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PONTOS DE
REFLEXÃO
PRIMEIRA
LEITURA Ml 3, 1-4
As leituras
da liturgia de hoje relacionam-se com a entrada do Senhor no Templo.
Malaquias, depois de haver censurado duramente os sacerdotes, porque
oferecem a Deus vítimas com defeito, depois de ter criticado todos os
que haviam desposado mulheres não hebreias ou quebrado o vínculo
conjugal, responde à pergunta crucial: «Onde está o Deus que faz
justiça?» (Ml
2,17) A esta pergunta responde o texto de hoje: Deus prepara a
Sua vinda «ao seu templo» (v. 1), para purificar o coração do povo e
renovar a sua Aliança com ele.
Em todas as
situações difíceis, o povo de Israel aguardava uma intervenção de Deus
que as resolvesse, marcada por um castigo. Era o que esperavam os
contemporâneos de Malaquias, e também o que esperam muitos cristãos dos
nossos dias. O Senhor, é verdade, não fica indiferente ao mal e não o
deixa sem castigo, mas o Seu com-portamento é o de uma espera confiante:
«Porventura sentirei prazer com a morte do injusto? [...] O que Eu quero
é que ele se converta dos seus maus caminhos, e viva.» (Ez 18,23) Também
nós devemos esperar os tempos de Deus. Para levar avante o Seu projecto,
Deus enviará um Seu «mensageiro» para preparar a Sua vinda (cf. v. la;
cf. Is 40,3). Este «entrará no seu
templo» (v. 1b) para purificar «os filhos de Levi» (v. 3), duramente
censurados pelo profeta (cf.
Ml 1,6-2,9). O Novo
Testamento irá identificar esta figura do precursor com João Baptista
(cf. Mt 11,14; Mc 1,2). A
entrada de Jesus no Templo preanuncia a grande purificação redentora que
Ele realizará em favor de todos com a Sua morte no Calvário.
SEGUNDA
LEITURA
Hb
2,14-18
O texto
apresenta o «ingresso» no mundo humano daquele que é o «Filho» de Deus
(cf. Hb 1,1). Ele é a
«irradiação da glória
do Pai»
e «a expressão de como Deus é em Si mesmo». Um ingresso
que comporta a humilhação da Cruz e a glória da ressurreição em vista da
nossa salvação. «Pela graça de Deus Ele experimentou a morte em favor de
todos.» (Hb
2,9) Para realizar esta obra de redenção, Cristo escolheu o
caminho da solidariedade com todos os homens, em favor dos quais se
tornou «Sumo Sacerdote», (v. 17)
Cristo quer
entrar no Templo da nossa pessoa e da nossa vida. O Sumo Sacerdote
hebreu, com os variados ritos que se realizavam na sua ordenação e os
trajes particulares que vestia (cf. Ex 28-29; Lv 8-10), acabava por
ficar separado dos homens. Jesus, pelo contrário, escolhe o caminho da
partilha e da solidariedade, enquanto quer ter connosco «em comum o
sangue e a carne» (v. 14), e porque Deus, em união com o seu Filho,
«quer conduzir para a glória um grande número de fi-lhos». (Cf. Hb
2,10)
Pelo facto
de sermos mortais, Jesus sujeita-Se à morte, morte redentora, com uma
dupla finalidade: a de derrotar o demónio, autor da morte; e a de nos
libertar do medo da morte, que tanto nos atormenta (w. 14b-15). E é
precisamente por ter tomado a natureza humana com todas as suas
consequências (excepto o pecado, que iria destruir a Sua solidariedade
connosco), incluindo a morte, que Jesus Se tornou «Sumo Sacerdote
misericordioso e fiel» e «expiação dos nossos pecados», (v. 17)
EVANGELHO
Lc
2,22-40
Depois do
nascimento de Jesus em Belém e o aceno à Sua circuncisão (v. 21), Lucas
descreve com uma certa minúcia a Apresentação de Jesus no Templo. Deste
modo (w. 22-24 e 39-40) coloca em relevo a diligência de Maria e de José
em cumprirem as prescrições da Lei. Mas para Lucas, como se deduz bem da
narração, este episódio de Jesus apresentado no Templo tem uma
importância particular: o evangelista vê-o já à luz do mistério da morte
e ressurreição de Cristo.
Nenhuma lei
hebraica requeria que o primogénito fosse apresentado no Templo, o que
no entanto aqui se realizou; exigia-se, isso sim, o seu resgate (cf. Ex
13,2.13), o que aqui voluntariamente falta.
Além disso,
todo a mulher hebreia, mãe de um varão, quarenta dias após o parto devia
submeter-se ao rito de purificação (cf. Lv 12,2-8). Lucas acena a este
rito mas não o descreve, porquanto utiliza para o conceito de
«purificação» uma palavra grega diferente da que é utilizada em Lv 12.
Concentra antes a sua atenção no Menino que é levado ao Templo «para O
apresentarem ao Senhor», (v. 22) O elemento externo que une os três é a
pobreza, indicada pela oferta de «um par de rolas ou duas pombinhas»,
própria das pessoas pobres (v. 24; cf. Lv 12,8).
Também a
nossa atenção deve concentrar-se em Jesus, que ilumina Maria, José e os
circunstantes; em Jesus que com a Sua pobreza quer enriquecer
espiritualmente cada um de nós (cf.
2Cor 8,9). «Portanto,
aproximemo-nos do trono da graça com plena confiança.»
(Hb 4,16)
Jesus
é «apresentado», isto é,
oferecido como sacrifício existencial a Deus, facto que deve repetir-se
com cada um de nós. «Irmãos [...] peço que
ofereçais (em grego, «apresentar», como em Lc 2,22) os vossos corpos
como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus.» (Rm
12,1) É o que, na celebração
eucarística, a Igreja pede a Deus:
que «também nós, de alma purificada, nos apresentemos diante d'Ele». (Oração Colecta). Como
Simeão, também nós sejamos alcançados pela acção do Espírito
Santo e assim descubramos a grandeza da Apresentação/oferta de
Jesus; tal como a profetisa Ana, nos tornemos
anunciadores do que
experimentámos. O Evangelho
de Lucas apresenta Simeão como o homem que
é movido pelo Espírito Santo. «Justo e piedoso», ele espera a
vinda do Messias (cf. v. 25); o
Espírito Santo, que estava nele,
fez-lhe compreender que haveria de
ver o Messias do Senhor (cf.
v. 26); o Espírito move-o a ir ao Templo (cf. v. 27), precisamente
no momento em que os pais de Jesus O apresentam. Por conseguinte, com
esta insistência sobre o Espírito Santo, mencionado três vezes,
Lucas quer antecipar na pequena comunidade de Simeão e de Ana, o que
acontecerá na Igreja nascente, sobre
a qual descerá a abundância do Espírito Santo. O que aconteceu
com Simeão e Ana, o que deu início à Igreja, repete-se connosco quando
participamos na celebração eucarística: a acção do Espírito Santo actua
sobre o pão e sobre o vinho, para que se tornem corpo e sangue de Jesus
Cristo; e sobre cada um de nós, para que nos tornemos em Cristo um só
corpo e um só espírito.
Mais
ainda, Lucas diz-nos que Simeão,
sempre sob a acção do Espírito, faz duas coisas: «recebe-O em seus
braços» (Lc 2,28)
e eleva a Deus o seu cântico de louvor (cf. 2,29-32). Deus, que
deu a Simeão a alegria de
«receber em seus braços a Cristo seu Filho» (oração depois da
Comunhão), deve ajudar cada um de nós a acolher dignamente Jesus em
todas as nossas comunhões sacramentais (cf. Jo 6,56). O cântico
sublime de Simeão começa dizendo que ele já teve o máximo na vida e que
agora já pode morrer em paz (cf. Lc 2,29). Cristo pode muito bem
preencher a vida inteira de uma pessoa! Depois Simeão celebra com
entusiasmo aquela criança «luz» para todos os povos pagãos; que é
«glória» suma para Israel, do qual o recém-nascido provém (Lc 2,32).
Também nós, sob a acção do mesmo
Espírito Santo, proclamamos Jesus salvador
universal, glória de Israel e luz dos povos. Tudo o que de
positivo cumprimos no dia-a-dia, coloquemo-lo sobre o altar e mediante
Cristo e unidos ao Espírito Santo dêmos a Deus toda a honra e toda a
glória.
A
profetisa Ana, que a Providência
quis presente no Templo
no momento da
Apresentação de Jesus, vive em profundidade
esse encontro e «fala do Menino
a todos os que esperavam a libertação
de Jerusalém». (Lc 2,38) Cada encontro com Jesus na Eucaristia
deve despertar em nós o espírito missionário.
Padre José
Granja,
Reitor da Basílica dos Congregados, Braga. |