Júlia nasceu
no século V, em Cartago. Viveu feliz até que, um dia, os vândalos, chefiados
pelo sanguinário rei Genserico, invadiram sua cidade e a dominaram. Os pagãos
devastaram a vida da comunidade como um furacão.
Mataram muitos católicos, profanaram os templos, trucidaram os sacerdotes e
venderam os cidadãos como
escravos. A vida de Júlia passou do paraíso ao inferno
de forma rápida e terrível. De jovem cristã, nobre e belíssima, que levava uma
vida tranquila e em paz com Deus, viu-se condenada às mais terríveis privações.
Mas, mesmo vendo trocadas a fortuna pela miséria, a veneração pelo desprezo, a
independência pela obediência, enfim, a liberdade pela escravidão, Júlia não se
abalou.
A tradição conta que ela foi vendida para Eusébio, um negociante sírio. Mas a
bondade e a resignação da moça, que encontrava na fé cristã o bálsamo para todas
as dores, comoveram seu amo, que passou a respeitá-la e exigir o mesmo de todos,
nunca permitindo que fosse molestada. Chegou a autorizar até que ela dedicasse
algumas horas do dia às orações e leituras espirituais.
Certa vez, ele viajou para a Europa e, entre os vários escravos que o
acompanharam, estava a bela e inteligente Júlia. Na ilha francesa da Córsega
realizavam-se festas pagãs quando a comitiva de Eusébio chegou. Ele e todos os
demais se dirigiram a um templo dos deuses locais para prestar suas homenagens,
mas Júlia recusou-se a entrar. Ajoelhou-se à porta do templo e passou a rezar
para que Deus mostrasse aos pagãos a Palavra de Jesus, caminho da verdade.
A atitude chamou a atenção e chegou aos ouvidos do governador Félix, que
convidou Eusébio para um banquete e propôs comprar a escrava Júlia por um preço
absurdo, ou trocá-la pelas quatro mais belas escravas do seu palácio. Contudo o
comerciante recusou. Enraivecido pela paixão que Júlia despertara, embebedou o
comerciante, cercou-o de mulheres exuberantes e tomou a escrava à força,
enquanto Eusébio dormia.
Júlia manteve-se firme e não se curvou. Recusou a liberdade oferecida pelo
governador em troca do sacrifício aos deuses e de ceder aos seus desejos. Félix,
irado, esbofeteou-a até que sangrasse abundantemente pelo nariz, depois mandou
que fosse flagelada e, por fim, crucificada como Cristo e atirada ao mar. Quando
Eusébio acordou, era tarde.
Ela aceitou o sofrimento como uma forma de demonstrar a Deus o seu amor,
contribuindo para que o cristianismo crescesse e desse frutos, sem renegar a sua
fé em Cristo, morrendo como seu Mestre. O seu corpo foi encontrado, ainda
pregado na cruz, boiando no mar, pelos monges do convento da ilha vizinha de
Gorgona. Depois eles o transportaram para a ilha, tiram-no da cruz, ungiram-no e
o colocaram num sepulcro.
Júlia não ficou esquecida ali, o seu culto difundiu-se e chegou à Itália. No ano
762, a rainha Ansa, esposa do rei lombardo Desidério, mandou trasladar as
relíquias de santa Júlia para Brescia, propagando ainda mais a sua veneração
entre os féis. Um ano depois, o papa Paulo I consagrou a ela uma igreja naquela
cidade. A festa litúrgica de santa Júlia, a mártir da Córsega, ilha da qual é a
padroeira, ocorre no dia 22 de maio.
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