Santa
Margarida, natural de Alviano na Toscana, tem o sobrenome de
Cortona, cidade onde passou grande parte da vida e morreu. Menina de
8 anos, apenas, perde a mãe, que a tinha educado com todo o cuidado.
A
perda
da mãe foi o princípio da infelicidade da pobre órfã. Não havendo
quem lhe guiasse os passos e de certo modo substituísse o cuidado e
a vigilância materna, Margarida viu-se em breve rodeada de elementos
que pessimamente a influíram na formação do carácter. Bonita,
atraente, de temperamento jovial e expansivo, deu ouvidos às vãs
lisonjas e fúteis amabilidades, e abriu as portas do coração à
vaidade.
Em vão
o pai avisou-a do perigo que corria. Esses bons conselhos foram
dados a ouvidos surdos. Dezasseis anos contava Margarida, quando
abandonou secretamente a casa paterna, procurando a companhia de um
jovem fidalgo, com quem viveu ilícita e criminosamente pelo espaço
de nove anos, em Montepulciano. Deus, que permitira esta triste
queda, não perdeu de vista a ovelhinha desgarrada. A consciência não
deixou de fazer-lhe reclamos, com insistência cada vez mais
acentuada.
Debalde, Margarida não se animava a deixar a vida, que a algemava
aos prazeres ilícitos. Deu-se então um fato que lhe abriu os olhos e
a chamou ao bom caminho. O amante tendo empreendido longa viagem de
negócio, foi em caminho assaltado e assassinado. O cadáver esteve
dois dias e duas noites no lugar do crime, ficando-lhe ao lado o
cão, que tinha acompanhado o dono. No terceiro dia apareceu o fiel
animal na casa de Margarida e pelo latido plangente, deu sinal de um
acontecimento extraordinário.
Como,
porém, Margarida não desse atenção, o cão puxou-a pelo vestido, como
se quisesse convidá-la a acompanhá-lo. Margarida então atendeu e o
cão conduziu-a ao lugar onde se achava o corpo do assassinado, já em
estado de decomposição bem adiantada, enchendo o ambiente de cheiro
insuportável.
Margarida, diante do espectáculo que se lhe apresentava ante os
olhos, impressionou-se profundamente e o primeiro pensamento que lhe
veio, foi: “Onde estará sua alma?” Que momento de horror para
Margarida! Mas também era a hora da graça e da salvação que se
aproximava!
A porta
do coração, tanto tempo fechada aos convites de Deus, abriu-se ao
Bom Pastor. Jesus, que tinha andado tantos anos atrás desta ovelha
tresmalhada achou-a enfim e, pondo-a sobre os ombros, levou-a ao
aprisco. Lágrimas de arrependimento borbulhavam dos olhos de
Margarida; uma dor profunda e sincera feria-lhe o coração; mas,
animada por uma confiança ilimitada na misericórdia de Deus, dizia
de si para si: “Deus quer salvar-me. Porque teve tanta paciência
comigo? É seu amor, que me deu tanto tempo para fazer penitência; é
seu amor que me mandou este tremendo aviso, quem sabe? Talvez o
último”.
Profundamente abalada, no seu interior, voltou para casa, resolvida
a dizer adeus ao pecado e começar uma nova vida, vida de penitência.
Fez o voto de dedicar o resto da vida à mais severa penitência.
Caiu-lhe na alma, como um peso enorme, o modo ingrato com que
tratara o pai e parecia-lhe ouvir os gemidos de dor, que durante
nove anos, seu procedimento tinha arrancado do coração do seu maior
benfeitor.
Resolutamente se pôs a caminho, à procura do pai. Embora
compenetrada da gravidade da culpa, embora dizendo-se indigna do
paternal perdão, resolvida estava a fazer tudo, para reparar a falta
e reabilitar-se na amizade do pai. Margarida contava então 25 anos.
Chegando a Alviano, em altos soluços, prostrou-se aos pés do pai,
pedindo a recebesse outra vez em sua casa, pois que estava resolvida
a mudar de vida. O pai comoveu-se diante do pedido da filha e
recebeu-a com todo amor; não assim, porém, a madrasta, que não viu
de bons olhos a permanência da pecadora em sua casa. Assim, exposta
de novo ao perigo, Margarida, renovou o protesto de antes morrer de
fome, do que voltar à vida anterior. Elevando os olhos ao céu,
exclamou: “Meu Senhor e Salvador de minha alma, quereis que ela se
perca? Ela vos custou tanto como a de Madalena. Ó vós que me
remistes, pelo preço de vosso sangue, não me desampareis no meu
mísero estado! Tende compaixão de mim!” Deus ouviu a oração da pobre
pecadora. Esta, cedendo a um impulso interior, dirigiu-se a Cortona,
para lá se confessar e receber do confessor a directiva de uma nova
vida. Fez a confissão geral, com muita contrição, na Igreja dos
Padres Franciscanos. O pedido de Margarida de ser aceita entre as
penitentes da Ordem Terceira pôde ser atendido, só depois dela ter
dado prova suficiente de sua constância.
A
partir da conversão, a vida de Margarida foi uma série contínua de
práticas de virtudes, principalmente da mortificação, penitência,
humildade e paciência. Tinha por alimento só pão e água; por leito o
soalho e de travesseiro servia-lhe uma pedra. A maior parte da noite
passava em oração e em práticas de penitência. Para castigar e
mortificar o corpo sujeitou-o à disciplina diária. A meditação da
Sagrada Paixão e Morte de Jesus Cristo não só lhe despertou no
coração terno amor ao divino Salvador, mas também fez crescer-lhe
cada vez mais o desejo de sofrer com ele e por ele. Os sofrimentos,
que Deus lhe enviava aceitava-os com a maior paciência e o desprezo
que recebia do mundo, causava-lhe prazer. O pesar de ter ofendido a
Deus era tão grande, que não só chorava amargamente as infidelidades
passadas, mas chegava até a desmaiar.
Vinte e
três anos passou Margarida penitenciando-se por seus pecados. Alguns
anos depois da conversão lhe sobrevieram tentações as mais
terríveis. O inimigo tudo fazia, para convencê-la da insuficiência
das obras penitenciais. Surgiram na mente veleidades de abrandar a
mortificação, sair de Cortona. Parecia-lhe que as penitências deviam
ter já alcançado o completo perdão dos seus pecados e tinha a
obrigação de conservar a vida, para poder servir a Deus muito tempo
ainda. O bom senso, porém, e mais ainda a graça divina fizeram-lhe
conhecer em tudo isto uma tentação diabólica.
Numa
ocasião, em que as tentações sobremodo a atormentaram, Margarida
prostrou-se aos pés do Crucifixo, clamando a Deus que a socorresse.
Cristo se dignou de aparecer a sua serva e disse-lhe: “Tem ânimo,
minha filha! Estou contigo, no meio das tentações. Com apoio da
minha graça, vencerás todas. Segue em tudo o conselho do teu
confessor”. Não foi esta a única aparição que Margarida teve.
Distinguiram-na com seus colóquios a SS. Virgem, vários Santos e
principalmente o Anjo da Guarda.
Este
lhe deu certeza do completo perdão dos seus pecados. Apareciam-lhe
também as almas do purgatório, em particular aquelas que foram
remidas pelas suas orações e penitências.
A visão
porém, mais consoladora que Cristo lhe concedeu, foi uma, pouco
antes do feliz trânsito, em que Jesus, anunciando-lhe a proximidade
da morte, assegurou-lhe a completa remissão dos pecados passados e
que sua alma iria para o céu, acompanhada de todas as almas do
Purgatório, que deviam a libertação às suas orações e boas obras.
Com santa impaciência aguardou Margarida a chegada desta feliz data.
Era o dia 22 de Fevereiro de 1297. Margarida contava 48 anos. O
corpo foi, em grande solenidade, enterrado na Igreja da Ordem de São
Francisco, onde até hoje é conservado intacto. Muitos milagres têm
provado a santidade da serva de Deus. Bento XIII inseriu-a
solenemente no catálogo dos Santos, em 1728.
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