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PONTOS
DE REFLEXÃO
No terceiro
capítulo do Génesis descreve-se o drama mais profundo da humanidade: a
queda original que introduz a morte na criação. Depois de consumação do
pecado por Adão e Eva, há um momento de silêncio no qual se ouve apenas
Deus ao caminhar pelo jardim à procura do homem. Não propriamente motivo
de festa e de encontro. Adão está escondido. Mas a voz de Deus
interpela-o: “ Onde estas?” (v.9b). Adão sai do seu esconderijo, mas não
responde à pergunta, mostrando que não está à altura, já não tem Deus em
si. As suas palavras dão testemunho desta triste realidade. Em primeiro
lugar declara abertamente que está dominado pelo medo e pela vergonha: a
criatura até bem pouco tempo livre sente-se agora escrava. Logo,
indirectamente, manifesta o estado de solidão em que vive: a relação com
a mulher e a criação, antes fundada na amizade e na ajuda mútua, agora
está sujeira ao engano, à desconfiança, à oposição.
Depois de
escutar os três culpados ( Adão, Eva e a serpente) , Deus pronuncia a
sentença. Podíamos pensar que o castigo seria a morte, mas não. Deus
propõe um castigo que aparece como um caminho de purificação com vistas
a uma salvação prometida (v.15). Deus, que começa a revelar-se como o
Misericordioso, coloca-se do lado do homem contra a serpente -símbolo do
mal – que recebe a maldição. A humanidade será certamente ferida, mas só
no calcanhar; quer dizer, numa parte não vital e fácil de curar; a
serpente, pelo contrário, será ferida na cabeça, derrotada
definitivamente. Por isso se definiu ao v. 15 (estabelecerei inimizade
entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a descendência dela)
como o “protoevangelho”, primeiro anúncio da vitória do homem sobre o
pecado e a morte.
Notemos,
finalmente, o nome novo que o homem dá á mulher: Eva, mãe dos viventes
(não dos mortais). Podemos ver aqui a prefiguração de Maria, a nova Eva
que cooperará com a obra da restauração da humanidade pecadora e Jesus a
dará como mãe da Igreja nascente, precisamente no momento da morte na
cruz.
A carta aos
Efésioas começa com aquilo que se chama o Mgnificat de Paulo. Ele que
está a viver anos duros na prisão por causa da fé, deixa brotar do seu
coração um cântico de acção de graças a Deus Pai de nosso Senhor Jesus
Cristo. Cristo é o único Mediador. Cristo é o Messias. O hino exalta o
plano de salvação de que o apóstolo é testemunha. Quanto Paulo refere de
si mesmo vale para qualquer cristão e de um modo proeminente para Maria.
Nela se realiza em plenitude o palno divino de fazer-nos “santos e
irrepreensíveis, em caridade, na sua presença”, quer dizer, consagrados
exclusivamente aos seu “serviço2 (“santos”), separados de tudo o que é
mundano e pecaminoso (“irrepreensíveis”) . Tudo isto não pela
capacidade humana, mas por puro dom. Nenhum mérito, esforço ou ascese
poderiam jamais reparar o mal que corrompe a humanidade desde as suas
raízes.
Maria, a
Virgem Imaculada, é a eleita para ser a morada do verbo de Deus. Por
isso foi preservada do pecado original em “previsão dos méritos de
Cristo Redentor”. Por Maria chega o cumprimento do plano divino de nos
fazer seus filhos adoptivos.
Lendo o
relato da Anunciação na Solenidade da Imaculada Conceição, merecem
particular atenção as expressões da saudação do Anjo Gabriel a Maria.
Entrando onde Ele estava chamou-Lhe. “Cheia de graça”. A Sua Imaculada
Conceição é obra da graça do Redentor, que nela oferece a todos os
homens a imagem e modelo da vocação da humanidade.
Logo o anjo
diz a Maria: “O Senhor está contigo”, usando uma expressão tão frequente
no Antigo Testamento e que sempre acompanhou o caminhar do povo eleito
ao longo dos séculos. O Senhor sempre esteve com o seu povo, ainda que o
povo não tenha estado sempre com o seu Senhor. Frequentemente se
afastou, duvidou, se sentiu abandonado, . Aqui estas palavras do anjo
assumem um sentido pleno, como se o anjo dissera. “Tu estás sempre com o
Senhor”.
O sim de
Maria dá como resposta ressoa como um cântico de louvor, é como que o
eco fiel do “aqui estou, Senhor para fazer a tua vontade” (Sal.39,8) com
o qual o mesmo Jesus adere á vontade salvífica de Deus. No encontro
destas duas obediências (Maria e Jesus) cumpre-se o plano de salvação.
P. José
Granja,
Reitor da Basílica dos Congregados, Braga. |