O Papa polaco é uma das
figuras mais marcantes da história recente, na Igreja e no mundo, e
tem atrás de si a herança de um longo Pontificado de 26 anos e meio.
Karol
Wojtyla nasceu no dia 18 de Maio de 1920 em Wadowice, no sul da
Polónia, filho de Karol Wojtyla, um militar do exército
austro-húngaro, e Emília Kaczorowsky, uma jovem de origem lituana.
Aos 9 anos de idade recebeu
um duro golpe, o falecimento de sua mãe ao dar à luz a uma menina
que morreu antes de nascer. Três anos mais tarde faleceu o seu irmão
Edmund, com 26 anos, e em 1941 morre o seu pai.
Em 1938 foi admitido na
Universidade Jagieloniana, onde estudou poesia e drama.
Durante a II Guerra Mundial
(1939- 1945) esteve numa mina em Zakrzowek, trabalhou na fábrica
Sol-vay e manteve uma intensa actividade ligada ao teatro, antes de
começar clandestinamente o curso de seminarista. Durante estes anos
teve que viver oculto, junto com outros seminaristas, que foram
acolhidos pelo Cardeal de Cracóvia.
Segundo relata o actual
Pontífice, estas experiências ajudaram-no a conhecer de perto o
cansaço físico, assim como a simplicidade, a sensatez e o fervor
religioso dos trabalhadores e pobres.
As marcas no seu corpo
começam a aparecer quando em Fevereiro de 1944 é atropelado por um
camião alemão e é hospitalizado.
Ordenado sacerdote em 1946,
vai completar o curso universitário no Instituto Angelicum de Roma e
doutora- se em teologia na Universidade Católica de Lublin, onde foi
professor de ética.
A forma filosófica, que
integrava os métodos e perspectivas de fenomenologia na filosofia
Tomistica, de gerir as questões que se lhe apresentavam no dia a
dia, estão relacionadas com a sua "devoção" ao pensador Alemão Mas
Scheler.
No dia 23 de Setembro de
1958 foi consagrado Bispo Auxiliar do administrador apostólico de
Cracóvia, D. Baziak, convertendo-se no membro mais jovem do
episcopado polaco. Participou no Concílio Vaticano II, onde
colaborou activamente, de maneira especial, nas comissões
responsáveis na elaboração da Constituição Dogmática Lumen Gentium e
a Constituição conciliar Gaudium et Spes. Durante estes anos o então
Bispo Wojtyla combinava a produção teológica com um intenso labor
apostólico, especialmente com os jovens, com os quais compartilhava
tantos momentos de reflexão e oração como espaços de distracção e
aventura ao ar livre.
No dia 13 de Janeiro de 1964
faleceu D. Baziak e Wojtyla sucedeu-lhe na sede de Cracóvia como
titular. Dois anos depois, o Papa Paulo VI converte Cracóvia em
Arquidiocese.
Durante este período como
Arcebispo, o futuro Papa caracterizou-se pela integração dos leigos
nas tarefas pastorais, pela promoção do apostolado juvenil e
vocacional, pela construção de templos apesar da forte oposição do
regime comunista, pela promoção humana e formação religiosa dos
operários e também pelo estímulo ao pensamento e publicações
católicas. Representou igualmente a Polónia em cinco sínodos
internacionais de bispos entre 1967 e 1977.
Em Maio de 1967, aos 47
anos, o Arcebispo Wojtyla foi criado Cardeal pelo Papa Paulo VI.
Em 1978 morre o Papa Paulo
VI, e é eleito como novo Papa o Cardeal Albino Luciani de 65 anos
que tomou o nome de João Paulo I.
O "Papa do Sorriso",
entretanto, falece 33 dias após a sua nomeação e no dia 15 de
Outubro de 1978, o Cardeal Karol Wojtyla é eleito como novo Papa, o
primeiro papa não-italiano desde 1522, ano da eleição do holandês
Adriano VI.
Tendo-se formado num
contexto diferente dos Papas anteriores, João Paulo II viria a
imprimir na Igreja um novo dinamismo, impondo ao mesmo tempo um
maior rigor teológico e disciplinar.
Homem
de luta num mundo em mudança
O Papa que veio do Leste
recebeu uma Igreja cujo governo atravessava uma certa crise, presa
na tensão entre os avanços do Concílio e a perda de identidade
perante a modernidade. Desde o início, João Paulo II pediu “não
tenhais medo” e fala na primeira pessoa do singular em vez do
plural: esta afirmação de identidade vem acompanhada de uma
experiência histórica notável, atravessando guerras mundiais e a
vivência sob um regime comunista, que fala ao coração de milhões de
pessoas.
A enorme produção doutrinal
do Papa (ver números) deve, pois, ser lida à luz da necessidade de
dar respostas pastorais a um mundo em mudança. João Paulo II sempre
foi capaz de definir etapas mobilizadoras da Igreja e do mundo, na
busca de uma identidade forte – visível na devoção mariana e na
formulação de um todo doutrinal – que fosse capaz de sustentar o
diálogo com outras confissões religiões.
A sensibilidade para as
implicações na sociedade da acção da Igreja não inviabilizou que o
Pontificado tivesse dado prioridade à acção pastoral, mesmo sem
secundarizar a política. A ideia, explícita logo desde a primeira
encíclica, é recentrar a mensagem cristã em Jesus, que revela ao
homem o seu destino e a sua dignidade.
A “Redemptor Hominis” de
João Paulo II revela-o atento à necessidade não só do diálogo
ecuménico com todas as Igrejas cristãs, mas também com todas as
religiões. Neste Pontificado há uma grande novidade: o Papa sabe que
o mundo não se tornará completamente cristão ou católico, sabe que é
necessário viver com os demais, sejam judeus, muçulmanos ou ateus, e
isto é radicalmente novo na concepção da Igreja.
Esta novidade representa um
ponto fundamental deste Pontificado, a consciência de que a
experiência católica tem de conviver com outras, e é pela qualidade
desse convívio que ela pode evangelizar.
Muitos falam de um “Papa
político”, alguém que lutou abertamente contra os regimes comunistas
de Leste desde a sua primeira viagem à Polónia em 1979 e contra o
capitalismo reinante na sociedade ocidental. A Igreja é desafiada a
resistir, anunciar e mudar: os apelos do Papa em favor do Terceiro
Mundo percebem melhor à luz destas premissas.
As profundas transformações
ocorridas na Europa no final do segundo milénio e no início do
terceiro têm em João Paulo II um dos principais protagonistas. No
começo do pontificado de João Paulo II, a Europa, pelo Tratado de
IALTA, continuava dividida em dois blocos por motivos ideológicos e
geopolíticos. Começava a surgir, à época, o Sindicado Solidariedade,
que ameaçava provocar instabilidade não só no interior da Polónia
mas também em outros países do Leste Europeu.
O Papa apoiou e estimulou a
chamada “Ostpolitik”, conduzida pelo seu Secretário de Estado, o
Cardeal Agostinho Casaroli, e continuada pelo seu sucessor, o
Cardeal Angelo Sodano. O processo culminou, no período do Presidente
Gorbachev, em marco de 1990, com o restabelecimento das relações
oficiais entre o Vaticano e a ex-União Soviética.
João Paulo II é um ardoroso
defensor da “Grande Europa”, que se estende do Atlântico aos Urais.
A “Grande Europa”, segundo ele, deve respirar com os dois pulmões,
alimentar-se com a riqueza das duas tradições: a cristã-ocidental e
a eslavo-ortodoxa.
Com o final da guerra fria,
os medos da humanidade viram-se hoje para a guerra das civilizações,
confrontos com motivações religiosas entre o mundo árabe e o
Ocidente. O papel de João Paulo II, mesmo aos 83 anos, voltou a ser
fundamental. A campanha contra a guerra no Iraque é o acto que
simbolicamente congrega as iniciativas e apelos de paz de João Paulo
II ao longo dos últimos 26 anos, nascidos da convicção de que o
respeito pelos direitos humanos é o único caminho para os povos.
Menos unânimes, mas
igualmente firmes, foram as posições do Papa sobre os temas do
matrimónio, da família, da defesa da vida desde a sua concepção até
ao momento da morte natural ou da moral sexual. Essa acção, mesmo se
contestada, apresenta João Paulo II como uma consciência crítica, em
referência constante ao Evangelho.
A 2 de Abril de 2005, o
último gigante do nosso tempo morreu no Vaticano.
Em
28 de Abril do mesmo ano, o novo Papa, Bento XVI, concedeu a
dispensa dos 5 anos depois da morte, para que se iniciasse
imediatamente o processo de beatificação e canonização de João Paulo
II. O processo canónico foi aberto em 28 de Junho do mesmo ano pelo
Cardeal Camilo Ruini, Vigário Geral da diocese de Roma.
No dia 1 de Maio de 2011
foi proclamado Bem-aventurado pelo seu sucessor Bento XVI.
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