25 de
Janeiro de 1945
Deixaria o sol e a luz do dia de existirem no mundo? Parece-me que a
noite mais tormentosa e escura o invadiu todo. Não há luz, não há
alegria, não há vida. Morri eu e sinto que morreram todos os que me
são queridos. Tive o meu médico junto de mim, parecia-me que não o
via, era como um cadáver ao pé doutro. Ele, como sempre, na sua
bondade e santidade, procurou levantar-me do meu desfalecimento,
infundir-me coragem e confiança.
– Ó meu
Deus, que indiferença! O que ele dizia parecia não ser para mim.
Tinha até medo dele, muito medo. Jesus, tirais-me tudo, dai-me o
Vosso divino Amor em troca desse tudo que me tirais. Dai-me um mundo
de almas e dai-me mundos e mundos do Vosso amor infinito. Quero
amar-Vos com esse amor e amar-Vos por esse mundo de almas que Vos
peço. Tenho sede, Jesus, tenho sede, sede que me abrasa e consome,
sede que aqui na terra nunca mais pode ser saciada. Tenho sede de
amar-Vos e ver-Vos amado por esse mundo de almas que Vos peço. Tenho
sede de sofrer, sofrer a mais não poder, para conquistar e salvar
para Vós esse mundo.
– Ó
mundo, ó mundo, sem querer pertencer-te, sem querer amar-te, amo-te
loucamente, quero-te a todo o custo, não posso deixar-te, ó mundo
querido, sem ver-te salvo, inteiramente salvo. Estas ânsias, estes
desejos não me pertencem, não nascem de mim; eu sou morte, só morte.
Sejam de quem forem, pertençam a quem pertencerem, são para Jesus,
são para O consolar, são para O amar.
– Ligai, meu Jesus, o meu coração ao Vosso, que nada haja que nos
possa separar. Ligai também a Vós os corações do mundo inteiro; não
quero que haja outra coisa nesta pobre humanidade a não ser amor,
amor puro ao Vosso coração divino. Quero que esta vida seja uma vida
só de louvor para Vós. Que mais posso desejar, Jesus, que mais posso
sofrer? Queria arrancar o meu coração e entregá-lo a arder nas
chamas mais fortes e do amor mais ardente e poder dizer-Vos: este é
o amor de toda a humanidade, este é o amor de todos os filhos
Vossos. Amor, Amor, meu Amor, quero dizer-Vos tudo pelo mundo e por
ele sofrer tudo sem excluir ninguém. É verdade, meu Jesus, isto que
Vos digo, são sinceras as minhas palavras, não é intrujice minha,
por graça Vossa não sei intrujar. Quando, nestes dias, Vos oferecia
as minhas dores quase insuportáveis, os ardores da febre e
frequentes vezes me oferecia como vítima, sem eu querer, quantas
vezes me vinha ao pensamento: não é intrujice, Jesus, é a verdade
para a minha oferta, e todos os sofrimentos os suporto por Vosso
amor e pelas almas.
Que
amargura, que triste amargura esta frase causou à minha alma: tudo
sem uma intrujice. Nosso Senhor não tem permitido, nestes dias de
sofrimento indizível, que eu seja atacada pelo demónio. Só uma vez
ou outra ele lá vem com as suas falsas palavras:
– Não é
verdade que pecas quando tu queres? Agora que a doença te aflige
mais não queres o gozo, não queres o prazer.
Cobrindo-me de insultos, retira-se.
– Ó meu
Deus, que mar de sofrimento à minha frente! Que triste quinta-feira!
Quanta falsidade me preparam!
É já
noite; sinto-me numa grande reunião, num convívio de grande
intimidade, as conversas são animadoras. Dois quadros tão diferentes
se apresentam na minha alma: uma traição sem igual e um amor sem
igual. Um amor, uma doçura, uma ternura sobre essa traição que não
há corações, não há lágrimas que o possam explicar. Quantos convites
cheios de doçura a essa traição. O traidor resiste, a nada se rende,
não se sente bem ao pé do cordeirinho, vítima inocente. Não sei
dizer as bondades e delicadezas de Jesus. Queria que a minha alma
fosse um livro onde todos pudessem aprender as bondades, ternuras e
o amor de Jesus. |