3 de Março,
primeiro sábado
Nesta noite, não
sei as horas, apareceu-me o demónio vestido de sacerdote, com batina
até aos pés. Era grande, muito grande, gordo – parecia um monstro.
Atravessava diante de mim, mas não me fez outra coisa a não ser
fazer-me sentir como se estivesse o fogo pegado na minha cama;
parecia-me as labaredas estarem alastradas debaixo de mim. Fazia-me
estremecer de medo.

Quero o que
Jesus quiser, mas, se houvesse a minha vontade, preferia mil vezes
isto do que quando ele usa de outras manhas. Sinto todo o meu corpo
dilacerado e em sangue, os espinhos penetram-me a alma, o coração, o
corpo e todo o ser. Não posso abrir nem fechar meus olhos sem
espinhos; não posso pensar sem espinhos, não posso mover-me sem
espinhos. O meu leito e o quarto, onde habito, são de espinhos e
tudo está banhado em sangue. Pobre do meu coração, sangra de dor! E
os meus lábios parecem estar fechados, não posso ter um queixume,
morro, morro abafada.
Assim, nesta dor
e amargura, fiz a minha preparação para a visita de Jesus ao meu
coração, nesta manhã. Recordar-me que era o primeiro sábado causava-me
tanta tristeza que me fazia pensar assim:
Meu Jesus, não
posso viver sem dúvidas. Que receio o meu! Vede as minhas
preocupações, compadecei-Vos delas! Enganar não quero; o Vosso
divino amor, as almas, isso, só isso me basta, meu Jesus.
Chegou a hora de
O receber. À entrada de Jesus no meu quarto, pareceu-me que me
cravaram uma punhalada no peito e foi ferir o coração. Tinha ânsias,
tantas ânsias de O receber, mas o medo que tinha dele, o horror ao
êxtase, não se explica.
Momentos depois
de Jesus baixar a mim, principiei a sentir a Sua divina presença e a
dilatar-se o coração. O peito parecia levantar-se, ao mesmo tempo
que o coração se dilatava. O meu amantíssimo Jesus principiou a
dizer-me:
- Quero, minha
filha, dilatar-te o coração, quero fazê-lo grande, grande como o meu
divino amor. Recebe-o com toda a abundância, envolve-o no mundo que
nele te depositei. Transforma-o no meu divino amor.
Dei-te e dou-te
o meu divino amor, entreguei-te o mundo, quero tudo numa só coisa:
quero amor, só amor. Resgatei-te com o meu sangue, és a nova
resgatadora da humanidade. Escolhi-te para comigo continuares a obra
mais bela, mais sublime, a obra do resgate, a salvação das almas.
És Cristo
crucificado, estás retratada em Mim. Ao criar-te, vi em ti tudo isto;
ao criar-te, logo te escolhi para a missão mais sagrada, mais
sublime, para o que há de mais caro e agradável aos meus olhos
divinos.
Estava a ouvir
Jesus e faltava-me aquela luz, aquela alegria e consolação que quase
sempre sentia. Disse-Lhe:
- Meu Jesus, de
cada vez tenho mais dúvidas e fico persuadida que estou enganada.
Que tristeza, que noite e receio de Vós!
- Não, minha
pomba branca angelical! Não, minha pura, minha bela e encanto dos
céus! Não te enganas, nunca o permiti nem permito. Foi isto mesmo
que ontem te pedi. Alegro-Me e consolo-Me com a alegria que tu
devias de Mim receber. Não Me negues tudo isto, não?
- Antes a morte
e o inferno do que entristecer-Vos, meu Jesus. Sou a Vossa vítima,
sou a Vossa escrava.
- Tu és o sol,
sol brilhante, sol doirado que rompe as nuvens para alumiar a terra.
Eis os espinhos que te ferem, continuamente cairão sobre ti; entre
eles viverás, entre eles morrerás.
Tu és o sol, tu
és a nuvem, nuvem negra, nuvem que assusta. O sol é para o mundo, a
nuvem és tu, é tua, é para ti.
Tu és o
aguaceiro que sai das nuvens e dás à terra chuva de amor, pérolas de
virtudes.
Estás, minha
filha, a percorrer os últimos caminhos; aproxima-se o teu fim neste
desterro; aproxima-se a vida eterna, a tua verdadeira vida. Espera-te
o céu com toda a alegria.
Diz, minha filha,
ao teu Paizinho que cai sempre sobre ele a abundância do meu amor.
Que lhe prometo todas as minhas graças em todas as suas obras.
Diz-lhe que são
estes os caminhos dos que me são queridos, os caminhos dos meus
eleitos. Ele vem junto de ti terminar a tua missão.
Prometi milagre,
se preciso fosse. Prometi castigo à Companhia por o fazerem sofrer e
se oporem à minha divina causa. Prometi e cumpri. Que pensem, que
examinem se sim ou não.
Diz ao teu
médico que desempenhe a sua missão, a missão que lhe dei: cuidar do
teu corpo, cuidar a sério. Cuidar de ti é cuidar de Mim, trabalhar
por ti é trabalhar por Mim, é operar comigo milagres.
Diz-lhe que não
deixe dormir e que dê a conhecer que nem ele nem todos os que cuidam
da minha divina causa dormem. Ela é minha, ela triunfa.
Mas é necessário
que ele diga umas palavrinhas humildes, mas que façam estremecer.
Grande é a sua
recompensa, grandes, muito grandes são as minhas divinas graças e o
meu amor sobre ele e todos os que lhe são caros.
Vem, minha Mãe,
vem dar a nossa vida, o nosso amor a esta filhinha. Vem a estas
trevas, vem suavizar esta dor.
Veio a Mãezinha,
tomou-me em seus braços e Ela mesma lançou os meus sobre os Seus
santíssimos ombros, abraçou-me, acariciou-me, cobriu-me de beijos,
ao mesmo tempo que dela sentia receber vida e conforto.
- Minha filha,
filha e esposa do meu Jesus, a tua dor é vida, a tua dor é amor.
Enche-te de Mim, enche-te de Jesus. Dá o que de Nós recebes aos que
amas e te amam. Receberão de Nós à medida que te amam e à medida que
anseiam o nosso amor. Dá-lhes as nossas riquezas no teu sorriso, nos
teus olhares, nos teus carinhos angélicos.
Coragem, coragem,
triunfas comigo e com o teu Jesus!
Estreitou-me
Jesus entre o Seu divino Coração e o da Mãezinha.
- Estás, minha
filha, numa prensa de amor.
Fiquei
confortada, com mais vida, mas mergulhada em dor e amargura. Horas
depois, voltei a sentir a Mãezinha tomar-me em seus braços e
suavizou a minha amargura. Animei-me, mas não saí da minha dor.
Fiquei entre espinhos, fiquei na cruz. |