1-A existência do demónio
Antes de mais,
é necessário enquadrar o problema da existência do demónio, posta em dúvida
por bom número de teólogos racionalistas, que desejam interpretar Satanás
unicamente como um mito ou um símbolo do mal em geral. A estes sábios, nós
lembramos o que ensina o Catecismo de Igreja Católica: “quando no fim do
‘Pai N osso’ nós dizemos ‘mas livra-nos do mal’, neste pedido, o Mal não é
uma abstracção, mas designa uma pessoa, Satanás, o Maligno, o anjo que se
opõe a Deus. O ‘diabo’” (CIC, n° 2851)

O Papa Paulo VI
disse, referindo-se ao diabo: “Satanás é um agente perverso e de
perversão... não é só um demónio, mas uma terrível pluralidade”.
Portanto Satanás é uma pessoa, e mesmo uma pluralidade de pessoas: nele
estão incluídos todos os anjos que, tendo recusado obedecer a Deus, se
tornaram demónios, quer dizer rebeldes e malditos. Apoiando-nos sobre esta
doutrina da Igreja, é oportuno procurar na Bíblia algumas passagens de onde
emerge que a existência de Satanás está claramente revelada na Escritura;
por outro lado, pode compreender-se que falar do demónio significa falar
indirectamente de Cristo, visto que a Bíblia afirma que Jesus é o Salvador,
vindo para nos libertar do poder do Maligno. “Satanás é livre,
inteligente e dotado de espírito de iniciativa”.
2-A acção do diabo
A sua
actividade principal, que nós podemos definir como principal, consiste em
tentar o homem para o mal, procurando que ele se afaste de Deus. Eis porque
não basta simplesmente “crer em Deus” — o que é o próprio de 90% dos nossos
contemporâneos — mas é necessário fazer a vontade de Deus. “Durante os
meus 45 000 exorcismos — conta ironicamente o Padre Gabriel Amorth — eu
nunca encontrei um diabo que não acreditasse em Deus. Acreditar de nada
serve; é melhor fazer o que Jesus nos ensinou” (Cf. Jc 2, 14-20; Mt 7,
21).
Todos nós somos
submetidos a esta acção do demónio, e isto durante toda a nossa vida, como
aconteceu com Jesus e Maria; eis porque é necessário velar, de fugir das
ocasiões de pecar e sobretudo de rezar, porque sós, acabaríamos por perder
na luta contra Satanás; mas se pelo contrário nos unirmos a Jesus pela
oração, seremos vencedores.
Existe também
uma actividade extraordinária do demónio, que consiste no seu poder de
ocasionar tribulações particulares, excepcionais; isso acontece muitas vezes
por nossa própria culpa, mas outras vezes por causa de outros. Nós podemos
classificar estes males em quatro categorias, se bem que não exista uma
linguagem comum a todos os exorcistas para descrever os fenómenos
demoníacos.
A possessão
O diabo entra
no corpo humano e manifesta-se por gestos e palavras. Neste caso, que fique
bem esclarecido, Satanás não pode tornar-se mestre da alma.
A vexação
O demónio
atinge uma pessoa por meio de sofrimentos e de malefícios, agindo no plano
da saúde, das afeições ou/e do trabalho. É um caso muito difícil de
discernir porque muitas vezes estes males provêm de Satanás mas de uma
maneira indirecta, não evidente, parecendo até provocados por fenómenos
naturais. Portanto, as pessoas atingidas, muitas vezes incompreendidas pelos
sacerdotes e pelos Bispos pouco instruídos sobre estes factos, dirigem então
as suas buscas para os magos; os problemas complicam-se então ulteriormente
porque toda a magia tira a sua eficácia do reino das trevas.
É uma ilusão
insensata de pensar que a magia chamada “branca”, aquela que parece ter uma
finalidade de bem, possa utilizar o poder do Maligno para se tornar benéfica
e eliminar o mal. A magia é sempre negra, sempre maléfica, mesmo quando ela
é apresentada como “boa”.
A obsessão
Trata-se de
perturbações que atingem o homem, que modificam a sua serenidade, o seu
equilíbrio psíquico-emotivo. Satanás ataca causando perturbações, angústias
e tormentos íntimos.
A infestação
São aqueles
malefícios que atacam igualmente as coisas e os animais. O Catecismo da
Igreja Católica afirma que se podem também fazer exorcismos às coisas (CIC
n° 1672), e, de facto, acontece algumas vezes ter de se exorcizar as casas e
os lugares.
Todos estes
males particulares — que todavia nunca têm poder sobre a alma — se recebem
por quatro motivos:
1-Por livre
iniciativa do demónio
Deus, em
virtude da liberdade concedida a cada criatura, tolera que Satanás opere o
mal, mesmo se o mal não é a vontade do Senhor. A sua não intervenção
imediata não representa no entanto uma permissão de Deus para o mal. Os
motivos desta vontade divina, nós desconhecemo-la em parte; no entanto nós
sabemos que o Todo Poderoso tem o poder de transformar o mal em bem.
Numerosos
santos foram atingidos por possessões, vexações, obsessões, e
santificaram-se através destas provas: Padre Pio, o cura de Ars, Santa Gema
[Galgani]... Não esqueçamos o valor da cruz. Os males satânicos, oferecidos
a Deus como sacrifício, têm um enorme poder de redenção.
2-Pela
frequentação de lugares perigosos
Magos,
cartomantes, grupos satânicos, sessões de espiritismo.
3-Pela
persistência no pecado grave
Com o tempo
“endurece-se” no pecado e o mal enterra cada vez mais as suas raízes em nós.
4-Pelos
malefícios
É a causa mais
comum, que diz respeito a 90% dos casos e não depende daquele que é atingido
pelo mal. “Malefício” significa um mal feito com a ajuda do demónio. Quem
pode fazê-lo? Nem todos podem fazê-lo, mas só os magos realmente em contacto
com o diabo. São conhecidas diversas formas de malefícios: feitiço,
encadeamento, mau olhado... São culpados destes males aquele que ordena os
malefícios e aquele que os faz.
3-A autoridade que Cristo conferiu à
Igreja
para que ela possa expulsar Satanás
Jesus deu este
poder, primeiramente aos Doze, depois aos 72; e por fim, a todos os crentes:
“Estes sinais acompanharão aqueles que acreditarem: em
meu nome expulsarão demónios” (Mc 16, 17).
Portanto,
actualmente, o exorcismo só pode ser praticado por um sacerdote autorizado
pelo seu próprio Bispo, e com a autorização do Bispo local.
Todavia, cada
fiel pode recitar orações de libertação, para ele próprio e para os outros,
sem que seja necessária uma autorização do Bispo, o qual pode, maximamente,
proibir a forma pública ou o lugar onde estas implorações são feitas.
A finalidade
destas orações é a mesmo que aqueles do exorcismo, quer dizer, repelir
Satanás; mas enquanto que o exorcismo é uma oração oficial e pública feita
no nome da Igreja — por isso mesmo ela é intrinsecamente mais eficaz — a
oração de libertação continua sendo uma oração privada que, em alguns casos
pode dar grandes resultados.
Sabe-se que no
tempo de Santa Catarina [de Sena], acontecia que casos difíceis de possessão
lhe fossem apresentados; Catarina, que não era sacerdote, mas que era Santa,
conseguia libertá-los. O mesmo aconteceu com S. Francisco, S. Leopoldo
Mandic e muitos outros Santos que, mesmo não sendo exorcistas, libertaram
numerosos possessos. Em regra geral, o poder de repelir os demónios depende
da fé e da oração.
Gabriel Amorth,
sacerdote, exorcista |