4 de Dezembro de
1953 – Primeira Sexta-feira
Esta semana tem
sido para mim de grande, muito grande sofrimento do corpo, sem ser aliviada da
alma. Foi uma semana com noites de vigília quase contínua. Não sabia falar com
Jesus e a minha eternidade e inutilidade nada me permitem. O que resolvi fazer?
Disse a Jesus:
Eu sou um cepo ou
mesa de ferreiro, como lhe queirais chamar. Estou no lugar em que me colocaram.
Aceito todas as pancadas que me quiserem dar. Sois Vós, Jesus, o artista. Fazei
toda a variedade de instrumentos e espalhai-os pela humanidade inteira. Sabeis o
que a cada um convém. Trabalhai, Jesus, trabalhai. Batei, Jesus, batei sobre o
Vosso cepo. A fornalha é o Vosso Divino Coração, o fogo, o Vosso amor. Tudo é
por Vós, tudo é para as almas. Só por Vós sei sofrer, só por Vós e pelas almas.
No fim de assim
falar a Nosso Senhor, apesar do cepo que era e da inutilidade que em mim sentia,
a minha alma via como que Jesus a desempenhar o ofício que eu lhe dei e batia,
batia fortemente, e como se não tivesse coração para se condoer de mim. Mas,
como era cepo e ao cepo nada dói, ao ver Jesus trabalhar, a minha alma
confortou-se, e a vigília da noite continuou. Mais das vezes levo a vida a fazer
actos de fé, tal é o estado doloroso da minha alma. E mais tenho que os fazer,
quando pratico algumas maldades, pois essas brilham em mim e estão sempre
presentes. Ao receber tantos milhares de beijos das criaturas que de mim se
abeiram, resolvi oferecê-los a Jesus como se n’Ele eles fossem dados e que Ele
os aceitasse como actos de amor para os sacrários, para honra e glória da
Santíssima Trindade e da Mãezinha querida, e que tudo revertesse em favor dos
visitantes. O meu horto e calvário foram penosos, foram dolorosíssimos. Foram de
desespero, foram inúteis para mim, neste sentimento de que os sofrimentos de
Jesus no horto e no calvário, na Sua dolorosa agonia, não tinham para mim
utilidade alguma. Não vi, mas ouvi a voz de Jesus, vinda do horto, mas dum horto
como se fosse um bosque, mas um bosque de espinhos. Ele dizia: “ai, ai!” Gemia e
suspirava. Que gemidos tão penetrantes! Que dor infinita me causaram! Isto
passou-se durante a noite, mas hoje, na mesma dor, com os ouvidos a ouvir os
mesmos suspiros, ais e gemidos da noite, subi a encosta do calvário sempre como
que em desespero e em revolta por tudo ser inútil para mim. Era para sempre a
perda do meu Senhor. Nem ao menos me uni a Ele no alto do calvário, sempre como
que em desespero e em revolta por tudo ser inútil para mim. Era para sempre a
perda do meu Senhor. Nem ao menos me uni a Ele no alto do calvário, na cruz
crucificado. Ele dava a vida e eu ficava na morte, na morte eterna. Entregou ao
Pai o Seu espírito e pouco depois tirou-me dessa morte, fazendo-me compartilhar
da Sua vida. Iluminou-me um pouquinho com a Sua luz e dentro do meu coração
falou-me assim:
― “A paz do
Senhor, a glória do Senhor, o amor de Jesus triunfou neste calvário. É o triunfo
das almas, é a prova louca, louca do amor de Jesus pelos pecadores. Tentei,
tentei, chamei, chamei, convidei com toda a doçura, com todo o amor, com toda a
ternura pelos lábios da minha vítima, da minha vítima querida, vítima imolada.
Sou Jesus, fui, sou Eu a convidar, a chamar. É convite celeste, é convite
divino. Vai terminar este chamamento. Felizes, ditosos, ditosos os que
atenderem, os que atenderam e ouviram a minha voz, a minha voz de Pai, Pai de
misericórdia e de perdão. Calvário ditoso, quarto abençoado, onde tantas vezes,
tantas vezes baixou Jesus com Sua Mãe celeste!...”
(Cantou:)
Sois mais
pura, sois mais pura e imaculada do que a aurora,
do que a aurora no seu
despontar!
Sois mais
pura, encantadora, ó Virgem, ó Virgem, do que o sol,
do que o sol, quando vem a
raiar!
Ó Virgem, ó
Virgem Maria! Ó Virgem, ó Virgem Maria, Maria!
Ó Conceição
pura, ó Conceição pura, só Vós o gozais,
só Vós, só Vós, ó Virgem Mãe!
Só Vós o
gozais e sois Mãe, ó Pura, ó Imaculada, ó Imaculada!
Sois Mãe, sois
Mãe, sois Mãe Imaculada!
Ave, Maria,
Ave, Maria! De graça cheia, de graça cheia.
Só tu és pura,
só tu és pura, ó Conceição, ó Conceição,
ó Conceição da Virgem Mãe, da Virgem
Mãe,
da Virgem Mãe, da Virgem Mãe.
Ao Céu, ao
Céu, ao Céu irei vê-la um dia, vê-la um dia!
Ao Céu, ao
Céu, ao Céu irei ver-te, Maria, ver-te, Maria,
Ver-te, Mãe
minha, ver-te, ver-te, ver-te,
Mãe minha, Mãe, Mãe, Mãe, Mãe minha!
― “Minha filha,
minha querida filha, fala do meu amor divino, fala do amor louco, louco do meu
Coração amantíssimo e do amor louco, louco da minha Bendita Mãe. Tu vais sofrer
muito, muito, bem o sei, esposa querida, vais sofrer muito, muito, com o
sentimento da nossa separação total, mas nem por isso vai ser menos a glória
dada aos nossos santíssimos e dolorosíssimos Corações. Tu vais falar, vais falar
sempre, no pouco tempo de vida que te resta na terra. Vais falar com entusiasmo,
com amor, dos nossos amores. Vais dizer quanto ama o Coração Divino de Jesus.
Vais dizer quanto ama o Coração Imaculado de Maria. O mundo, o mundo desconhece
estes amores num só amor. E um grande número, um grande número daqueles, que O
conhecem, amam mais as vaidades, os prazeres, os gozos da vida. Convida, convida
as almas a amarem a Jesus, a amarem a Maria. Diz-lhes, repete-lhes que este
convite é o convite do Senhor, é o chamamento do Pai, do Pai que quer valer, do
Pai que quer perdoar”.
― Estou pronta,
Jesus, para a dor, sim, para a dor que me espera. Estou pronta, meu Jesus, com a
Vossa graça, para fazer o melhor possível a Vossa divina vontade. Não me
levastes a mal, não, meu Jesus, a minha linguagem grosseira, o meu termo
atrevido de fazer de Vós ferreiro? Mas, para eu ser o cepo ou a mesa, Jesus,
tínheis que Vós ser o artista, meu Jesus. Perdoai, mas eu gostei tanto de falar
convosco assim desta forma, de Vos tratar desta maneira.
― “Não, não,
minha filha, nada te levei a mal. Como levar a mal, se Eu gosto tanto da
linguagem simples e humilde? Se soubesses a alegria que deste ao meu Divino
Coração!”
― Ó Jesus, não
sei como hei-de dizer, mas não Vos alegrei, tenho a certeza disso. Aquela grande
maldade talvez chegasse a ser, não, Jesus? Se eu me calasse, seria mais
prudente. Eu encho-me de Vos pedir perdão, mas é só depois de ter feito o mal.
― “Sossega,
filha, sossega. No último ponto, fizeste só aquilo que devias fazer, disseste só
aquilo que devias dizer, abriste os olhos a quem os tinha fechados. Tem a
certeza que não pecaste. Não, não, minha filha, não pecaste. Gosto de te ver
humilhada e permito as tuas faltas involuntárias. Bem o sei, bem o sei que são
involuntárias, esposa amada”.
― Ó Jesus
amabilíssimo, ó Jesus amabilíssimo, guiai-me, já que sois luz. Dai-me forças que
me faltam, ó Jesus, ó Amor, ó Amor! Dai-me forças, dai-me forças que me faltam
para levar a minha cruz, a minha cruz. Sem ti, Jesus, meu coração desfalece,
desfalece. Vem a mim, vem a mim, ó doce Amor, doce Amor, doce Amor, doce, doce,
doce Amor. Sou pecadora, ó Jesus, sou pecadora, ó Jesus, sou pecadora, ó Jesus.
Não posso sem ti levar a cruz, subir o calvário, subir o calvário, subir, subir,
subir o calvário e levar, e levar a cruz, e levar, e levar a cruz, que é por teu
amor, que é por teu amor, amor, Jesus!
― “Vem, vem agora
receber a gota do meu Divino Sangue. Os dois corações uniram-se: o de Jesus ao
da vítima, ao da sua crucificada. Uniram-se os nossos corações. O Coração de
Jesus uniu-se, fundiu-se no coração da sua vítima imolada A gota do sangue
passou, o alimento, o alimento divino que para ti é tudo, esposa querida. É vida
do corpo, é vida da alma com a minha Eucaristia. Tu vives, tu operas neste
calvário prodígios, grandes prodígios, porque é o Senhor a operá-los. Eu sou o
Senhor dos prodígios, das maravilhas divinas. As almas, as almas, minha filha,
lucram, lucram, ganham muito, enriquecem-se neste calvário. É por ti que Eu a
elas me dou. É por ti que Eu faço que os pecadores em grande número se
convertam. Ó calvário, ó calvário ditoso, ó calvário abençoado! Ditoso Portugal!
Ditosa humanidade! Depois da tua morte, depois da tua morte, por ti, sim, por
ti, muitas, muitas graças, muitas, muitas bênçãos, uma chuva de graças e de
bênçãos cairá, cairá cada dia e noite sobre a terra, sobre a terra culpada,
sobre os pecadores que tanto têm ofendido o seu Deus e Criador. Vai em paz! Fica
na tua cruz para em breve teres os colóquios de fé, de fé, de fé!”
― Jesus, sou a
Vossa vítima, sou a Vossa vítima! Obrigada, meu doce Amor. Não Vos esqueçais dos
meus pedidos, de todas as minhas intenções. Obrigada, Jesus, obrigada!
5 de Dezembro de
1953 – Primeiro Sábado
Passei a noite
numa ansiedade e num susto, ansiedade de receber a Jesus e um susto por saber
que era o último sábado que tinha o colóquio com Jesus e com a Mãezinha. Isto
causava-me dor profunda e pavor ao mesmo tempo. Meu Jesus, ficar sem Vós, sem a
Mãezinha! De momento para momento me sinto mais indigna e mais inútil, mais
inútil. Recebi a Jesus. Ele não se demorou a assear a sala do meu coração com o
Seu asseio, a iluminá-la com a Sua luz, e falou-me assim:
― “Minha filha,
minha jóia, pupila dos meus olhos, está no teu coração o Esposo fiel,
fidelíssimo. Estou aqui a prender, a enlear mais, muito mais com fortes cadeias
de amor o meu Divino Coração ao teu. Vou e fico, minha filha. Ausento-me e fico
presente. Vou deixar-te e não te abandono um momento. Filhinha, filhinha,
custa-me proceder desta forma. São as almas, são os pecadores que necessitam do
teu martírio. Custa-me muito, muito esta fingida separação. Filhinha, filhinha,
digo-te o que disse aos meus discípulos: “vou, mas fico”. Parti para o Céu e
fiquei na Eucaristia. Vou fingir deixar-te. Duro golpe, dura separação. Confia!
É separação fingida. Vou e fico no sacrário do teu coração. Tem sempre presente
as palavras, os pedidos, as exigências de Jesus.
Diz ao teu
Paizinho que fico no seu coração, que é uma promessa minha, neste dia doloroso
para ti. Fico no seu coração, fundido tão real como no Céu. Diz-lhe que o criei
para as almas de alta eleição, da mais alta eleição. Alta foi a minha escolha,
grande, muito grande tem sido a sua dor. Diz-lhe o meu obrigado. Dá-lhe todas as
minhas graças, riqueza infinita no meu Divino Coração, com toda, toda a
abundância do meu amor.
Diz ao teu médico
o maior obrigado de Jesus. Diz-lhe que lhe peço sempre, sempre até ao fim,
coragem, fidelidade e todo o amor à minha divina causa. Dou-lhe a promessa de
sempre, sempre velar por ele, por todos os que lhe são queridos, por todo o seu
jardim mimoso e florido e por todos os seus descendentes. Dá-lhe amor, amor,
amor sem fim.
Vem, minha
bendita Mãe, vela, toma a teu cargo a nossa filhinha”.
― “Vem, filhinha,
vem, filhinha predilecta de Jesus. Sou a Mãe do Rosário, sou a Mãe do Carmo.
Depois de te colocar no meu regaço, depois de te estreitar ao meu Divino Coração
e acariciar-te, mais uma vez enleio nas tuas mãos o rosário que pende das minhas
benditas mãos. Sobre ele coloco o escapulário. Como te intitulou Jesus, és mãe
dos pecadores. Recomenda-lhes sempre o meu terço. Quero fazer-te também mãe das
almas do Purgatório. Oferece por elas, oferece pelos pecadores, oferece como
prémio aos que te são mais queridos, aos que tanto te têm amparado e velado por
ti, este sacrifício, esta dura e dolorosa ausência, esta triste separação. Nunca
te convenças, filhinha, de que estás sozinha, de que Jesus e a tua Mãezinha te
deixaram. Não, não, isso não. É quando em ti estamos mais presentes, porque,
mais que nunca, mais que nunca, mais que nunca, precisas do amparo do Céu e da
terra. Necessitas de toda a prova de amor”.
― Ó Mãezinha, ó
Jesus, é uma separação de morte que eu sinto. Quero que os Vosso Divinos
Corações aceitem um eterno abraço e um eterno agradecimento por tudo o que
tendes feito por mim, por toda a predilecção que dispensaste ao meu pobre,
pobre, pobríssimo coração.
― “Coragem,
coragem, filhinha, florinha eucarística, mimo do paraíso. Confia, confia. Jesus
está contigo. A Mãe do Céu está contigo. Velaremos por ti. Coragem e confia!
Recebe todo o amor, todo, todo o amor de Jesus e da tua querida Mãezinha. Recebe
as nossas carícias”.
― Obrigada,
Jesus. Obrigada, Mãezinha, por mais esta promessa de amor.
― “Coragem,
então, filhinha. Escuta a Jesus. o último colóquio das almas, o último colóquio
dos pecadores vai ser no dia 25, no dia da renovação do meu nascimento. É o
aniversário de Jesus. Fica a ser o aniversário da minha esposa e vítima mais
querida.
Mais quero dizer
ainda. Quero que os homens saibam e compreendam que Eu quero a ciência das almas
e dos corações. Não busco a grandeza nem a sabedoria das línguas, mas sim a
grandeza e a sabedoria do amor dos corações. E fica dito tudo. Neste coração
encontrei a maior ciência do amor, a mais alta, a mais alta, a mais alta
sabedoria, a maior loucura de amor ao meu Divino Coração e de amor às almas.
Qualquer palavra que tenha aparência de contradição não o é. Qualquer palavra
que pareça menos correcta não, não o é. Sou Eu, sou Eu, a Sabedoria infinita,
que assim o permite para meter no coração da vítima a humilhação antes que possa
entrar qualquer sombrinha de vaidade que possa prejudicar essas mesmas almas,
esse mesmo coração louco, louco por Mim. Sou Eu quem vela, sou Eu quem prepara
as minhas vítimas. E como não velar e não preparar a minha esposa mais fiel, a
vítima heróica deste calvário, a heroína forte, a heroína forte, a heroína forte
do calvário mais querido de Jesus? Recebe amor, amor, amor e fica em paz”.
― Adeus, Jesus,
adeus, Mãezinha. Sou a Vossa vítima, a vítima dos Vossos Corações Divinos, a
vítima de tudo quanto Vos aprouver. Antes da separação, peço-Vos com dor tudo,
tudo, peço-Vos tudo, tudo para os que me são queridos; tudo, tudo para a minha
família, para os pecadores, para os sacerdotes, para todos os que vêm junto de
mim pedir-me graças e para a humanidade inteira. Adeus, Jesus, adeus, Mãezinha,
adeus, adeus, Mãezinha. Obrigada, obrigada.
11 de Dezembro de
1953 – Sexta-feira
Tudo passa, tudo
desaparece, menos a eternidade. Está no seu princípio, sempre duradouro, sem se
mover. É para mim um tormento, um pavoroso martírio. Tudo passa. Passam as
palavras, os sacrifícios, os indizíveis sofrimentos e passam de tal forma como
se não tivessem princípio. Ó meu Deus, ó meu Jesus, o que será de mim sem Vós?
Valei-me, valei-me! Eu não quero pensar nesta separação de Vós e da Mãezinha.
Duvido de mim. Tenho medo de desfalecer e chegar a ofender-Vos. Confio em Vós,
confio em Vós. Quero viver da confiança. Vós não podeis abandonar a quem a Vós
se abandonou. Não podeis deixar entregue a si mesma, a quem a Vós se entregou e
só na Vossa força e graça confiou. Desde o primeiro sábado para cá comecei eu
mesma a abrir o meu túmulo. É a eternidade antes dele, depois dele e no meio
dele. Quero dizer: existia a eternidade antes do túmulo, depois do túmulo e no
meio do túmulo, agora onde eu trabalho como um cavador e vou-me sepultando a mim
mesma. Sito como que se desse uma cavadela de 100 em 100 anos, ou mais ainda, e
com tal esforço banho de suor o túmulo, a terra em que me vou sepultando.
Enterro-me a mim mesma, mas tão devagarinho! Como abrir a sepultura cavando tão
raras vezes, mas sempre com o instrumento em punho, banhada em suor, como se
trabalhasse, cavasse dia e noite incessantemente? Que esforço o da minha alma!
Ai, meu Deus, que duro e penoso martírio! Por Vós, só por Vós e pelas almas.
Neste tormento passei, ontem, o meu horto desprezando-o sempre e sempre
blasfemando e odiando o Senhor. Hoje, no mesmo estado de alma, segui a viagem do
calvário. Celebrou-se a santa missa no meu quartinho. Uni-me à Vítima Divina o
mais que pude. Como não sabia assistir a este acto tão divino, mais uma vez
ocupei a Mãezinha para desempenhar esta missão por mim. Enquanto o Santo
Sacrifício ia correndo, eu com os suores da alma não deixei de trabalhar no meu
túmulo, na minha sepultura. Nesta fadiga incessante, numa dor, tristeza e agonia
mortal, cheguei ao cimo da montanha. Continuei o meu oficio em todo o tempo da
agonia de Jesus. Fugia-lhe sempre e sempre Lhe ofereci as minhas grandes
humilhações, o grande sofrimento que me casavam todos os olhares que me rodeavam
Senti aquela atracção vinda do Alto que me separava mais das coisas da terra. Só
assim podia resistir à dor. Jesus expirou, e eu no silêncio da morte fiquei sem
Ele; nem era do Céu, nem da terra. Bem depressa veio o meu Amado. Senti no
coração a Sua entrada. Ele modificou o estado da minha alma deixando-me como que
electrificada por Ele e falou-me assim:
― “O Céu, o Céu,
o Céu desceu a este calvário. Jesus, o Jesus do amor, o Jesus dos pecadores
entrou no coração da sua vítima. Sou o Jesus do amor, sou o Pedinte do amor. Eu
amo e quero ser amado. Eu amo e venho pedir amor. É por amor que Eu desço. É por
amor que imolo a vítima mais querida, mais predilecta do meu Divino Coração.
Colóquio das almas, colóquio dos pecadores. Escutai, escutai, vós todos por quem
Eu desci à terra. Escutai, escutai, vós todos por quem Eu imolo a minha vítima.
Vinde a Mim, vinde a Mim, pecadores. Anseia, anseia por Vós, anseia
infinitamente o meu Divino Coração. Eu sou o Bom Pastor. O pastor ama as suas
ovelhas. Eu sou o Bom Pastor e o bom pastor reúne as suas ovelhas.
Convertei-vos, convertei-vos! Vinde ao meu Divino Coração. O meu convite, o meu
divino convite é feito pelos lábios da minha vítima, da minha esposa
crucificada. Cai a justiça do Senhor. Vem sobre a terra a justiça do meu Eterno
Pai. Arrepiai caminho! Convertei-vos, convertei-vos! Sofre, sofre, minha filha.
Sofre, sofre, mãe da humanidade, mãe dos pecadores. Sofre, que o tempo é pouco.
Sofre, sofre; o mundo, as almas necessitam da tua dor. Fita os olhos em Jesus.
Põe no Céu a confiança. Fita os olhos em Jesus. Põe no Céu a confiança.
Sofrimento não recuses a quem sofre com esperança. Servem-lhe de trono as
cruzes, servem-lhe de trono as cruzes; põe no Céu a confiança, põe no Céu a
confiança! Não recuses a tua dor. Ama a cruz, ó filha minha! Ama a cruz, ó filha
minha, ó filha minha! Por amor, por amor do teu Jesus, do teu Jesus”.
― Jesus, meu
Deus, Jesus, meu Pai; Jesus, Jesus, meu Deus, Jesus, meu Pai, meu Pai. Sou toda
tua, ó Jesus. Sou toda tua, ó meu Pai. Sou toda tua. Dá-me a cruz, ó Jesus, por
teu amor. Levo a cruz, levo a cruz, ó meu Senhor. Dá-me a cruz por teu amor, ó
Jesus, dá-me a cruz. Levo a cruz, levo a cruz, levo a cruz por teu amor, por teu
amor, ó Jesus, ó Jesus, ó Jesus, ó meu Senhor. Meu coração desfalece, meu
coração desfalece, ó Jesus. Sem o teu amor, ó Jesus, sem o teu amor, ó Jesus.
Não posso mais, não posso mais, não, não posso mais com a cruz! Meu coração
desfalece, ó Amor, por teu amor. Desfalece, ó Amor, por teu amor, por teu amor!
Dá-me a tua força, dá-me o teu conforto, ó Senhor, ó Senhor, ó Senhor.
Vai, alma que
choras, vai ao Salvador!
Vai, alma que
choras, vai ao Salvador!
Nas horas mais
tristes, diz-Lhe a tua dor.
Nas horas mais
tristes, diz-Lhe a tua dor. Vai, alma que choras, vai ao teu Jesus;
Nas horas mais
tristes, abraça e beija a tua cruz, a tua cruz!
Vai, ó alma,
vai, ó alma, vão ao sacrário, vai ao sacrário, vai ao Amor! Recebe a vida do teu
Senhor,
Recebe a vida
do teu Senhor!
Sacrário,
sacrário, sacrário, prisão do Senhor, prisão do Senhor,
Prisão do
Amado, prisão do Amado, do amado do Pai, do pecador, do pecador.
― “Minha filha,
minha filha, louca da cruz, louca do sacrário, louca do meu Divino Coração,
louca da Trindade Augusta, louca, louca da Virgem Mãe. Os últimos colóquios, os
colóquios dos pecadores mostram aos pecadores a loucura dos teus amores, a
loucura dos teus amores. Aprendei de Mim, aprendei do meu Divino Coração,
aprendei como aprendeu esta discípula e crucificada do Senhor. Oh, como é belo,
oh! Como é belo o amor, o amor puro, puro, o amor desinteressado!... Oh! Como é
belo, belo e encanta o paraíso, o amor puro, puro, o amor louco, louco e
abrasado! Aprendei, aprendei todos do meu Divino Coração! Estudai n’Ele. Quantas
instruções divinas, quanta sabedoria, quanta prova de amor, de amor de Jesus
para com os seus filhos! Aprendei, aprendei como aprendeu esta discípula e
grande crucificada. Eu sou o Senhor Eu sou a vida e quero dar-me a vós, ó
pecadores, ó pecadores, ó pecadores. Quero dar-me a vós por esta florinha
eucarística. Quero dar-me a vós pela porta-voz do meu Divino Coração. Esta
esposa e vítima, a quem dei todos os títulos, é o porta-voz, é o farol do mundo.
Eu quero, Eu quero que chegue aos confins, sim, aos confins da terra, as ânsias,
os desejos divinos do meu amantíssimo Coração. Quero ser amado, quero que seja
amada a minha Bendita Mãe.
(Cantou a
Ave-Maria em latim):
Ave, Maria,
gratia plena, Dominus tecum: benedicta tu in mulieribus et benedictus fructus
ventris Tui, Jesus.
Sancta Maria,
Mater Dei, ora pro nobis peccatoribus, nunc et in hora mortis nostrae. Ámen.
― Sois mais pura,
mais encantadora, ó Virgem Maria, ó Conceição pura! Sois mais pura, sois mais
pura, mais imaculada, ó cheia de Graça, ó Virgem Maria! Ó Virgem Maria, ó
Virgem, ó Virgem! Tens o perfume da rosa, ó Maria, ó Maria, ó Maria, ó Virgem
Mãe! Roga por teus filhos, Açucena pura, ó Virgem Maria, ó toda candura! Roga
por teus filhos ao Eterno Pai, ao Eterno Pai. Virgem Maria, Virgem Maria, meu
doce Amor, meu doce Amor, roga, ó Virgem, roga, ó Virgem roga, ó Mãe de Jesus,
roga por nós, roga por nós, roga, roga, roga por nós ao Senhor, ao Senhor, ao
Senhor! Teu coração que só ama, teu coração que só ama, ó Maria, roga por nós,
inter cede por nós, por amor, por amor, ó Mãe, ó Mãe minha, ó Mãe nossa, ó Mãe
minha, ó Mãe nossa, ó Mãe nossa, roga por amor, roga por nós ao teu Deus, roga
por nós ao teu Deus, ó Mãe Santíssima, ó Mãe Imaculada, toda pura, toda bela,
roga por nós ao teu Filho, ao teu Filho, ó Mãe. Roga, roga, roga, ó Mãe, por nós
ao Eterno Pai, ao Eterno Pai.
― “Vem, minha
filha, receber a gota do meu Divino Sangue. Deu-se choque sobre choque, a
gotinha do Sangue passou, passou com abundância; passou e levou força, levou
toda a minha vida, levou todo o meu amor. Jesus repara, Jesus repara as forças
que a dor consome. Coragem! Coragem, Jesus vai e fica, Jesus apenas finge
ausentar-se, mas ele está sempre, sempre no teu coração. São minhas, só minhas
as palavras que dás às almas. Fala-lhes, fala-lhes! Criei-te para elas. Vive da
confiança, vive da fé. Coragem, coragem, esposa minha. Fica na tua cruz. Jesus é
todo teu, Jesus é todo o teu amor”.
― Obrigada,
obrigada, meu Jesus! Perdoai-me! Já parece que nem sois meu Amor, nem sois nada.
Perdoai-me, perdoai-me! Lembro-Vos todas as minhas intenções e a humanidade
inteira. Sou a Vossa vítima, Jesus, sou a Vossa vítima! Serei sempre, sempre a
Vossa vítima.
18 de Dezembro de
1953 – Sexta-feira
Ai, ai, valei-me,
valei-me, Jesus, valei-me, valei-me, Mãezinha. Ai de mim, sem Vós. Valei-me,
valei-me! É o que diz o meu coração, é este um brado quase contínuo, é isto o
que ele sabe dizer e pedir a Jesus, quer de dia quer de noite. O que será de
mim? Eu não tenho força para nada, estou deveras desfalecida. O Céu fechado e a
terra morta. De nenhum dos lados posso receber conforto. Ó abandono, terrível
abandono! Ó inutilidade e eternidade, que pavor me causais! Estou de mãos vazias
para a eternidade e esta juntou-se à inutilidade. Uma a roubar-me tudo e outra a
pedir-me tudo. Estão as duas numa só massa a exigirem de mim aquilo que eu não
tenho. A inutilidade rouba-me o que eu não chego a possuir. A eternidade
exige-me o que eu não tenho para lhe dar. Que pavor, meu Deus, que pavor! Tanto
sofrer, tanto esforço para agradar a Jesus, amar a Jesus e Lhe dar almas; e
sempre sem nada. Tenho uma fome e sede de possuir os corações e as almas. De dar
a vida e o sangue a cada momento para os entregar a Jesus, que não há coisa
grande, grande que a elas se possa comparar, só a grandeza de Deus. Devora-me,
consome-me esta fome e esta sede. Quero engolir o mundo como leão furioso o
queria tragar, recolhê-lo inteirinho no meu coração, para assim
inteirinho o entregar a Jesus. Ó fome, ó fome indizível, infinita. Se fosse
possível mesmo depois da minha morte o meu cadáver ser arrastado de rua em rua,
por toda a parte até se desfazer, sem deixar sinais de ter existido, para
comprar as almas de todos os pecadores e fazer que todos os corações amassem a
Jesus e à Mãezinha, de boa vontade eu fazia testamento, mais, doação de mim
mesma para tal fim. Meu Deus, como aguentar estas ânsias? Só Vós, meu Jesus, só
Vós. Recebi uma notícia tão triste, tão triste! Não sei se tem alguma coisa de
verdade, o que sei é que foi como se me rasgassem o coração de cima a baixo e
lhe tirassem a vida. Só a graça de Jesus podia vencer e resistir a tanta dor sem
um desespero. Amo-Vos, Jesus, sou Vossa, sou a Vossa, sou a Vossa vítima.
Continuo como o cadáver indolente a cavar, a preparar o meu túmulo. Vou-me
enterrando cada mais, por vezes me falta a respiração. Ó tempo, que me vou
enterrando mais profundamente. Parece que já me vou descarnando e apodrecendo os
meus vestidos. Apesar desta indolência, destas cavadelas de século a século, os
suores da alma não passam, é uma fadiga incessante. Louvores, louvores ao
Senhor. Seja sempre feita a Sua vontade. O horto e o calvário são como a morte
para mim. Ontem, trabalhando na minha eternidade, a minha alma fugiu sozinha,
queria o silêncio; foi para o solo do horto e ali em dolorosa e profunda agonia
orou ao Pai; tudo o mais foi a morte. E morte foi hoje a viagem do calvário sem
utilidade nenhuma para mim, sem dele receber proveito; por minha culpa odiei-o,
blasfemei contra ele, tratando só do meu túmulo e vendo a minha eternidade
desesperadora. No cimo da montanha, alguém por força estranha me levou ao
encontro de Jesus. Ele estava na cruz. A minha saudação foi escarrar-Lhe no
rosto e retirar-me. Ai que dor eu causei ao meu Jesus! Ele a sofrer e eu na
minha revolta contra todo o Céu. Assim o fiz expirar em dor e agonia. A minha
alma sentiu também essa morte. Jesus depressa ressuscitou e bem depressa me veio
dar vida e dentro do meu coração falou-me assim:
― “Não há dor
semelhante à minha dor. Não há dor semelhante à da minha Bendita Mãe. Sofre o
Seu Imaculado Coração ao ver o meu Coração sofrer. Não há dor, não há dor
semelhante à minha dor. Sofro com os hediondos crimes do mundo. Sofro, porque
não sou amado, não sou amado. Sou sempre ofendido, sempre ofendido! Que
cegueira, que cegueira a da humanidade, a da pobre humanidade! Basta, basta de
crimes, basta, basta de tanto pecar! A maldade, a maldade do mundo, a labareda
do crime atingiu toda a altura. Oh! Quanto sofre, oh quanto sofre o meu Divino
Coração e o da minha Mãe Imaculada!
O teu coração em
sangue chagado, chagado, só em sangue, minha filha, é a reparação que exige a
maldade de todo o mundo. O teu coração chagado, em sangue, vítima querida, é
para reparares as ofensas cometidas contra Mim e minha Bendita Mãe. Ela sofre em
união comigo, como no calvário. Sofre, sofre, repara, esposa minha. Consola a
Jesus, consola a Maria. Roga-Lhe por todos os pecadores, todos, todos os
pecadores”.
(Cantou):
Sancta Maria,
Mater Dei, ora pro nobis peccatoribus, nunc et in hora mortis nostrae.
Ámen.
Tota pulchra es, Maria. Tota
pulchra es, Maria.
Et macula originalis non est
in te.
Et macula originalis non est
in te.
Tu, gloria
Jerusalem. Tu, laetitia Israel. Tu, honorificentia populi nostri.
Tu, advocata
peccatorum.
O Maria, o
Maria, Virgo prudentíssima, Mater clementíssima:
Ora pro nobis,
intercede pro nobis ad Dominum Jesum Christum.
― Ave, Maria, de
graça cheia, de graça cheia. És tu bendita, és tu bendita, Mãe entre as
mulheres. Virgem Maria, mística flor, Virgem Maria, celeste amor, celeste,
celeste, celeste amor, amor, amor. Salva, ó Mãe, salva, ó Mãe, os filhos teus.
Roga por eles, ó Mãe, roga por eles, ó Mãe, lá no Céu, lá no Céu, lá no Céu.
― “Minha filha,
minha filha, o teu nome será bendito. Tu serás gloriosa no céu, a tua dor na
terra será transformada em amor no Paraíso. Oh Céu ditoso, oh Céu ditoso, esposa
minha! Como é bela, como é bela, rica, riquíssima a tua coroa no paraíso, a tua
coroa no Céu”.
― Ai, Jesus,
Jesus, quero o Vosso amor! Jesus, quero amar-Vos. Jesus, quero ser toda Vossa!
Jesus, quero possuir-Vos, Jesus, quero dar-Vos as almas, única ambição depois do
Vosso amor, depois de Vos amar e consolar o Vosso Divino Coração; só as almas me
interessam, bem o sabeis, meu Jesus. Prefiro as almas, as almas ao gozo, ao
prémio. Eu sei que sois justo, meu Amor, mas também Vós sabeis que todo o meu
viver, todo o meu viver é para Vós, desinteressadamente. Ó Jesus, ó Jesus, estas
ânsias são como feras, mas muitas feras a devorarem-me o coração. Quero almas,
meu Jesus. Dai-me almas, eu só não posso. Dai-me almas para que eu Vos dê almas,
sempre almas. És depositária, minha filha, de todos os meus poderes, de todas as
minhas riquezas, de todo o meu amor.
(CantouJ
Eu desejo
amar-te mais, amar-te sempre, amar-te mais!
Exaltar o teu
nome, ó Jesus, o teu nome em hinos virginais, hinos virginais, ó Jesus, o teu
nome em hinos virginais!
Dá-me o teu
amor, ó Jesus. Dá-me o teu amor, ó Jesus! Dá-me o teu amor, ó Jesus!
Sem ele não
posso viver! Sem ele não posso viver! Dá-me o teu amor, ó Jesus! Dá-me, dá-me o
teu amor, ó Jesus!
Sem ele não
posso, sem ele não posso, sem ele não posso levar a minha cruz!
Sem ele não
posso levar a minha cruz!
Dá-me o teu
amor, ó Jesus! Dá-me o teu amor, ó Jesus! Dá-me o teu amor, ó Jesus!
Ó Jesus! Ó
Jesus! Sem ele não posso, sem ele não posso, desfaleço, desfaleço com a cruz,
com a cruz.
Ó anjos,
cantai comigo!
Ó anjos,
louvai, louvai, louvai sem fim!
Dar graças não
posso, Jesus! Dar graças não posso, Jesus!
Ó anjos, ó
anjos, dai-as por mim, dai-as por mim, dai-as por mim!
No Céu te irei
ver, ó Jesus!
No Céu te irei
ver, ó Jesus, meu Amor!
Ó Jesus, meu
Amor! No Céu te irei ver! No Céu te hei-de amar!
No Céu te
hei-de amar para sempre, para sempre, para sempre, meu Amor, meu Amor!
― “Vem, minha
filha, vem receber a gota do meu Divino Sangue. Mais uma vez, mais uma vez ficou
fundido o meu Divino Coração no teu. Ficas possuidora, guarda este tesouro.
Distribui, distribui-o do teu coração. É pelo teu coração que se espalham no
mundo as minhas graças, as minhas riquezas, o meu amor. É por ti, vítima
querida, vítima gloriosa, vítima triunfadora desta calvário.
Passou o teu
alimento. Passou a tua vida. Tu já não vives para ti. O que vives da terra é
para a terra. O que sofres na terra é para as almas, sim, para as almas. A tua
vida, a tua vida, a tua vida é já do Céu. Fica na tua cruz tão dolorosa, de
tanta glória para o meu Eterno Pai. Tem coragem! Tem coragem! Eu fico sempre
contigo! Eu virei sempre dar-te este alimento enquanto viveres na terra. Vão
terminar os colóquios das almas. Felizes, ditosas daquelas que deles se
aproveitaram. Ficam para ti os colóquios de fé, colóquios de fé e de conforto e
pouco mais, pouco mais, esposa querida. Coragem, coragem! Fala às almas, fala às
almas!”
― Ó meu Jesus,
vai-me custar tanto, tanto a nossa separação. Bendito Vós sejais! Seja tudo pelo
Vosso amor! Seja tudo pela salvação do mundo inteiro! Não Vos esqueçais, Jesus,
de todas as minhas intenções, que, afinal, são Vossas, Jesus: Vós conhecei-las
todas.
Obrigada, Jesus,
por todo o amor, por toda a dor e por toda a prova que me dais. Obrigada! Sede
bendito por tudo, meu Sumo Bem!
25 de Dezembro de
1953 – Sexta-feira
Como se sofre!
Poderei ainda sofrer mais? Perdoai-me, Jesus. É um desabafo atrevido. Não sou eu
quem sofre, sois Vós o sofrente, sois Vós a vencer em mim. Ajudai-me, Jesus,
ajudai-me, não posso levantar-me, estou caída, só Vós podeis deitar-me a mão. Ai
de mim, tantas maldades que eu tenho! É um mundo delas, um mundo dos maiores
vícios e crimes. Todo o meu ser se desfaz com a lepra do pecado. Ventania
destruidora leva as cinzas de todo o ser. Só o pecado fica, só este aparece. São
sem número os espinhos a ferirem-me, são indizíveis os meus sofrimentos. Mas a
inutilidade, a tremenda inutilidade, tudo me vem roubar, toma conta do fruto de
tanto sofrer. Eu, pobre de mim, nem ao menos vejo nascer aquilo com que podia
pagar as minhas dívidas ao Céu e consolar o meu Jesus. Cruel, cruel inutilidade,
pavorosa, pavorosíssima eternidade. Só a força de Deus pode sofrer nela, só
Jesus nela pode viver. Não posso, não posso sozinha resistir nem um momento. Já
estou mais que sepultada, mas continua o meu ofício de cavador. Os suores da
alma a banharem-na constantemente e a cavação mais parecem cavadelas eternas do
que outra coisa. Mas sinto que esta minha cavação tem de continuar, o meu
sepulcro tem de abrir-se no maior abismo, terra sobre terra ma vai cobrindo, eu
mesma me enterro. É com o meu esforço que hei-de desaparecer. Como, meu Senhor,
enterrar-se, desaparecer aquilo que já não existe? Bendito sejais, bendito
sejais! Sou a Vossa vítima. Nuns momentos, sofro infinitamente ânsias
verdadeiramente infinitas de amar a Jesus e de possuir o mundo. Nesses momentos,
é infinita a fome que tenho no coração. Só a humanidade com todos os corações e
almas me podiam satisfazer. Noutros momentos, nem fome, nem ânsias de amar nem
de ser amada, mas uma tristeza, um gelo tal que gela o mundo e me leva à
indiferença, ao completo esquecimento das coisas de Deus. Daqui nasce uma dor
tão profunda e tão dolorosa que não é minha. Jesus faz-me sentir bem ao vivo que
é a dor do Seu Divino Coração. Não disse nada, nada posso dizer. Sofro tanto,
tanto! Passei pelo horto só como se voasse nele sem poisar na terra. Eu não
pertencia à terra, a minha vida não era da terra.
Preparei-me para
o nascimento de Jesus por um acto de contrição; não pude confessar-me. À
meia-noite pedi-Lhe que Ele nascesse no meu coração e em todos os corações.
Fiz-Lhe muitos pedidos, mas tudo feito na inutilidade e na eternidade. Fiz-Lhe
companhia no presépio, no calvário e no horto, mas tudo inútil, numa agonia e
tristeza mortal. Hoje, segui para o calvário, mas esvoaçando apenas sobre os
caminhos do calvário e no calvário sobre os braços da cruz. Era do Céu a minha
vida, mas penetrava em todo o ser humano, em todos o ser miserável. Enquanto
Jesus agonizava, esvoaçava sempre essa vida nos braços da cruz. Fitava Jesus
crucificado e formava voo para o Seu Divino Coração. Outra vida, a vida da terra
atirava-se para Jesus a escarnecê-Lo, a escarrá-Lo. Ele deu a vida, entregou-se
nas mãos do Pai, e eu fiquei sem nenhuma vida, nem de revolta, nem de amor.
Jesus não teve pressa em vir ao meu coração e fazer-me ressuscitar. Quando veio
com a Sua luz, iluminou-me e falou-me assim:
― “Desci do Céu e
aqui estou pela última vez no coração da minha esposa para pelos seus lábios
falar. Desci do Céu e vim a este c oração deixá-lo em dor, dor, mais dor pelos
pecadores. Grande sábio, a maior ciência tem aquela alma que por Jesus sabe
sofrer. Grande ciência, a maior ciência é amar muito e muito sofrer. É a ciência
que Eu busco, é a ciência que Eu anseio. É rara, tão rara, quase nunca a
encontro. Colóquio das almas, colóquio dos pecadores, o último colóquio das
almas, o último dos pecadores. Coragem, minha filha, coragem! Venho dar-te o meu
Sangue divino. Venho dar-te o alimento que te faz viver. Vive da fé, só da fé.
Eu não deixo de confortar-te, quando preciso for. De longe a longe ouvirás,
esposa minha, as palavras do teu Jesus. é dor, é dor, inigualável dor, mas o
triunfo, o número das almas a salvar-se é maior ainda, maior ainda, maior ainda,
florinha eucarística. Sofre, sofre, esposa querida, atrai a Mim os pecadores.
Atrai a Mim os pecadores; tu que és o íman atraente atrai-os a Mim, atrai-os a
Mim”.
(Cantou):
Vem, filho
meu, vem, filho meu, vem, filho meu, vem ao meu Coração de Pai;
Vem, filho
meu, vem, filho meu, ao meu Coração de Pai!
Escuta bem,
ouve o convite, ó filho meu;
Ouve o convite
do teu Jesus, do teu Jesus e Pai, e Pai!
Vem, filho
meu, vem, filho meu, não tardes mais;
Vem, filho
meu, vem, filho meu, vem, filho meu, não tardes mais, não tardes mais!
Escuta a minha
voz, voz dorida, voz dorida, voz sentida de profunda dor, profunda dor, profunda
dor;
Filho meu, não
peques mais; dor profunda, filho meu, não peques mais, não peques mais.
― Aqui estou, ó
Jesus, aqui estou, meu Amor, arrependida, aqui estou, meu Amor, arrependida!
Dá-me o teu amor, ó Jesus! Dá-me o teu amor, ó Jesus, e a cruz, e a cruz! Nunca
quero deixar o teu coração! Quero amar-te, ó Jesus! Quero amar-te e pedir-te
perdão, perdão. Perdão, Jesus, perdão, meu Pai. Perdão, Jesus, perdão, Senhor!
Perdão, Jesus, perdão, Amor! Dá-me a tua cruz, ó Jesus. Dá-me a tua cruz, ó
Amor. Dá-me o teu perdão, dá-me o teu perdão, dá-me o teu perdão, dá-me o teu
perdão.
― “Minha filha,
minha filha, esposa querida, minha filha, grande vítima deste calvário, deste
glorioso calvário. Minha filha, filhos meus, filhos meus, desce aqui a
Santíssima Trindade. À direita do Filho vem a Mãe Santíssima. A primeira bênção
da Santíssima Trindade é dada para o Santo Padre, para o representante do meu
Filho bem amado. A segunda é dirigida ao meu querido Cardeal, ao meu querido
Cardeal. Vai a terceira ao teu Prelado. Vai para ele, minha filha; todos se
encham da Trindade divina, que todos se encham mais e mais da luz do Espírito
Santo”.
― Ó Pai, ó Pai, ó
Filho, ó Espírito Santo, ó Mãezinha querida. Ó Pai, ó Espírito Santo, ó Mãezinha
querida, ó Mãezinha querida. Ó Pai, ó Filho, ó Espírito Santo, ó Mãezinha
querida, não posso com tanta fortaleza.
― “Vai por ti,
minha filha, uma nova bênção da Trindade Divina para aquele que Eu trouxe ao teu
encontro, luz e guia da tua alma, para na mesma vida mística de sofrimento
sangrarem os vossos corações, as vossas almas. Abençoo com o Pai, o Espírito
Santo aqueles que têm amparado a tua alma, aqueles que têm cuidado do teu corpo,
aqueles que têm defendido a minha divina causa como ninguém, como ninguém. A
nossa bênção de Trindade Augusta para todos os que te são queridos”.
― Ó Jesus, ó
Jesus, um bocadinho de espera. Os que me são queridos já sabeis quem entra.
Começai outra vez, começai com o Pai, o Filho, o Espírito Santo. A bênção e o
sorriso terno e meigo da Mãezinha querida para todos os que eu amo, para todos
os que me são caros, para todos quantos me rodeiam. Ó minha Trindade Augusta, ó
minha Trindade Augusta, para todos quantos me pedem orações, para todos os que
necessitam delas. O mundo inteiro precisa da Vossa bênção. Ai, como hei-de ficar
sem Jesus na minha cruz! Ai, como hei-de ficar sem Vós, Mãezinha!
― “Coragem, minha
filha, coragem! Não ficas sem o teu Jesus, não ficas sem o teu Jesus. Não ficas
sem a tua Mãezinha querida, a tua Mãezinha querida. Não podemos deixar-te, não
podemos deixar-te. Repito, digo o mesmo que disse aos seus Apóstolos: “Vou para
o Pai, mas fico convosco”. Finjo deixar-te para maior sofrimento, mas não te
deixo, não, minha filha, não. Depois de me amares, depois de me dares almas aos
milhões, aos milhões, depois de te abandonares inteiramente a Mim, como
deixar-te?! Confia, confia que não!”
― Adeus, ó Pai,
adeus, ó Filho, adeus, ó Espírito Santo, adeus, ó Espírito Santo. Adeus, ó Mãe
querida, até ao Céu, até ao Céu, até ao Céu, ó Mãe querida, até ao Céu, até ao
Céu, ó Mãe querida, até ao Céu, ó Mãe querida. Adeus, Jesus, adeus, meu Pai,
adeus, adeus, Jesus. Adeus, Amor, sede comigo, sede comigo na minha dor, na
minha dor. Não posso mais, ai, não posso mais, ó Mãezinha, ó Jesus. Um terno, um
terno adeus de saudade, um terno, um terno, um terno adeus de saudade te dou
hoje, ó Jesus, te dou hoje, ó Mãezinha da filha Vossa. Um terno, um terno adeus,
adeus de saudade te dá hoje, ó Jesus, te dá hoje, a vítima tua. Um terno adeus,
um terno adeus, ó Jesus, adeus, adeus, adeus, adeus, adeus até ao Céu, até ao
Céu, até ao Céu, ó Amor meu, ó Amores meus, ó Amores meus!
― “Coragem,
coragem! Confia, confia! Não é até ao Céu, não é até ao Céu, flor eucarística,
flor mimosa, pupila dos meus olhos, lírio puro, branca açucena, não é até ao
Céu, não é, minha esposa e virgem, ó minha vítima. Não é até ao Céu, não, ó
minha esposa amada, digna dos títulos mais honrosos que Jesus pode dar a uma
esposa e vítima imolada. Sou Eu, sou Eu a dar-te todos esses títulos.
Preparei-te também, minha filha, com a minha sabedoria divina. Estás livre de
toda a sombra de vaidade. Velarei por ti, velarei sempre. Velarei sempre até ao
fim da vida como até aqui tenho velado. Coragem, minha filha. Fala às almas para
quem foste criada. Fala às almas para quem foste escolhida. Tu és o porta-voz de
Jesus, tu és o farol de luz, tu és o farol do mundo, que dás ao mundo luz
divina, vida divina. Tu és minha, toda minha, ó esposa bela. Eu sou teu, teu,
todo teu, sempre teu.
Recebe a gota do
meu Divino Sangue. Fundidos os nossos corações num só coração. Espalhou-se o
sangue. Já passou para as tuas veias. Corre com a maior abundância. Foi maior a
dor, foi maior o alimento. Fica na tua cruz. Eu quero, eu quero que sejas
amparada na tua cruz. Haja luz, faça-se luz, a última vez. Depressa, depressa,
que já não é depressa a fazer-se a vontade do meu Divino Coração. Recebe mais
uma efusão do meu amor, o amor de toda a Santíssima Trindade, o amor da tua
Mãezinha querida. Fortalece-te, enche-te, enche-te. Mais amor, mais amor, mais
amor para mais dor, para mais dor. Coragem, minha filha, coragem, minha filha,
coragem”.
― Adeus, meus
queridos amores, adeus, adeus, adeus. Vou deixar-Vos, vou deixar-Vos. Adeus,
adeus, sede a minha força, sede a minha força, sede a minha força.
(Ouviu-se
ruído de beijos)
Foi para mim a
última bênção da Santíssima Trindade e da Mãezinha querida. Obrigada, obrigada,
o meu eterno obrigada. Permiti-me, não me leveis a mal que eu a distribua toda,
toda, toda por todos. Já sabeis por onde principio e onde eu acabo. Não me
leveis a mal. Perdoai, perdoai.
― “Minha filha,
minha filha, por despedida deste-Nos a maior consolação, a maior prova de amor,
de amor, de amor às almas por amor de Nós. Oh! Como consolaste, como consolaste,
oh! Como consolaste a Trindade Augusta e a tua Mãe celeste, a tua Mãezinha
celeste!
Vai em paz. Fica
na cruz. Fica na cruz! Coragem, coragem!”
― Adeus! Adeus!
Obrigada! Obrigada!
Nota:
este êxtase foi gravado e assistiram mais de 50 pessoas. Quase todas se
comoveram e choraram. Um sacerdote presente disse: “Poucas vezes tenho chorado
na minha vida, mas hoje chorei”. |