No
centro do Coliseu romano, o bispo cristão aguarda ser trucidado
pelas feras, enquanto a multidão exulta
em
gritos de prazer com o espectáculo sangrento que vai começar. Por
sua vez, no estádio, cristãos incógnitos, misturados entre os
pagãos, esperam, horrorizados, que um milagre salve o religioso. Os
leões estão famintos e excitados com o sangue já derramado na arena.
O bispo Inácio de Antioquia, sereno, esperava sua hora pronunciando
com fervor o nome do Cristo.
Foi
graças a Inácio que as palavras cristianismo e Igreja Católica
surgiram. Era o início dos tempos que mudaram o mundo, próximo do
ano 35 da era cristã, quando ele nasceu. Segundo os estudiosos, não
era judeu e teria sido convertido pela primeira geração de cristãos,
os apóstolos escolhidos pelo próprio Jesus. Cresceu e foi educado
entre eles, depois sucedeu Pedro no posto de bispo de Antioquia, na
Síria, considerada a terceira cidade mais importante do Império
Romano, depois de Roma e Alexandria, no Egito. Gostava de ser
chamado Inácio Nurono. Inácio deriva do grego "ignis", fogo, e
Nurono era nome que ele mesmo dera a si, significando "o portador
Deus". Desse modo viveu toda a sua vida: portador de Deus que
incendiava a fé.
Mas sua
actuação logo chamou a atenção do imperador Trajano, que decretou
sua prisão e ordenou sua morte. Como cristão, deveria ser devorado
pelas feras para diversão do povo ávido de sangue. O palco seria o
recém-construído Coliseu.
A
viagem de Inácio, acorrentado, de Antioquia até Roma, por terra e
mar, foi o apogeu de sua vida e de sua fé. Feliz por poder ser
imolado em nome do Salvador da humanidade, pregou por todos os
lugares por onde passou, até no local do martírio. Sua prisão e
condenação à morte atraiu todos os bispos, clérigos e cristãos em
geral, de todas as terras que atravessou. Multidões juntavam-se para
ouvir suas palavras. Durante a viagem final, escreveu sete cartas
que figuram entre os escritos mais notáveis da Igreja, concorrendo
em importância com as do apóstolo Paulo. Em todas faz profissão de
sua fé, e contêm ensinamentos e orientações até hoje adoptados e
seguidos pelos católicos, como ele tão bem nomeou os seguidores de
Jesus.
Numa
dessas cartas, estava o seu especial pedido: "Deixai-me ser alimento
das feras. Sou trigo de Deus. É necessário que eu seja triturado
pelos dentes dos leões para me tornar um pão digno de Cristo".
Fazia-o sabendo que muitos de seus companheiros poderiam influenciar
e conseguir seu perdão junto ao imperador. Queria que o deixassem
ser martirizado. Sabia que seu sangue frutificaria em novas
conversões e que seu exemplo tocaria o coração dos que, mesmo já
convertidos, ainda temiam assumir e propagar sua religião.
Em
Roma, uma festa que duraria cento e vinte dias tinha prosseguimento.
Mais de dez mil gladiadores dariam sua vida como diversão popular
naquela comemoração pela vitória em uma batalha. Chegada a vez de
Inácio, seus seguidores e discípulos esperavam, ainda, o milagre.
Que não
viria, porque assim desejava o bispo mártir. Era o dia 17 de outubro
de 107, sua trajectória terrena entrava para a história da
humanidade e da Igreja.
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