A devoção, o
carinho e o amor da Beata Alexandrina à Virgem Maria são conhecidos de todos. A
“Mãezinha”
do Céu foi sempre para ela, desde a mais tenra idade, um ponto de mira, uma
atracção irresistível, como ela mesma no-lo diz na sua “Autobiografia”:
« Se nesta
idade ― por volta dos 5
ou 6 anos ― manifestava os meus
defeitos, também mostrava o meu amor para com a Mãe do Céu, e lembra-me com que
entusiasmo cantava os versinhos a Nossa Senhora e até me recordo do primeiro
cântico que entoei na igreja, que foi “Virgem pura, tua ternura, etc.” ».
No mesmo
documento, um pouco mais adiante, ela escreveu ainda:
« Quando
me encontrava com umas primas que moravam distantes, cantava com elas pelos
caminhos a Ave-Maria ».
A quando da
sua estadia na Póvoa de Varzim, ela recorda:
« À medida
que ia crescendo, ia aumentando em mim o desejo da oração. Tudo queria aprender.
Ainda conservo as devoções que aprendi na minha infância, como: Lembrai-vos, ó
puríssima Virgem Maria, Ó Senhora minha, ó minha Mãe, o oferecimento das obras
do dia ― Ofereço-vos, ó meu Deus ―, a oração ao Anjo da Guarda, oração a S. José
e várias jaculatórias ».
Durante esse
mesmo período, diz ela que « fugia do convívio delas ― das meninas com
quem passeava ― e ia colher flores que desfolhava para fazer tapetes na
igreja de Nossa Senhora das Dores. Era em Maio e toda me comprazia de ver o
altar da Mãezinha adornado de rosas e cravos e de respirar o perfume dessas
flores ».
« Todos os
anos, no mês de Maio, fazia o mês da Mãezinha. Gostava muito de o fazer sozinha:
meditava, cantava, rezava e chorava algumas vezes ao mesmo tempo que pedia à Mãe
do Céu que me libertasse da grande tribulação que estava a passar ».
Neste mesmo
mês de Maio, enviava à “Mãezinha” cartas simples, mas recheadas desse amor,
desse carinho, dessa ternura que habitavam o seu humilde e puro coração.
Será
ainda ― a quando dos princípios da doença que a fixará ao leito para sempre ― à
Mãezinha do Céu ― a Nossa Senhora de Fátima ― que ela recorrerá para pedir a sua
cura: « Não deixei de pedir muito à Mãezinha para que intercedesse por mim
nas mesmas intenções ».
Não obtendo
esta, « compreendi que a vontade de Nosso Senhor era que estivesse doente.
Deixei de pedir a minha cura. No decorrer dos anos, estive várias vezes às
portas da morte; preparava-me com os últimos Sacramentos e esperava a hora da
morte resignada ».
Quando tinha
18 anos, viu-se em grande perigo, e uma vez mais, como ela nos conta, foi a
“Mãezinha” que veio em seu auxílio:
« Com os
meus dezoito anos ― conta
ela ainda ―, vi-me num perigo muito
grande, inesperadamente. Lembro-me que levava o meu tercinho na mão e que
apertei uma medalha da Nossa Senhora das Graças e, de repente, livrei-me do
perigo. Foi sem dúvida a Mãezinha do Céu a velar-me. Oh, como lhe estou
agradecida!... »
Quando
Alexandrina decidiu consagrar-se a Deus, foi uma vez mais a “Mãezinha” a
portadora desta consagração definitiva e solene, mesmo se feita na intimidade do
seu quarto.
« Ó
minha Mãezinha do Céu, eu tenho tanta, tanta confiança em Vós que não sei
explicar-vos o amor que Vos tenho. Ó minha Mãe, é muito, mas queria muito mais,
muito mais; só vós me podeis alcançar essa graça e também o amor ao Vosso e meu
querido Jesus. Ai, aumentai-mo muito, muito! Abrasai-me em chamas de puro amor!
Sim, sim, minha boa Mãezinha! ».
Um pouco mais
tarde — em 1935 —, como para recompensá-la deste amor filial à Mãe do Céu, será
à “doentinha de Balasar” que Jesus pedirá a Consagração do mundo ao Coração
Imaculado de Maria.
Foi também
numa festa Mariana ― em Setembro de 1934 ― que ela anunciou ao Padre Mariano
Pinho as “exigências” de Jesus para com ela: o anúncio da preparação à
crucifixão, como podemos verificar nesta carta que a Alexandrina escreveu ao seu
Director espiritual:
« Balasar,
8 de Setembro de 1934
Viva
Jesus!.
Senhor
Padre Pinho :
Cá estou
eu, no dia do aniversário de minha querida Mãezinha do Céu, a escrever a
Vª Revª. Não esperei para o dia 12, porque tenho muitas saudades; ainda está
muito fresco e também me parece necessário dizer-lhe alguma coisa daqui.
Que tal
foi a viagem para Lisboa? E não lhe fez mal a visita que me fez numa tarde de
tanta chuva?
Sei que
fez um sacrifício muito grande, mas penso que outras coisas lhe custaram mais do
que a chuva. Mas paciência, quanto maior é o sacrifício, maior será a recompensa
de Nosso Senhor; é esta a minha confiança.
Vou também fazer um grande sacrifício. Nosso Senhor bem o sabe e Vª Revª também
faz ideia quanto me custa; mas antes de o fazer, ofereci-o ao meu bom Jesus.
Quinta-feira, dia 6, o Senhor Abade veio trazer Nosso Senhor a uma doente, minha
vizinha, e ao mesmo tempo, trouxe também para mim. Depois de comungar, não sei
como fiquei, estava fria, parecia-me que não sabia dar as graças. Mas, louvado
seja, o meu bom Jesus não olhou para a minha indignidade nem para a minha
frieza; parecia-me ouvir dizer:
— Dá-me as tuas mãos,
quero-as cravar Comigo, dá-me a tua cabeça, quero-a coroar de espinhos, como me
fizeram a Mim, dá-me teu coração, quero-o trespassar com a lança, como me
trespassaram a Mim; consagra-me todo o teu corpo, oferece-te toda a Mim, quero
possuir-te por completo e fazer o que Me aprouver.
Isto foi
bastante para ter ficado muito preocupada. Não sabia o que fazer; calar-me e não
dizer nada: parece-me que o meu bom Jesus não queria que ocultasse isto. Isto
repetiu-se na sexta-feira e hoje, dia de Nosso Senhora; assim, como também, a
obediência em tudo, como já expliquei a Vª Revª.
Será isto
uma ilusão minha? Ai, meu Jesus, perdoai-me se Vos ofendo. Eu não Vos queria
ofender; faço por obediência, e a não ser calar-me, não sei como poderia
proceder de outra forma.
A minha
saúde continua a mesma, sempre com muitos sofrimentos, mas tudo vai bem, Nosso
Senhor ajuda-me.
Senhor,
ajuda-me.
Muitas
lembranças da minha mãe e muitas, muitas saudades da Deolinda.
Fará a
caridade de me abençoar e de pedir a Jesus por mim; eu também não esquecerei o
Paizinho nas minhas pobres orações. Adeus, adeus.
Alexandrina Maria da Costa ».
Antes de
citar as palavras que Jesus lhe transmitira, Alexandrina confessa que vai
« também fazer um grande sacrifício », o que se compreende perfeitamente,
pois não é evidente fazer uma tal declaração. Que pensará dela o bom Padre
Pinho? Irá ele acreditar que as ditas palavras eram mesmo sobrenaturais? Não irá
ele pensar que Alexandrina é uma “iluminada” que procura dar nas vistas?
E como para justificar os seus receios e sua “vergonha”, ela diz ainda:
« Nosso Senhor bem o sabe e Vª Revª também faz ideia quanto me custa ».
Claro que
“Nosso Senhor sabe” — foi Ele quem o disse! — ; claro que Nosso Senhor vai tocar
o coração do sacerdote e, pela acção do Espírito Santo prepará-lo para ouvir,
daqui em diante, tais afirmações; claro que o Padre Mariano Pinho, homem piedoso
e simples como uma criança, vai acreditar, mesmo se durante algum tempo a põe à
prova; claro que o bom sacerdote vai compreender que a esta jovem de 30 anos,
custa confessar uma tal declaração vinda directamente do Céu: não se teria ela
enganado? Não seria o seu “imaginário” o autor destas palavras?
Habitada certamente por estes escrúpulos, Alexandrina confessa humildemente que
« antes de o fazer, ofereci-o ao meu bom
Jesus ».
Mas, que
ofereceu ela a Nosso Senhor?
Simplesmente
o sacrifício de ter que revelar tais confidências de Jesus. Mas ela sabe já
muito bem que todo o sacrifício agrada a Deus e que, « quanto
maior é o sacrifício, maior será a recompensa de Nosso Senhor; é esta a minha
confiança ».
Ela explica
ainda que estas palavras de Nosso Senhor, não fora uma só vez que ela as ouvira,
mas que « isto repetiu-se na sexta-feira e hoje, dia de Nosso Senhora ».
Sabemos que
quando a Beata Alexandrina ditou esta carta, era Deolinda quem escrevia.
Mas nada
melhor do que ouvir a própria Alexandrina no-lo contar na sua Autobiografia:
« Nosso
Senhor pediu-me isto duas vezes. Não sei dizer a minha aflição, pois não queria
escrever e não queria dizer à minha irmã, mas também não queria ficar calada,
porque compreendia que não era a vontade de Nosso Senhor. Tinha que dizer ao meu
Pai espiritual. Resolvi-me a fazer o sacrifício, pedindo à minha irmã que
escrevesse em meu nome tudo o que lhe ia ditar. Ela não olhava para mim, nem eu
para ela e, depois da carta escrita, tudo morreu para nós ambas, não falando
mais no assunto ».
E logo a
seguir ela explica mais ou menos aquilo que acima interrogavamos:
« Até esse
tempo, sentia uma grande alegria para mim receber uma carta do meu director
espiritual. Desde então, toda essa consolação espiritual desapareceu. Temia que
ele me maltratasse, dizendo-me que tudo era falso. Eu cedi ao convite de Nosso
Senhor, mas pensava que esses sacrifícios fossem só sofrimentos, embora maiores;
não pensava em nada de sobrenatural. O meu director obrigou-me a que escrevesse
tudo, e durante dois anos e meio não me disse que era Nosso Senhor — o que me
fez sofrer bastante, apesar dos meus poucos conhecimentos ».
Portanto,
como acima dizíamos, o Padre Mariano Pinho quis “testar” esta nova experiência
mística da sua dirigida, por isso mesmo, “durante dois anos e meio” nada lhe
disse que a pudesse confortar na ideia que era realmente Nosso Senhor que lhe
falava. Mas Alexandrina sabia, estava mesmo convencida que as palavras ouvidas
por ela não tinham outra fonte, outro autor que o Autor mesmo da vida, o Autor
da graça e Salvador das almas: Jesus.
« Desde então — explica ela —, tinha
Jesus à minha ordem, falando-me de dia e de noite. Sentia grande consolação
espiritual; não me assustavam os meus sofrimentos. Em tudo sentia amor ao meu
Jesus e sentia que Ele me amava, pois d’Ele recebia carícias sem conta. Só me
desejava sozinha. Oh, como me sentia eu no silêncio e muito unidinha a Ele!...
Jesus desabafava
muito comigo. Dizia-me coisas tristes, mas as consolações e o amor que me fazia
sentir obrigavam-me a esquecer o Seus desabafos. Passava noites e noites sem
descansar, a contemplar quadros que Jesus me mostrava e em conversa íntima com
Ele.
E, como não
podia deixar de ser, a Virgem Maria lá estava também neste viver humilde e
simples da jovem de Balasar
« Também
vi a Mãezinha uma vez, representando Nossa Senhora do Carmo, com o Seu Divino
Filho nos braços. Outras vezes como Nossa Senhora da Conceição. Oh, como era
bela!... Só queria amá-la e a Jesus! Só me sentia bem a sós com Eles! »
Tão
simplesmente como Alexandrina, tão filialmente como ela nos fala, digamos nós
também, nesta data aniversário do nascimento da Virgem Mãe:
Feliz
aniversário, Mãezinha do Céu! Nós queremos ser vossos filhos também, nós
queremos amar-vos, imploramos a vossa materna protecção e a vossa santa ajuda,
para sermos verdadeiros filhos de Deus.
Viva o 8
de Setembro! Amen.
Afonso Rocha
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