o
que era frequente naquela época longínqua; ordenação que recebeu
pouco tempo depois.
Da
mesma maneira que até ali servira de exemplo aos seus companheiros,
da mesma maneira, no seu novo estado de vida, continuou a ser um
exemplo de devoção e de exactidão na execução do tudo quanto lhe era
pedido e na sua acção sacerdotal quotidiana.
Martinho esforçava-se para não mostrar o brilho das suas virtudes,
de se mostrar como todos, mas não conseguiu impedir que estas
brilhassem como mil estrelas e fizessem dele uma pessoa respeitada e
admirada e sobretudo amada por todos aqueles que o conheciam.
O
Arcebispo de Braga pensou oferecer-lhe um cargo que contribuísse a
pôr em relevo o seu zelo e as suas qualidades espirituais, mas
Martinho não desejava nem honras nem louvores: só o amor de Deus o
animavam e trabalhar humildemente na vinha do Senhor era a sua única
preocupação; preferiu que o Prelado lhe desse uma paróquia simples e
humilde, mesmo desconhecida, o que acabou por acontecer: foi nomeado
pároco de Soure, na diocese de Coimbra que nesse tempo dependia da
arquidiocese de Braga.
Mal
tomou conta da paróquia de Soure, logo mandou reconstruir a igreja
que os infiéis tinham destruído, e dispensou todos os seus cuidados
para chamar o seu rebanho a uma nova vida, pela força de sua
doutrina, a sabedoria de suas exortações e a força de seus sermões.
Foi a doçura que caracterizou principalmente o exercício das suas
funções, e por ela ganhou o Senhor os mais endurecidos pecadores.
Esta bela virtude, na qual Jesus Cristo nos procedeu pelo seu divino
exemplo, fazia sobressair em Martinho como um novo luminar, a sua
constante e indefectível humildade, a sua caridade contínua para com
todos, sem excepção. Ele tinha horror pecado, mas não odiava o
pecador, porque
ele sabia que o Espírito Santo intercede sempre e opera com suspiros
que nenhum idioma pode expressar. Evitava no entanto a companhia
dos homens viciosos todas as vezes que ele pensasse que a sua
própria alma estivesse em perigo. Os momentos de lazer, ele
preferia ocupá-los em trabalhos manuais do que abandonar-se
por pouco que fosse à inacção.
O seu
zelo não se limitava unicamente aos cristãos, ele procurava
ardentemente chamar os infiéis ao rebanho de Jesus Cristo. Os Mouros
ainda muito números nesse tempo em Espanha ofereciam-lhe um vasto
terreno de trabalho pastoral, mas a sua fugosa actividade evangélica
teve como resultado desencadear a ira dos maometanos e, quando estes
invadiram Portugal em 1146 procuraram Martinho, prenderam-no e
enviaram-no para a prisão de Scalabus — a actual Santarém — e daí
para uma cadeia em Córdova, na Espanha, onde ele morreu no dia 31 de
Janeiro de 1147, oito anos depois da independência da Lusitânia, que
então tomara o nome de Portugal.
A
maneira como morreu, tende a pensar que foi considerado pela Igreja,
assim como pela maior parte dos historiadores, como mártir da fé.
Afonso
Rocha
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