Alexandrina de Balasar

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OS PRIMEIROS ANOS
DA “CRUZADA EUCARÍSTICA DAS CRIANÇAS”
(1930-1933)

  

José Ferreira

 

1 - A Póvoa de Varzim,
«a terra mais eucarística de Portugal»
 

No Congresso Eucarístico Diocesano de 1925, que teve lugar na Póvoa de Varzim, o Arcebispo Primaz de então, D. Manuel Vieira de Matos, referiu-se à Póvoa como «a terra mais eucarística de Portugal». E fora essa uma das razões que o levara a escolhê-la para que lá se realizasse o congresso.

Por sua vez, a Beata Alexandrina, ditou: «Foi na Póvoa de Varzim que eu fiz a minha primeira comunhão».

Foi também na Póvoa de Varzim que nasceu, em 1930, a pequena revista de grande sucesso Cruzada Eucarística das Crianças, tornando esta então vila um real centro de fulgurante irradiação eucarística, pois a Cruzada chegou às mais remotas paragens de Portugal, Ilhas Adjacentes e mesmo a territórios ultramarinos. Aí se manteve a sua direcção cerca de um ano, mas um ano decisivo. O P.e Pinho fora entretanto para Caminha (1931).

Observemos, antes de prosseguir, que a Cruzada Eucarística Infantil foi fundada pelo Papa XI em 1916 e que chegara a Portugal em 1921.

 

2 - O Padre Pinho na Póvoa

 

O P.e Pinho chega à Póvoa de Varzim no princípio de 1929; tinha então 35 anos. Era um homem viajado e sabedor, que já colaborara na Brotéria e que inclusive fundara uma revista (no Brasil). Não era ali conhecido, mas depressa se impôs sem dúvida pela sua palavra eloquente, pelo seu dinamismo apostólico e pela sua piedade.

Nesta placa que se vê logo que se entra na Matriz poveira, à direita, lê-se: «Memória do Congresso Eucarístico Diocesano realizado na Póvoa de Varzim em 2 a 5 de Julho de 1925, sendo Arcebispo Primaz D. Manuel Vieira de Matos e Pároco P.e Alexandrino Letuga».

A professora Angelina Ferreira toma-o logo nesse ano para seu director espiritual e a Deolinda no seguinte. A este respeito paga a pena ler este fragmento da primeira nota de Só por Amor!:

«Em 1930 Deolinda participou num retiro das Filhas de Maria, na Póvoa de Varzim, orientado pelo P.e Pinho. Ficou tão bem impressionada que se confessou a ele. O P.e Pinho, sempre que ia a pregar ou confessar a uma das paróquias vizinhas, avisava Deolinda, que aproveitava para se confessar».

Na Póvoa, a sede das Filhas de Maria era em frente à casa onde residia o P.e Pinho, isto é, na Capela da Senhora das Dores. Saber que o P.e Pinho ia pregar ou confessar às paróquias vizinhas de Balasar também é importante para conhecermos a sua actividade. Mas isto também permite alvitrar que quer a Deolinda quer a Alexandrina estariam a par das publicações jesuítas poveiras, os dois Mensageiros e agora a Cruzada, o que ajuda a perceber algumas importantes passagens da Autobiografia.

Na Póvoa, além dar apoio no Colégio do Sagrado Coração de Jesus (era lá que se faziam as bandeiras da Cruzada…) e na Igreja da mesma invocação, dirigiu os Filhos de Maria. A isto há que a acrescentar a colaboração nas revistas, a participação em congressos, a tradução de Harry Dee, que sai em 1932, mas que terá sido feita na Póvoa.

O endereço da Cruzada é o Largo das Dores, na Póvoa, até Dezembro de 1931; a partir de Janeiro de 1932, a administração está no largo de Santa Teresa, em Braga, «mas tudo quanto diga respeito à Redacção deve ser enviado ao R. P. Mariano Pinho, Colégio da Imaculada, Caminha». Em Outubro deste ano, a Redacção vai também para Braga. Provavelmente, o P.e Marino Pinho teria passado a leccionar no Instituto Nun’Álvares, nas Caldas da Saúde, o outrora famoso Colégio das Caldinhas. Iria acaso lá apenas alguns dias na semana, de comboio, já que esse meio de transporte ligava com alguma facilidade Braga a Santo Tirso.

Pela Cruzada, até ao final de 1933, sabemos que o P.e Pinho pregou aquando da erecção dos centros da Cruzada, ou em apoio à Cruzada, nas freguesas de Amorim, de Beiriz e de Balasar (Póvoa de Varzim), Apúlia (Esposende), Barqueiros, Barcelos, Areias S. Vicente e Minhotães (Barcelos), Gavião, Ruivães e Lemenhe (V.N. de Famalicão), Colégio de N.S. da Torre (Braga), Arcos (Vila do Conde), S. Pedro da Raimonda (Paços de Ferreira), Paços de Ferreira, S. Martinho de Milhundos e Penafiel (Penafiel), Toutosa (Marco de Canaveses), Britarães (Paredes), S. Pedro de Vale e S. Jorge (Arcos de Valdevez), Colégio Inglês (Évora, 5 de Abril 1932). Provavelmente terá pregado em muitos outros lugares de que não se registou notícia.

3 - A separata do Mensageiro de Junho de 1929

 

Em Junho de 1929, o P.e Pinho fez sair uma separata do Mensageiro com o nome da futura revista; parecia-se com ela, mas ainda não era a revista.

Uma fotografia excepcional: das muitas fotografias de grupos da Cruzada Eucarística que ilustram a Cruzada, só nesta, de Fevereiro de 1931, ao que cremos, aparece o P.e Pinho (à direita): é um homem ainda novo, cuja calvície é já notória.

Qual a razão de ser desta separata? Nela não se contém qualquer explicação, por isso só podemos alvitrar a partir da sua leitura. Seria um número zero ou experimental da revista ou seria antes um dossier sobre a Cruzada Eucarística das Crianças a disponibilizar a párocos, zeladores ou até a bispos, para ajudar na gestão ou fundação dos centros?

Talvez as duas coisas. Ela assemelha-se bastante à revista que vai começar a sair no Janeiro seguinte, mas contém um conjunto de informações muito úteis aos dirigentes da Cruzada. Assina-a Gualdim Pais, que era pseudónimo do P.e Pinho.

Este nome contém um programa de acção, de luta. A Cruzada, embora não usando as armas de antigamente, tinha de ser determinada, lutadora, ir até às últimas consequências na defesa e propagação da Fé, como estaria nos intentos do Gualdim Pais medieval. Mas este pseudónimo vai desaparecer brevemente das páginas da nova revista.

Na novel publicação vem um conjunto de textos programáticos, que definem um quadro de acção e estratégia. Comecemos por ouvir como ele define a Cruzada Eucarística das Crianças.

Notícia relativa ao P.e Mariano Pinho saída no jornal poveiro Ideia Nova de 18/11/1933.

 

O que é a Cruzada Eucarística das Crianças – a C.E.C. é «a secção infantil do Apostolado da Oração – uma piedosa união de meninos e meninas de todo o mundo católico, para alcançar a conversão das nações e a restauração cristã da sua pátria. Chama-se Cruzada, porque à semelhança dos guerreiros antigos, que foram ao Oriente combater os infiéis e libertar os Lugares Santos, a C.E.C. procura libertar as almas e as nações do jugo do demónio, para que nelas só reine Jesus Cristo. Eucarística – porque a sua grande arma de combate é a Comunhão frequente».

A Cruzada tem um objectivo cristão e pedagógico bem definido.

Vejamos agora os meios («as armas») que vai usar:

 

«Chama-se também Apostolado da Oração:

1.º porque a C.E.C. é o mesmo apostolado, ou Associação do Santíssimo Coração de Jesus, adaptado às crianças, regendo-se pelos estatutos dele;

2.º porque se propõe converter todas as crianças católicas noutros tantos apóstolos do Reino de Deus e da salvação das almas, empregando para isso como arma principal a Oração.

Para realizar o seu nobilíssimo ideal da restauração do mundo e de Portugal, a C.E.C. emprega três meios:

Capa da primeira Cruzada

1.º Oração – Jesus disse: «é preciso orar sempre»: «pedi e recebereis». Passou a sua vida terrena a fazer o bem e a orar pela salvação das almas e agora continua a orar sempre por nós no Céu e no sacrário.

2.º Pequenos sacrifícios – O sacrifício robustece a nossa vontade contra o mal. Vale como súplica à clemência de Deus e também como satisfação à Justiça Divina. O sacrifício de Jesus inocente desagravou a honra de Deus e redimiu a humanidade pecadora; sacrifico das crianças inocentes, unido ao de Jesus, ajudará a resgatar de novo mundo.

3.º Comunhão frequente – Sem ela não pode haver vida cristã: e como o espírito da C.E.C. é o espírito de reparação e desagravo em união com o Santíssimo Coração de Jesus, todos os seus membros e obrigam ao menos a uma comunhão mensal reparadora».

 

As armas de que dispõem as crianças são então: a oração, a reparação e a Comunhão. Bem eficazes portanto para convencer Quem gosta dos pequeninos, das criancinhas: «Deixai vir a Mim as criancinhas» é uma espécie de lema que se vai repetir nas sucessivas capas da revista. Igualmente se repete a imagem de Jesus a acolhê-las.

A seguir o P.e Pinho explica como se erige um centro da Cruzada, fala dos zeladores e zeladoras e dos próprios Cruzados, isto é, toma o pulso à organização.

Para completar, coloca a relação dos «Centros de Cruzada Eucarística de que temos recebido mais frequentes notícias» e que são:

Angra do Heroísmo – centro do Asilo da Infância Desvalida.

Grupo da C.E.C. da Igreja do Sagrado Coração de Jesus

Barcelos – centro da freguesia de Barcelinhos, Aldreu.

Braga – S. Vítor.

Esposende – S. Marinha de Forjães.

Póvoa de Varzim – centros da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, do Colégio do Sagrado Coração de Jesus, do Colégio B. João Bosco, de Amorim, de Nabais, da Estela e de Terroso.

Vila do Conde – centro do Colégio de S. José, Outeiro.

Viana – freguesia de Nossa Senhora de Monserrate; e Matriz, Tondela, Silvares.

Elvas

Funchal – Freguesia de S. Jorge.

Guarda – Vilar Formoso.

Viseu – centro da Sé, da freguesia de S. Josninho, de Figueiró da Granja.

 

Nesse ano de 1929, tinham sido inaugurados já dois centros da Cruzada … na Póvoa (Colégio do Sagrado Coração de Jesus e Basílica da mesma invocação) e um terceiro numa das suas freguesias rurais, Amorim. Começavam a ver-se frutos na vizinhança do novo Promotor. Aliás os dois centros poveiros são da maior importância. Lembre-se que à frente do novo Colégio está a justamente famosa Madre Sá.

Mas a revista virá a assinalar em breve a abertura de outros centros vizinhos, quer no concelho da Póvoa (Nabais, Terroso, Beiriz, Balasar…) quer no de Vila do Conde (Vila do Conde, Arcos, Tougues…).

4 - A revista

 

A Cruzada Eucarística das Crianças existia em Portugal, como já foi dito. Mas o seu Promotor percebeu que, para ela crescer, era preciso dotá-la dum órgão informativo próprio adequado à faixa etária dos Cruzados e que unisse as hostes.

Ouçamos como ele abre o número da Cruzada Eucarística das Crianças de Janeiro de 1930, oficialmente considerado o primeiro:

ANO NOVO. – O ano de 1929 foi um ano fecundo e rico de bênçãos para a Cruzada Eucarística em Portugal: multiplicaram-se durante ele os centros e a actividade dos Cruzados; as suas forças, que ainda há pouco eram apenas algumas energias dispersas, formam agora, ao findar o ano velho e ao surgir novo, um risonho esquadrão de milhares de braços. A Deus em primeiro lugar as mais fervorosas acções de graças, que dele desça sobre a terra tudo quanto é bom.

Capa Eucarística das Crianças. Esta ilustração, que já viera no número experimental de Junho, vai-se manter nos números subsequentes, apenas variando a tonalidade da cor.

 

 

Publicidade inserta no número de Fevereiro de 1930 da Cruzada Eucarística

Repare-se nas frases que marcámos a negrito: antes do P.e Pinho chegar reinava conformismo, apatia, agora a situação mudara muito, havia esperança, havia ousadia.

Logo a seguir explica ele a razão de ser da nova revista, que continua (e continuará durante mais algum tempo como separata do Mensageiro):

«O órgão da Cruzada Eucarística em Portugal tem sido até agora esta secção do Mensageiro: mas a experiência mostra que o Mensageiro é grande demais para as crianças e para as suas vice-zeladoras e os seus vice-zeladores, que também são crianças. Por isso, para lhes tornar mais acessível a leitura destas páginas, de que não devem prescindir, tirá-las-emos em separata daqui para o futuro, acomodando-as o mais possível à capacidade infantil. Isto impõe-nos, sobre os muitos encargos que nos incumbem, um novo esforço.

 Mas contamos com a boa vontade e generosidade dos centros, pela prosperidade dos quais gostosamente trabalhamos. Quem enviar a quantia de 1$50 por trimestre tem direito a receber mensalmente um exemplar dessa separata. Tudo o que vier a mais dessa quantia será uma esperança que assegurará ao nosso órgão nascente um futuro de vida próspera. Pedidos a Gualdim Pais, Largo das Dores, 89, Póvoa de Varzim».

 

Com que enche o P.e Pinho as páginas da sua revista?

Antes de mais, convém saber que ele não promete inovar muito relativamente ao que já era prática do Mensageiro e de facto não inova. Aos seus leitores bastou-lhes a certeza de terem alguém atento aos seus problemas, de se sentirem parte de um grupo muito grande e animado pelos mesmos objectivos e de possuírem uma revista que a todos apoiava.

A publicação traz literatura mais formativa, informação sobre os Cruzados em Portugal, conta algumas histórias, publica quase sempre um poema, a intenção do mês, uma ou outra anedota. Veja-se o resumo do número de Janeiro de 1930:

 

Ano Nono.

O órgão da Cruzada Eucarística em Portugal.

A conquista do Pedrito.

Intenção geral de Janeiro.

A Cruzada Eucarística em Portugal.

Os sacrifícios da Luisita.

Protector do mês – S. Francisco de Sales.

A força dos Cruzados.

Tesoiro do Coração de Jesus.

Amor aos sacrifícios.

Venha a nós o vosso Reino!

Oblação dos pequeninos.

 

5 – Bênçãos dos Bispos

 

A Cruzada Eucarística das Crianças rapidamente merece a aprovação e o reconhecidamente dos bispos. No número de Março de 1930 dão-lhe a sua bênção e aprovação o Arcebispo de Braga, com data de 30 de Janeiro, o Arcebispo-bispo de Vila Real e o Bispo do Porto com data de 29 de Janeiro; o Bispo de Bragança, com data de 6 de Fevereiro; os Bispos de Portalegre, de Viseu e da Guarda com data de 11 de Fevereiro; e ainda o Bispo de Beja. Mais tarde hão-de ser publicadas aprovações de Leiria, Mar 1932; Bragança, Fevereiro de 1933.

Veja-se a do Arcebispo D. Manuel Vieira de Matos:

«Entre os frutos mais apreciáveis das nossas Visitas pastorais avulta a Comunhão mensal, santo e salutar costume, que vão adquirindo todos ou quase todos os meninos das paróquias visitadas.

Está pois preparado o terreno para que nesta vasta Arquidiocese seja estabelecida a Cruzada Eucarística das Crianças: ficará assim a Comunhão mensal dos meninos bem organizada, com sólida garantia dum maior envolvimento e largo futuro.

Do provado zelo dos RR. Párocos esperamos que em breve se venha a estabelecer em todas as freguesias do Arcebispado esta grande obra, para o que concorrerá eficazmente a Cruzada Eucarística a da Crianças, que abençoamos e muito recomendamos.

Braga, 30 de Janeiro de 1930».

Párocos, sobretudo de pequenas cidades ou mesmo freguesias rurais, comunicam para a revista a criação dos seus grupos; o seu promotor intervém em congressos e outras manifestações religiosas de grande afluência, o que proporciona grande de visibilidade à sua actividade promocional.

 

6 - Eventos

 

Congresso Eucarístico de Viana

 

O P.e Pinho participou em 1929 no Congresso Eucarístico de Viana, onde leu uma comunicação sobre «Vocações Sacerdotais e Eucaristia». Na Cruzada só aparece uma referência a este congresso no número isolado de 1929. Lá se escreve que «Sua Ex.cia Rev.ma o Sr. Arcebispo de braga está tratando da grandiosa a empresa do Congresso Eucarístico de Viana que vai tomar as proporções de um grande congresso nacional». E mais adiante: «estamos convencidos que um dos meios mais práticos e eficazes de assegurar o fruto que se espera deste congresso seria precisamente esta obra da Cruzada Eucarística. Com efeito, o alvo para o qual vão confluir todas as atenções do congresso é este: - A cultura das vocações e a Eucaristia. Ora semear Hóstias é colher Sacerdotes – disse alguém com intuição. Dando à palavra hóstia os dois significados principais que ela tem para os Cruzados Eucarísticos, e supondo que o terreno, onde essa sementinha vai cair, está bem preparado; é a inocência, – podemos afoitamente afirmar: semear hóstias hoje é colher vocações amanhã». E o P.e Pinho prossegue na defesa da sua tese, citando inclusive um caso passado na Índia e prognosticando a melhoria da situação vocacional.

A preocupação com as vocações, nomeadamente para as fileiras jesuítas, está presente neste bilhete que o P.e Pinho enviou um dia, de Guimarães, à Alexandrina: «A Alexandrina tem obrigação de nos arranjar muitos jesuítas».

Por estas linhas, parece claro que o P.e Pinho terá integrado a questão da Cruzada Eucarística na sua comunicação, aproveitando a oportunidade para mostrar as suas virtualidades perante o vasto público do congresso.

 

Congresso Apostolado da Oração, em Braga

 

No número de Julho-Agosto de 1930, vem esta notícia sobre o Congresso Apostolado da Oração que tivera lugar em Braga:

«Foi um dos mais notáveis acontecimentos da vida católica em Portugal, o Congresso do Apostolado da Oração. Louvores ao Coração Divino que tanto ama os Portugueses e dos quais é e será amado cada vez mais, como Senhor e como Rei.

A Cruzada Eucarística tomou parte muito activa no Congresso não só pelos telegramas que de muitos centros foram enviados, mas sobretudo pelos numerosos grupos que se incorporaram na procissão eucarística e na peregrinação. Durante o Congresso foram afixados em todas as Igrejas e Instituições Católicas de Braga lindos e vistosos cartazes sobre a Cruzada Eucarística, para que de todos os Congressistas fosse conhecida esta obra tão simpática e a levassem bem gravada na memória e no coração para a instituírem em suas terras. É de esperar que sapos o Congresso será grande o impulso que vai tomar a Cruzada Eucarística. Deus o queira e nos conceda que em breve a vejamos estabelecida em todas as freguesias de Portugal».

Este promotor da Cruzada agarra as oportunidades, não as desperdiça. Terá ele falado? Certamente.

A Cruzada não publicou fotografias.

 

Jornada Eucarística na Póvoa

 

«No dia 29 de Setembro deste ano da graça de 1931, realizou-se Póvoa de Varzim, uma imponente Jornada Eucarística promovida Cruzada Eucarística das Crianças.

O que foi essa marcha triunfal, divinamente encantadora, não o pode dizer, numa simples nota, a pena vertiginosa de quem escreve estas linhas num pequeno intervalo de serviços obrigatórios.

Mas é bom que, ao menos, todos os Católicos de Portugal fiquem a saber que, no passado dia de S. Miguel, junto ao mar que a alma heróico dos Poveiros consagrou e ainda hoje glorifica, Jesus-Hóstia foi vibrantemente aclamado por cerca de 1300 criancinhas, orientadas pelo mesmo pensamento e atraídas à Póvoa pelo mesmo impulso forte de amor a Cristo-Rei.

Cada vez nos convencemos mais de que é necessário, mais do que nunca, ir ao encontro da Infância, para que Portugal se recristianize e seja salvo do embate formidando de paixões que lhe provocaram a maior crise moral que tem sofrido através dos séculos.

Um tríduo de práticas com comunhão geral, realizado no templo do Sagrado Coração de Jesus, preparou as criancinhas para essa lindíssima e entusiástica homenagem ao Rei Imortal dos séculos.

Aspecto da Procissão

Nessa magnifica Jornada, tomaram parte a secção infantil da Pia União das Filhas de Maria, crianças das catequeses, Apostolado da Oração, Cruzadas Eucarísticas da Póvoa, Fânzeres, Amorim, Navais, Estela, Terroso, Touguinhó, Tougues e Mosteiró, estas últimas do concelho de Vila do Conde, e a Confraria de N.a S.a de Lourdes. Fechava o préstito a banda da Oficina de S. José de Guimarães, seguida de muito povo.

Durante o percurso, as crianças entoavam lindos cânticos a Jesus-Hóstia e ao chegar ao Largo de S. Roque, que já estava cheio de povo, ávido de aclamar a Cristo-Rei, passou a custo o pálio para a capela de S. Tiago, onde era aguardado pela Mesa da confraria com o seu capelão, apresentando-se o templo vistosamente iluminado a luz eléctrica, entoando o coro lindos motetos na passagem de Jesus Sacramentado para a sacada da capela, onde foi dada a primeira bênção ao povo, depois do acto de reparação universal. Os vivas frenéticos, as aclamações fervorosas, o acenar dos lenços brancos, semelhando bandos de pombas esvoaçando para o seu Criador, as lágrimas deslizando suavemente pelas faces, a comoção invadindo tantos corações ansiosos do amor divino, tudo isto constitui uma magnifica apoteose prestada a Cristo-Rei, que mais uma vez viu como o povo de Varzim O aclama e saúda com afecto e amor.

Reconstituída a procissão, seguiu com cânticos e orações até ao Largo da Igreja Matriz, onde o povo se comprimia para prestar nova ovação ao Amigo Divino das criancinhas. O Rev. Domingos Gonçalves, de Guimarães, fez ali uma quente e fervorosa alocução, incitando as criancinhas das cruzadas e catequeses a receber dignamente e a amar fervorosamente o SS.mo Sacramento da Eucaristia e os pais, zeladores e catequistas, a trabalhar nesta cruzada santa e bendita, em que está a salvação de Portugal. As palavras do eloquente e apostólico orador de tal modo calaram no ânimo das pessoas presentes que, finda a segunda bênção, dada à porta da igreja, pelo Rev. Pároco, A. Leituga, todos aclamaram freneticamente o seu Rei e Senhor! Como era belo ver Jesus no meio dos seus amigos pequeninos tão vivamente saudado por eles! Como era consolador ver tanto povo vitoriar a Cristo-Rei!

Foi uma grande apoteose de fé e gratidão prestada ao Rei do Amor, que não deixará de escutar e atender às súplicas fervorosas e convictas do povo crente da Póvoa de Varzim, pela Igreja, pela Pátria, pelo Papa, pelo clero, pelo povo trabalhador e cristão. Que o Coração Eucarístico de Jesus abençoe Portugal e que todos os seus filhos O reconheçam, como seu único Rei e Senhor!

Viva Cristo-Rei! Viva o Rei do Amor! Viva o Pai dos poveirinhos!

 

Lembrança da Jornada Eucarística realizada
na Póvoa de Varzim a 29 de Setembro de 1931 – Dia de S. Miguel

 

Bendita a vossa jornada,

Cheia de ardor triunfal

E de alegria encantada,

Cruzados de Portugal!

 

Vós sóis custódias de amor

De um esplendor nunca visto,

Cavaleiros do Senhor,

Soldados de Jesus Cristo!

 

Revoada de mariposas,

Batalhão de criancinhas:

Tendes o encanto das rosas

E a graça das andorinhas.

 

Se a gente vos vê passar,

Sente que passa Jesus.

No fundo do vosso olhar,

Há infinitos de luz.

 

Rumor de almas em tropel?

— Deixá-lo! A hora é de esp'ranças!

A Espada de S. Miguel

Vos acompanha, crianças!

 

Avante! Passai! Rompei,

Em demanda do Graal!

Por Jesus e pela Grei,

Cruzados de Portugal!

 

Padre Moreira das Neves

 

Congresso Catequístico de Braga

                                               «A maior Parada Infantil que jamais se viu em Portugal»

 

Já lá vai o Congresso Catequístico, o Congresso das Criancinhas, o nosso Congresso, como lhe chamam os Cruzados Eucarísticos: e foi o que se esperava.

A Cruzada Eucarística tomou nele toda a parte que lhe competia e soube portar-se à altura: bem hajam os Cruzados! Estávamos para dizer que eram eles o melhor da festa, o seu mais belo adorno, as suas melhores flores, a sua melhor música.

Até as musas de Braga despertaram ao ver as criancinhas da Cruzada e cantaram assim:

 

Que bando de pombas brancas
Eu vejo a esvoaçar...
São tão belas como estrelas,
Como as espumas do mar!...

O perfume têm das rosas,
Dos Anjos o coração!
Deixai-as vir, são tão formosas!
Deixai-as vir em oração!

Oh, que ventura infinita!
Oh, que terníssimo amor!
Deixai-as vir, é tão bonita
A sua alma toda em flor!

Pioneiras da candura,
Têm na mão nosso destino.
Têm de Deus a formosura
No seu tempo de Menino!...

Ave, pois, castas pombinhas
Batei asas e voai...
Ide como as andorinhas,
Mas à Pátria regressai!

Elevai o pensamento
Aos confins da Imensidade
E trazei-o num momento
A salvar a humanidade!

Em vós a terra confia;
Sois vós a bendita esperança!
Levai-nos pois, dia a dia
Para o Porto da Bonança!

Que bando de pombas brancas
Eu vejo a esvoaçar!
São tão belas como estrelas,
Como as espumas do mar!

Tília da Assunção Vieira, na «Escola Moderna»

 

Um dos espectáculos mais imponentes foi a Comunhão das Crianças da Cruzada no dia 16. «Às primeiras horas da manhã — dizia o Diário do Minho — quando a luz do dia mal deixava perceber os contornos das coisas, a cidade foi invadida por batalhões de crianças, ostentando os seus distintivos da Cruzada Eucarística, que, como outros rios a lançarem-se no mar, caminhavam para a cerca do Paço Arquiepiscopal, à rua Santa Margarida, onde ia realizar-se a Missa e a Comunhão solene.

Pareceu-nos ver durante a realização do acto Portugal atento na sua contemplação e fiando dela a sua salvação e dias melhores de paz e de glória. Se um grande português, Afonso de Albuquerque, deveu a vida, segundo refere a história, à intercessão mediadora de uma criança perante Deus, fundadas esperanças há de que seja o propiciatório e impetratório das crianças de Portugal o meio de desviar de cima de nossas cabeças os rigores e a Justiça Divina é atrair os encantos e doçuras da sua Misericórdia… Que belo espectáculo o da Comunhão das Crianças na manhã de ontem na Quinta do Paço Arquiepiscopal! Bem o proclamou a palavra vibrante do venerando Bispo do Porto, Senhor D. António de Castro Meireles, que, encantado com o espectáculo, vibrou e fez vibrar os pequeninos e até os grandes que às crianças se viam associado e choravam durante o acto lágrimas de feliz alegria.

Durante largo tempo distribuíram os Prelados presentes a Comunhão aos pequeninos. Foi calculado em mais de dois mil o número dessas comunhões.

Nesse mesmo dia realizou-se no Teatro Circo o certame catequístico antes da sessão solene; nos camarotes assistem Sua Eminência, o Legado Pontifício e os Senhores Bispos. Sobe o pano do palco. Vêem-se as crianças das catequeses de Braga alinhadas com o uniforme da Cruzada Eucarística, acompanhadas dos respectivos párocos. Preside o Senhor Arcebispo Primaz. Sob a regência do R. P. Alaio, as crianças cantam o hino pontifício e a seguir o hino do Senhor Arcebispo. E começa o certame. O exame consta de catecismo e canto litúrgico. As provas são admiráveis, as respostas prontas e o cântico afinadíssimo. O exame de canto versa sobre as partes da Missa e sobre cânticos religiosos, como o Queremos Deus, Santos Anjos e Arcanjos, etc.

Terminado o certame, o Senhor Arcebispo declara-se satisfeito com o resultado e aprovadas com distinção as crianças. São elas ainda que cantam o Credo com que se abrem os trabalhos da sessão solene da tarde.

 

No dia 18 foi também deveras impressionante e agradabilíssima surpresa a perfeição com que centenas de criancinhas das Cruzadas Eucarísticas de Braga cantaram as vésperas solenes na Sé.

Mas onde mais mostraram o belo resultado dos esforços dos Mestres que durante longas semanas as vinham ensaiando, foi no Pontifical doo dia 19, também na Sé. Cantava a Missa o Senhor D. Domingos Maria Frutuoso, Bispo de Portalegre. No sólio assiste o Senhor Cardeal Piatriarca, Leagdo Pontifício. Nas bancadas vêem-se os outros Prelados. A nave central basílica está literalmente ocupada pelas crianças da Cruzada Eucarística, vestidas de branco com o distintivo da Cruzada a destacar-se no vermelho vivo. O povo segue atento as ceremónias e escuta enlevado o canto das diversas partes da Missa, que as crianças em número superior a 800 executam com gosto e afinação. O Pregador da Missa foi o Ex.mo e Rev.mo Senhor Arcebispo de Évora que principiou o seu eloquente sermão por estas palavras: «Que lindo quadro meus olhos contemplam deslumbrados e que doce emoção se apodera da minha alma ao contacto do espectáculo maravilhoso que aqui se me apresenta... Um bando enorme de criancinhas e crianças que adejam como pombas e enchem de seus cânticos o ambiente, dão encanto e graças à cerimónia de si tão imponente em que tomam parte o Cardeal Legado, o Núncio de Sua Santidade e os Prelados do meu País e a fina intelectualidade de Portugal».

A procissão eucarística foi tão extraordinariamente bela, que muitos declaram nunca terem visto coisa igual em Portugal; as Cruzadas Eucarísticas apresentaram-se em grande número, muito bem organizadas e cantando incessantemente lindos e afinados cânticos a Jesus Sacramentado.

A grandiosa e edificante peregrinação do dia 19 foi digno remate do Congresso. Tivemos a consolação de contar umas duas mil e quinhentas criancinhas que a pé firme e cheias de amor e entusiasmo subiram em marcha triunfal desde o Bom Jesus até ao Sameiro aonde chegaram depois das onze horas. E muitas vieram de longe: lá estava entre outras um grupo arrojado de Caíde que sem temer as distâncias veio a consagrar-se com seus irmãozinhos ao Coração de Jesus e de Maria.

Na esplanada do Sameiro colocaram-se as crianças em lugar reservado, dando ao acto da Missa campal uma perspectiva surpreendente.

Apesar da chuva miúda e impertinente o entusiasmo não arrefeceu; os cantos subiam para o céu em notas de júbilo e aquele formigueiro de crianças era um verdadeiro deslumbramento.

Foram elas, as cruzadas, que cantaram a parte musical da Santa Missa, foram elas — como afirmam os «Ecos do Sameiro» — que deram a nota, a chave de oiro do Congresso Catequístico Nacional... Fica esta peregrinação registada como uma das mais impressionantes que tem subido ao Santuário Senhora da Imaculada Conceição do Sameiro.

M.P.

 

7 - Extractos

 

Reúnem-se a seguir alguns textos publicados pelo P.e Pinho na Cruzada. São todos de colaboradores, alguns de colaboradores ocasionais. Muito frequente nas páginas da revista foi o P.e Moreira das Neves, às vezes com poemas produzidos a propósito de acontecimentos relativos à Cruzada Eucarística das Crianças.

 

BLANDINA

 

O P.e Pinho empenha-se na formação das crianças; a revista existe para elas. Mas verdadeiramente ela chega é aos zeladores, que são no geral jovens. Cedo há-de ter percebido que tinha que apontar nessa direcção, mesmo porque cedo começou a ensinar.

O que dum ponto de vista só humano é uma tragédia irreparável, pode, a um olhar cristão, ser uma vitória retumbante. Foi assim na morte de Jesus, nas dos mártires e na de todos aqueles que unem ao seu sofrimento de Cristo.

Por isso o P.e Pinho gosta de dar notícia de jovens ou crianças que abraçaram com entusiasmo os ideais da Cruzada, que sofreram e terminaram os seus dias como exemplo de dedicação à Igreja – como santos. Colocamos aqui a narrativa relativa à Blandina, mas há outras.

É interessante notar que trechos como este, que nem tem a assinatura do Promotor da Cruzada, quanto a certos pormenores, lembram de perto a Beata Alexandrina.

 

Beiriz. — 7-9-1931 - Faz precisamente hoje um ano que uma boa alma, uma alma privilegiada voou desta terra para o Céu.

Diz-se que as almas que passam pelo mundo sem que ele as contamine e perverta não lhe pertencem e portanto não são daqui, e é verdade.

Blandina Seara — era assim vulgarmente conhecida — era dessas almas: vivera na terra, mas que à terra não pertencia.

Ainda não tinha completado os seus vinte e dois anos — nascera a 27 de Setembro de 1908 — e já contava no seu activo espiritual grande cópia de merecimentos. Foi um exemplo vivo para todos nós que muitas vezes nos queixamos de que não temos tempo ou não podemos cuidar a sério da nossa e da santificação alheia. Ela, precisamente quando se sentiu minada pela terrível doença que a vitimou, foi quando mais trabalhou e mais fecundo fez o seu apostolado.

Faz-se Catequista; torna-se cooperadora activa na organização da Cruzada Eucarística das Crianças, acompanhando todos os trabalhos, parecendo até que da sua própria doença tirou novas forças.

Infelizmente para nós que não para ela, a doença agrava-se: como pobrezinha, recolhe ao Hospital da Póvoa, mas o seu apostolado continua. A breve trecho a simpatia dos companheiros da desgraça, se desgraça se pode chamar à doença, cerca-a e principia logo a fazer bem. O odor da virtude espalha-se em redor e muitos que suportavam a sua doença como fardo pesado principiam, a exemplo dela, a levá-la com mais paciência e resignação cristã, sofrendo por Jesus e para Jesus.

E não se limitou a dar o exemplo de resignação no sofrimento e a fazer frutificar o seu exemplo: obtém verdadeiras conversões. Alguns – nos Hospitais encontra-se de tudo — viviam afastados dos sacramentos e, não obstante a doença com que o Pai das misericórdias os havia ferido, recusavam reconciliar-se com Deus. A hora ainda não tinha chegado, mas ao contacto com aquela alma cândida, deixam-se vencer, imploram perdão e recebem com as melhores disposições os sacramentos da Igreja. Alma bendita! Alma sagrada que no cadinho do sofrimento se ia purificando, concorrendo amplamente para a santificação dos outros.

Continuando a doença a fazer progressos, e convencida que em breve teria terminado os seus dias, pede para voltar para a casinha da sua família: quer morrer em Beiriz. Tinha sido a edificação dos que cercavam o seu catre no hospital e quer também ser vítima de expiação pelos pecadores da sua terra. Quer que o sacrifício que ela leva com a maior resignação e alegria, sirva, para atrair bênçãos sobre as criancinhas da C. E. C. que tanto ama e por quem tanto trabalhou. Os seus últimos momentos foram duma alma santa, sacrificada e crucificada na Cruz de Cristo. Mas sempre alegre, sempre sorridente! O seu leito era de dolorosa agonia e parecia de rosas. Quando alguém lhe dirigia palavras de conforto, nunca faltava o sorriso cândido o sinal de agradecimento. E confortada mais uma vez com o pão dos justos que miúdo recebeu sempre no percurso de toda a doença entrega a sua alma a Deus, deixando-nos a todos na dor de a perdermos.

Era uma companheira que se perdia; era uma irmã a quem todos amavam, e que deixava os seus irmãos entregues à luta ainda, mas a quem legava o mais belo exemplo e a quem prometera a melhor protecção junto do trono de Deus.

A prova de quanto era estimada teve-a no seu enterro.

Não obstante ser pobre, e de família pobre, em volta do seu ataúde junta-se, toda a freguesia prestando-lhe assim a homenagem mais sentida e sincera que já mais se tinha visto em casos semelhantes.

Blandina foi entregue à sepultura precisamente no dia da Natividade da Senhora. Foi cantar com sua Mãe do Céu as glórias do seu triunfo na terra. Aceita, companheira, este preito do meu respeito e admiração.

Um Zelador da Cruzada Eucarística, 10-1931

 

CRUZADA EUCARISTICA DAS CRIANÇAS EM BALASAR

 

A Cruzada Eucarística das Crianças foi instalada em Balasar já no tempo em que o seu promotor dirigia a Beata Alexandrina, mas só alguns meses depois de ele iniciar o trabalho. De reparar que alguns nomes que se citam (P.e Leopoldino, Sãozinha, Deolinda, Maria Machado…) aparecem na biografia da Alexandrina.

 

C. E. C. BALASAR (Póvoa de Varzim)

Balasar — Na importante freguesia de Santa Eulália de Balasar, concelho da Póvoa de Varzim, arquidiocese de Braga, há pouco tempo pastoreada pelo novo pároco Rev. Leopoldino Rodrigues Mateus, acaba ser fundado um novo centro da Cruzada Eucarística. É um centro prometedor, porque em poucos dias apresentaram-se 70 crianças, de ambos os sexos, devidamente uniformizadas e, o que melhor é, convenientemente preparadas pelo seu novo pároco e por uma comissão de zeladoras que muito e eficazmente trabalharam na organização de tão santa obra em que a Igreja Católica tem a mais fundada esperança do rejuvenescimento da mocidade cristã.

Dentre as zeladoras não podemos deixar de destacar as Sr.as D. Maria da Conceição Leite Reis Proença, D. Teresa Ferreira Matias, D. Maria Machado e D. Deolinda Maria da Costa, que muito se esmeraram na instrução religiosa dos candidatos, ensino dos cânticos, confecção de vestidos e exercícios práticos. Publicando os seus nomes não temos em vista fomentar vaidades nem estimular outras pessoas piedosas que muito podendo trabalhar na organização e desenvolvimento de uma obra tão salutar para a santificação e salvação das almas, se prendessem talvez numa espécie de egoísmo muito para estranhar, cuidando só da sua santificação e esquecendo o próximo onde há tantas necessidades a remediar, tanto bem a fazer, tantas almas a apostolizar.

Entendem muitas criaturas, aliás de grande piedade, que só exercem o apostolado os missionários que abandonam a sua pátria, deixam o seu lar, separam-se das famílias, para ir levar a luz do Evangelho ao povo selvagem das regiões inóspitas do nosso vasto império colonial. Como se enganam! Quantas vezes, no nosso próprio lar, na nossa vizinhança, na nossa freguesia temos necessidade imperiosa de exercer o apostolado, chamando ao cumpri­mento do dever tantas almas dele transviadas pelas paixões ou pelas más companhias, resguardar a juventude de tantos lugares onde aprendem as lições dos vícios e das iniquidades, arregimentar as criancinhas, filhas de pais desvairados e indiferentes, encaminhando-as para o templo santo, cátedra sagrada onde elas aprendem a amar a verdade, a praticar o bem e a ser amigas do Divino Jesus que as amou até ao sacrifício e que, por seu amor, não duvidou ficar dia e noite, no sacrário para ser o alimento das suas almas.

Eis o motivo porque não podemos deixar de louvar o procedimento das zeladoras de Balasar e apresentá-las como modelo a seguir por tantas pessoas piedosas que têm tempo e competência para trabalhar na salutar obra da Cruzada Eucarística!

Os novos cruzados de Balazar receberam as últimas instruções do director diocesano, Rev. Mariano Pinho, que explicou com muita clareza e unção — o fim desta obra e os meios a empregar para produzir salutares efeitos — oração, comunhão, reparação (sacrifício) e apostolado.

Com tão excelente preparação, não admira que as crianças se apresentassem tão galhardamente no dia da sua entrada e na sua igreja perante o santo altar, na presença dos seus pais, vizinhos e conhecidos, se alistassem nesta milícia cristã, fazendo a promessa solene de ser bons cruzados.

Como isto é edificante e comovedor!

Aqueles novos soldados de Cristo receberam-No sacramentalmente, com todo o respeito e piedade, acercaram-se do lábaro santo (bandeira), que prometeram honrar, e atestaram ao povo da freguesia a sua disposição de trabalhar na grandiosa obra de santificação própria e regeneração do próximo! É nesta obra do Apostolado da Oração Infantil que o novo pároco tem a mais fundada esperança de preservar os seus pequeninos fregueses de tantos vícios e erros que pululam no meio da sociedade corrompida e corruptora, encaminhando-os pela estrada do dever para a santificação das suas almas — quiçá o íman de atrair sobre eles e sobre as suas famílias as bênçãos do Divino Amigo das criancinhas.

Oxalá que todos os pastores de almas, compenetrando-se desta grande verdade, fundem nas suas paróquias esta obra tão prestimosa e salutar – base fundamental da regeneração cristã do rebanho que lhes foi confiado. Os novos cruzados acompanharam, de tarde, a procissão eucarística, entoando cânticos e louvando Aquele que é a Ressurreição e a Vida. Foi um dia de triunfo para Jesus-Hóstia, conduzido nas mãos do sacerdote, por entre alas compactas de povo da freguesia de Balasar e das circunvizinhas, que se uniu aos pequeninos nos seus cânticos e hossanas ao Redentor do mundo!

Que o bom Jesus Sacramentado abençoe os novos cruzados, dando-lhes a paz e alegria e anime o novo pároco e seus valiosos auxiliares no prosseguimento desta santa obra, são os votos mais ardentes de uma testemunha da fundação deste novo centro de piedade cristã! M (1933)

 

DOIS POEMAS

 

Qualquer dos poemas seguintes tem uma qualidade que não deixa dúvidas. Muito bela a imitação do Cântico do Sol de S. Francisco, pelo P.e Moreira das Neves. Original também o poema mariano de Francisco Palha.

 

O NOSSO CÂNTICO DO SOL

 

Altíssimo, potente e bom Senhor!

A Ti pertence toda a graça imensa,

A Ti pertencem bênçãos e louvor.

 

Louvado sejas por quem ama e pensa!

Por todas as humildes criaturas

Que esplendem luz ou choram treva densa!

 

Pelo irmão Sol, candeia das alturas,

Que afasta a noite, abrindo a aurora em rosa,

E faz crescer as açucenas puras.

 

Pela irmã Lua, a cismadora esposa

Do Cântico dos Cânticos dos Céus,

Vestida de alva prata a mais formosa.

 

Pelas estrelas, vivos lumaréus,

Que nossos olhos fitam, evocando

O  Teu poder, o Teu amor, ó Deus.

 

Louvado sejas pelo vento brando,

Pela nuvem, pelo tempo e pelo ar

Com que nos sustentamos, respirando.

 

Pela água dos vergéis, sempre a cantar

Uma canção baixinho que, resume

Os bramidos das ondas do alto-mar.

 

Louvado sejas Tu, Senhor, p'lo lume,

Símbolo das virtudes verdadeiras

Que ardem, nas almas, e lhes dão perfume.

 

P'la terra, mãe fecunda entre as primeiras,

Que produz as violetas dos caminhos

E a lenha preciosa das lareiras.

 

Pelas ervas, romãs, e flor dos linhos!

P'lo coração dos que, por Teu amor,

Andam de rastos, a calcar espinhos.

 

Louvado sejas ainda e mais, Senhor,

Por nossas vozes breves e serenas,

Mas cheias de ternura e de candor.

 

Somos as tuas brancas açucenas.

De Ti nos vem a força p'ra lutar,

Com audácia de heróis, sobre as arenas...

 

Tombam rosas do céu... Alvor de luar.

Poisam pombas nas torres das igrejas.

Erguem-se as nossas almas para rezar.

 

Hoje e sempre, Senhor, louvado sejas!

 

P.e Moreira das Neves, 03/1933

 

AVE MARIA!

 

No sino da freguesia,

Três badaladas ouvi;

Sobre a terra, húmida e fria,

De joelhos, mesmo aqui,

Oremos, que é findo o dia,

Ave Maria!

 

Descendo da serrania,

Já o pastor ao curral

Os fartos rebanhos guia:

De abundância, ao de hoje igual,

Dá-lhe amanhã outro dia,

Virgem Maria!

 

A mãe, que o filho cria,

Já no berço o vai deitar

Um sono tranquilo envia

Sobre o seu tecto pousar

Até ao romper do dia,

Virgem Maria!

 

Não deixeis a ventania

As negras asas abrir.

Do perigo o nauta desvia,

Dá-lhe uma estrela a luzir

Como luz o sol do dia,

Virgem Maria!

 

Ao triste manda, alegria,

Ao que tem fome, dá pão,

A quem teu nome injuria

Dá sincera contrição

Antes do extremo dia,

Virgem Maria!

 

Ao moribundo abrevia

As horas do padecer

Livra-o de grande agonia;

Leva-o, depois de morrer,

Ao mundo do eterno dia,

Virgem Maria!

 

Francisco Palha, 5/1930

 

8 – Conclusões

 

Este rudimentar estudo do sentido da actividade do P.e Mariano Pinho à frente da Cruzada ao logo dos seus primeiros quatro anos de existência padece de deficiências; por exemplo, não nos foi possível consultar o Relatório da Cruzada Eucarística, não conhecemos a colaboração que entretanto deu para o Mensageiro do Sagrado Coração de Jesus nem a para o Mensageiro de Maria, que passou a dirigir (este último) desde 1932. Apesar de tudo, já permite avaliar a dinâmica que imprimiu quer à revista quer à Cruzada Eucarística das Crianças, que teve um crescimento galopante. Em 1934, atingiria provavelmente mais de 30.000 filiados. Este promotor da Cruzada revelou-se muito convincente.

Por outro lado, a sua colocação como director do Mensageiro de Maria em 1932 e em 1934 como director da Brotéria significa sem dúvida o reconhecimento do seu valor. Mas há que notar que isso também implicou trabalhar em áreas de cariz mais intelectual, que pouco tinham a ver com o carácter mais prático da sua acção em prol das crianças. Foi certamente bom ter deixado logo ao fim de dois anos a Brotéria: ele seria mais útil noutros campos.

Foi útil na direcção da Beata Alexandrina e nas diligências que desenvolveu para a Consagração do mundo ao Imaculado Coração de Maria e ainda tirou tempo para escrever a Carta Magna da Acção Católica.

A Cruzada (http://www.ppcj.pt/AO/cruza.htm), embora com uma orientação muito diferente da origem, continua um sucesso editorial e é um óptimo testemunho a favor do seu fundador.

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