É época de
Carnaval e por isso mesmo época de grandes pecados e de grandes desvaires pela
parte dos pecadores. Jesus pede à Alexandrina para velar sobre os seus sacrários
de dia e de noite, de resistir mesmo ao sono.
Mas antes de lhe
pedir este sacrifício, mostra-lhe de novo os Anjos que em arcos a sobrevoam...
Mas alguém não
está contente com estas mostras de amor e, desde que lhe é possível intervém,
procurando semear a cizânia, esse alguém é o ri da mentira, o diabo. Não quer
que a Alexandrina tenha sobre ela nem medalhas nem crucifixos nem outras imagens
de piedade, o que ele por escárnio chama “benzilhices”.
Mas, as suas
manhas de nada servirão : Alexandrina guardará sempre com ela as medalhas que
traz ao peito, assim como o crucifixo e outras imagens de piedade pelas quais
tem grande estima e devoção.
Mas ela confessa
que se vê “consumida com este maldito. Em tudo lhe põe obstáculos e
dificuldades.”

* * * * *
« Balasar, 8 de Março de 1935
Viva Jesus !,
Meu P.
Tive pena de não
poder escrever ontem como era meu costume ; mas não pôde ser. Mas Nosso Senhor
mo aceitaria como sacrifício porque bem sabia que era essa a minha vontade.
No dia 2, poucos
momentos depois da Sagrada Comunhão, falava-me Nosso Senhor :
— Escuta minha
filha, não podias escolher melhor. Não podias ser mais feliz na escolha. Quem me
podia honrar melhor, amar e dar graças do que minha Mãe Santíssima, os meus
anjos e toda a corte ! Olha-os ! É o Céu sobre ti.
E eu vi então as
carreirinhas de arcos sobre mim : naqueles arcos tantas, tantas cabecinhas ! Mas
não as divisava tão bem como daquela vez que já falei a Vossa Reverência. E
dizia-me mais Nosso Senhor :
— Minha filha,
venho-te dizer, principia já desde hoje a vigiar os meus sacrários de dia e de
noite ; resiste ao sono, faz violência de ti mesmo nestes dias de Carnaval. Oh !
com que crimes eu vou ser ofendido ! Não é nada a reparação que me fazem para os
crimes que Eu recebo ! Pede-me constantemente pelos infelizes pecadores : Mesmo
nas mais pequeninas coisas podes obter perdão para eles.
Voltei então a ver
muitas cabecinhas e no meio via umas coisas tão vastas, tão vastas ! Mas não
sabia o que era. E disse-me Nosso Senhor :
— Aquela massa
que tu vês são as almas dos bem-aventurados.
E disse-me o meu
Jesus que mandasse dizer a Vossa Reverência tudo isto ; e que lhe dissesse que
tinha sido muito beneficiada do meu Jesus mas que ainda havia de receber muitos,
muitos grandes benefícios. E então de novo voltei a ver não sei explicar o quê.
Era uma altura tão grande, tão grande ! E pelos lados acima e abaixo tantos
anjinhos só com uma cabecinha e as asinhas! Oh ! meu Jesus, eles não tinham
conta. E dizia-me Nosso Senhor :
— Como o paraíso
é belo ! Hás-de dizer que o Céu é muito lindo.
Que união tão firme
eu sentia com Nosso Senhor. Que paz tão grande ! Parecia-me que não era deste
mundo. Um calor abrasava-me tanto, e uma força interior que me apertava tanto e
Nosso Senhor chamou-me o seu amor. No dia 4, logo depois da Sagrada Comunhão
falava-me Nosso Senhor:
— Anda minha filha,
escuta : Anda pedir-me pelos pecadores. São tantos, tantos os que nestes dias
caiem no inferno ! De tantos milhares de almas que vêm para a minha presença,
tão poucos para a minha presença tão poucos para mim para gozarem da minha
glória ! Como Eu sou ofendido ! Como é renovada toda a minha paixão ! Quantas
coroas de espinhos ! Quantos cravos, quantas lanças e quantas cruzes !
Prostra-te diante dos meus sacrários, vive lá constantemente a implorar-me
perdão para os pecadores. Não penses neste mundo, que não és dele. O amor que te
tenho levou-me a criar-te para coisas mais sublimes.
Sentia-me muito
acariciada por Nosso Senhor, uma força interior que me apertava tanto, um forte
calor que me abrasava tanto e parecia-me que era beijada. E não sei o que era
que me fazia inclinar a cabeça muito, muito sobre o coração. E disse-me Nosso
Senhor :
— Os meus anjos.
Eram tantos,
tantos ! Via outra coisa, mas não sabia o que era. Disse-me Nosso Senhor que era
o trono da Santíssima Trindade e já mais vezes to tenho mostrado. E certo é que
já várias vezes, mesmo sem ser na ocasião em que Nosso Senhor me fala, me
parecia que via um altar tão lindo, tão lindo! Lá num sítio via reluzir uma
coisa branca e disse-me Nosso Senhor que eram as almas virgens e que estavam
muito perto dele.
Era sobre coisas
que tenho visto que hoje tinha prometido explicar o melhor que me fosse
possível ; mas estou tão cansada ! Não pode ser hoje. Oh ! como estou doente !
Não posso terminar
sem contar a Vossa Reverência o que me diz o demónio. Quer que eu tire toda a
benzilhice que eu tenho ao peito e na mão que é meu crucifixo, que poucos
instantes estou sem ele tanto de dia como de noite. Diz-me ele que me quer
segredar, mas com isto que não porque o odeia.
— Anda falar
comigo. Reserva um quarto de hora para mim e com isso ficarás agradada.
Vejo-me consumida
com este maldito. Em tudo me põe obstáculos e dificuldades.
Eu cá vou
continuando alegre e satisfeita com a missão que Nosso Senhor tanto me tem
recomendado. E nunca deixarei de pedir ao meu bom Jesus pelo meu paizinho
espiritual porque, depois de Nosso Senhor, é a quem mais devo. Por caridade, não
se esqueça de pedir por mim, sim ? Lembranças da minha mãe e da Deolinda e da
Senhora Dª Sãozinha. Peço-lhe mais uma caridade: de pedir por ela que anda
bastante fraca, dizem que é mais a excitação de nervos do que outra coisa. Mas,
se não melhorar pode ser bastante para não levar as meninas a exame e com isso
muito se aflige. Tenho tanta pena dela ! É tão minha amiga ! Se não fosse ela
não poderia escrever a Vossa Reverência, tão vastas vezes. Abençoe-me por amor
de Nosso Senhor.
Alexandrina »
|