A veneração e
o amor que a Beata Alexandrina tinha para com os sacerdotes é notória, portanto
bem conhecida de todos.
Desde muito
nova ― graças à educação altamente cristã recebida de sua mãe ― habituou-se a
respeitá-los
e a venerá-los como sendo a imagem visível de Cristo sobre a terra. Eis o que
ela escreveu na sua “Autobiografia”:
« Lembro-me que tinha muito respeito pelos sacerdotes. Quando estava sentada à
porta da rua, só ou com a minha irmã e primas, levantava-me sempre à sua
passagem, e eles correspondiam tirando o chapéu, se era de longe, ou dando-me a
bênção se passavam junto de mim. Observei algumas vezes que várias pessoas
reparavam nisto e eu gostava e até chegava a sentar-me propositadamente para ter
ocasião de me levantar no momento em que passavam por mim, só para ter o gosto
de mostrar a minha dedicação e respeito pelos ministros do Senhor ».

Alexandrina, o Padre Umberto e Deolinda
Com o tempo e
com o avançar da idade, estes sentimentos foram aumentando cada vez mais como o
afirmaram os sacerdotes que foram seus directores espirituais, assim como
aqueles sacerdotes que a visitavam.
Um destes
sacerdotes, o Padre Payère, da diocese de Versalhes, em França, que a visitou em
Dezembro de 1945, deixou dela este belo testemunho:
« Pareceu-me uma belíssima alma, completamente unida a Deus, uma hóstia pura,
silenciosa e alegre no seu sofrimento profundo que exigem os pecados do mundo,
em estreita união com Aquele que é por excelência o Cordeiro de Deus.
Alexandrina é também o cordeiro de Deus que expia pelos pecados do mundo ».
E mais
adiante diz ainda:
« O seu
olhar e o seu sorriso estão cheios de bondade, de simplicidade e de caridade
suave ; e portanto ela sofre muito ».
No momento em
que se compilam as cartas por ela escritas ao seu primeiro Director
espiritual ― o Padre Mariano Pinho, SJ ― pensei que seria bom ― para ilustrar
este humilde trabalho ― transcrever uma delas que tem justamente por objecto a
salvação de um sacerdote de Lisboa.
Este
sacerdote não levava boa vida... Mas leiamos a carta:
« Balasar,
17 se setembro de 1938
Viva
Jesus!
Meu Paizinho,
A minha
alma sofre, e sofre muito. Parece-me que não há luz que possa alumiar tal
escuridão. Perdi-me no mar; não tenho ninguém por mim: tudo me abandonou. Eu não
quero bem a pessoa nenhuma: é o que eu sinto. Ontem
queria pôr termo ao meu viver, custasse o que custasse. Deitar-me a afogar,
meter a cabeça debaixo do comboio, enfim, figurava-se-me que é insuportável o
meu viver. Queria escrever ao meu Paizinho mas estava tão desanimada e com tão
poucas forças para o fazer que nem sabia como resolver este caso. Porém hoje
vejo-me obrigada a fazê-lo. Para mais depressa chegar às mãos do meu Paizinho,
vou mandá-la a Gondifelos. Se ela voasse até aí!
Eu vou
dizer ao meu Paizinho o que se passou. Mas o nome só o digo no fim da carta,
escrito por mim.
Hoje o Sr.
Abade, antes de ir para Arcos para as confissões, trouxe-me Nosso Senhor. No fim
de o receber figurava-se-me que tinha a minha alma morta. Estava num abismo tão
medonho! Numas trevas tão intensas! Estava tão assustada, tinha medo de Nosso
Senhor. Estive assim assustadíssima um bom pedaço. A Deolinda, como de costume,
deu graças comigo. Nem sei o que ela rezava. Depois principiei a sentir paz, uma
luzinha a iluminar-me a alma e principiei a perder o medo. Ouvi que Nosso Senhor
me falava assim:
― Anda, minha pombinha
inocente, ao teu Amor, ao teu Jesus, ao teu esposo. Anda, não temas, não te
assustes. Este estado não é teu. És vítima. Se soubesses quanto sofro por ver
assim sofrer a minha espozinha! Mas olha: Trata-se da alma do Padre.... Viste
noutro dia aquela primeira alma que o demónio mais força fazia para arrastar?
Era a dele. As outras eram da tua freguesia. Chegou a hora da vingança. Não o
posso suportar mais. Que vida tão medonha, não nojenta: tão cheia de impureza.
Tanta Missa sacrílega. Não o posso suportar mais. Vou condená-lo ao inferno.
E eu
disse:
― Ó meu Jesus, se
tendes no meu corpo ou na minha alma alguma coisa que Vos possa servir para eu
lhe valer, não me poupeis a mim e poupai-o a ele às penas eternas. É uma alma,
meu Jesus. Eu sou a vossa vítima. Eu não quero que crime nenhum do mundo vá
ferir o Vosso santíssimo e amabilíssimo Coração.
― Ó louquinha de Jesus
e das almas, como te não posso negar nada, sofrê-lo-ei um mês. Sofrerás
horrivelmente. Manda vir o teu Paizinho, combinai o que haveis de fazer.
Conformo-me com tudo o que vós fizerdes. Convida-o por escrito à penitência. Não
temas, não te assustes, sou o teu Jesus.
E tomou-me
toda para si, fazendo-me breves carícias.
Meu Paizinho, que fazer a isto? Eu estou aflitíssima. O meu coração está agitado,
nem me deixa respirar. Estou cheínha de medo. O demónio parece que me quer
tragar. Diz-me com nomes feios que julgo dum inocente o que eu sou e o que o meu
Paizinho é.
Lembranças
da minha mãe e da Deolinda.
Abençoe a
pobre
Alexandrina.
(Depois,
por mão dela):
Ai, meu Paizinho, eu estou tão cheia de medo, tenha pena de mim. É o Senhor
Padre........... (O Padre Pinho riscou o nome) ».
*
* *
Para que este
sacerdote seja salvo, a Beata Alexandrina “sofreu horrivelmente”, como Jesus lhe
tinha dito, mas a vitória foi também extraordinária!
Quando o Padre Mariano Pinho recebeu esta carta que muito o interpelou, escreveu
para Lisboa a uma das suas numerosas dirigidas ― Superiora dum convento ― e
pediu-lhe que se informasse junto do Senhor Cardeal Patriarca se algum dos
sacerdotes da diocese de Lisboa lhe causava dissabores, sem todavia revelar o
nome que a Beata Alexandrina lhe tinha indicado.
Sublinhemos
que, Alexandrina habitando Balasar e nunca tendo ido a Lisboa, não podia
conhecer o tal sacerdote, e que este nunca veio a Balasar.
A resposta
veio breve e, coisa extraordinária, não só ela era afirmativa, mas o nome do
“desgarrado” era o mesmo que indicara a “doentinha de Balasar”. O Padre Pinho
deixou de duvidar e permitiu à Alexandrina de aceitar a proposta do Senhor, quer
dizer: “sofrer horrivelmente” para que a alma deste sacerdote não caísse no
inferno.
Mais tarde, a
boa notícia chegou:
O dito
sacerdote foi a Fátima ― vestido
civilmente ― participou
a um retiro espiritual e no fim deste pediu para se confessar. Depois de ter
pedido sinceramente perdão a Deus pelas suas faltas e de ter revelado a sua
verdadeira identidade, faleceu serenamente no Senhor.
A Beata
Alexandrina não tirou disso glória pessoal, claro está, mas sentiu a alegria de
ter sido o instrumento, nas mãos de Deus, para que tal milagre se produzisse.
Aqui fica
pois um exemplo concreto daquilo que na Igreja se chama a “comunhão dos santos”,
assim como a demonstração do valor impetratório da nossa querida Alexandrina.
Se durante
a sua vida mortal o Senhor lhe acordava tais dons, que será agora, agora que ela
vive na Mansão celeste junto do Esposo que ela tanto amou e ama agora mais
ainda?
Neste
momento tão crítico ― não
quero ser pessimista ― em
que a Igreja Católica sofre por falta de vocações sacerdotais e religiosas,
porquê não organizar uma “cadeia de orações” para pedir a Deus, por intermédio
da Beata Alexandrina o aumento das vocações sacerdotais e religiosas?
Não
esqueçamos que a Alexandrina “é o Canal por onde Jesus quer fazer passar as
suas graças” e todos, de um só coração rezemos nesse sentido, não esquecendo
a materna solicitude da Virgem Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe, que a “doentinha
de Balasar” tanto amava: a sua querida “Mãezinha”.
Convido
todos vós a lerem as “Cartas da Alexandrina ao Padre Mariano Pinho”, 1933 a
1937 ― as outras seguirão em breve ―, já em linha
neste e no outro Site:
Afonso Rocha
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