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Alexandrina Maria da Costa

SENTIMENTOS DA ALMA

Fevereiro 1942

Balasar, 19 de Fevereiro de 1942

Meu bom Jesus :

Sinto o meu coração retalhado pela dor. Terei ainda mais golpes para ferir-me ? Faça-se a Vossa vontade. Cravada na cruz convosco, escorendo sangue e na maior agonia, vejo-me e sinto-me de todos abandonada. Não posso viver no mundo, tenho medo. Jesus vinde depressa, vinde, levai-me para o Céu. Os homens tentam desviar de mim, arrancaram-me para sempre aquilo que me servia de alívio, que podia dar-me conforto. Tiraram-me o meu pai espiritual, proibem-no de me escrever a mim e de eu lhe escrever a ele. Permiti-me Vós, ao menos, meu Amado, desabafar convosco. Estou sozinha no meio da tempestade e ela não serena. Abro-vos o meu pobre coração, só Vós sabeis ler o que nele está escrito com dor e sangue, só Vós compreendeis e podeis avaliar o meu sofrer. O mundo desconhece-o, os homens nada compreendem. Deixai-me dizer a Vós o que Vós dissestes ao Vosso Eterno Pai : Perdoai-lhes, meu Jesus, porque eles não sabem o que fazem, estão ceguinhos, falta-lhes a Vossa luz divina : iluminai-os a todos e a todos dai o Vosso amor. O Jesus, todos os meus pressentimentos me tem saído certos. Poderão eles ainda proibirem que Vos receba sacramentalmente ? Ai de mim, seria como o golpe que me tiraria a vida se Vós com o Vosso divino poder me não conservásseis. Digam o que disserem, façam eles o que fizerem, o que nunca conseguirão é tirar-me desta união íntima com Vós. Roubarem-me Jesus Sacramentado, sim, não duvido que o façam ; tirarem-me do meu coração o tesouro riquíssimo que eu adora, que eu amo acima de todas as coisas, o Pai, o Filho, o Espírito Santo, nunca, nunca os homens o conseguirão : teriam para isso fazer-me viver sem coração e sem alma. Impossível ! Venha a força do mundo inteiro, seja ela toda contra mim : separar-me desta grandeza inifinita, deste amor infindo, nunca, só o pecado, só esse me pode separar. Mas eu confio plenamente em Vós, é de Vós, meu Jesus, que eu tudo espero, embora que o sentir da minha alma me chegue quase a persuadir que me engano a mim mesma. Sinto quem não Vos amo, sinto que nada de Vós posso esperar por tão grande ser a minha miséria. Que confusão a minha ! Que grande é o meu desfalecimento ! Levantai-me, meu Jesus, ajudai-me, assim pregada na cruz, a subir todo o caminho doloroso do calvário. Em cada degrau que passo quero deixar escrito com o sangue que das minhas feridas corre : Jesus, Jesus, não vejo o Céu, retirou-se de mim todo aquele azul do firmamento, perdi, roubaram-me tudo o que era vida. Só sinto dor, só sinto e vejo a morte. Não tenho a quem recorrer : só por Vós e pela Mãezinha posso chamar. Pobre de mim ! Quantas vezes com a minha dor não me atrevo a olhar-vos ! Ouvi-me sempre, mesmo que eu não vos chame ; dizei à Mãezinha que me ampare, dai-me toda a força do Céu. Todos os ruídos que oiço recordo o meu Paizinho Espiritual. Será elle que vem ? Que vida de ilusão. Cada pensamento que me vem à ideia deste tão duro penar são setas que se espetam no meu coração, são açoites que me despedaçam o corpo e a alma. Que mal fiz eu, que crime pratiquei ? O meu Jesus, se não fosse por Vosso amor, se não fosse o desejo ardentíssimo de vos dar as almas, recusava-me a tudo. Queria amar-vos muito, nunca ofender-vos para ganhar o Céu, mas não queria a crucifixão, não queria ouvir na terra a vossa doce e meiga voz, não queria ver a vossa Divina Imagem nem dolorosa nem gloriosa ; tinha uma eternidade inteira para contemplar-vos e para ouvir-vos falar. Perdoiai-me os meus desabafos, Jesus, bem vêdes que só convosco posso desabafar. Já que me escolhestes para a dor, ja que me destinastes para tão grandes martírios, eis a tua vítima, eis a tua escrava, Jesus ; fazei de mim on que quizerdes, a tua benção, meu Amado. Diz à Mãezinha que me abençoe e proteja. Sou tua mais indigna filhinha, pobre

Alexandrina

20 de Fevereiro de 1942

Jesus, venho ao vosso encontro. Onde estais Vós ? Não poderei encontrar-vos ? Ouvi ao menos as minhas mágoas. Se Vós me faltais, não tenho ninguém. Vistes-me na manhã de hoje orava na cruz convosco em tão grande agonia, com os olhos levantados para o Céu que senti e vi desaparecer sem a mais pequenina esperança de voltar a vê-lo e de nele poder entrar ? Que tristeza a minha de ver tudo perdido e sem remédio ! Uma vez descida da cruz, principiei a sujbir o calvário. Ia tão fraca ! Caminhava quase com o rosto em terra ; aqui e além caía, feria-me dolorosamente : ficava em sangue. Que medo, que pavor até, ao recordar-me que em pouco ia ser crucificada sem auxílio nenhum da terra. Valeu-me o vosso divino amor ; viestes Vós ao meu encontro.

— “Minha filha, faltam-te as forças humanas ; tem coragem, nunca te faltarão as forças divinas. O calvário é o caminho dos meus eleitos, o calvário é o caminho das minhas esposas, o calvário é o caminho das minhas curcificadas. É pelo calvário que eu dou o perdão aos pecadores, é pelo calvário que eu dou amor aos coracões. Ânimo, ânimo, minha louquinha, a tua Mãezinha e o teu Paizinho Acompanham-te, auxiliam-te numa união íntima”.

— Obrigada, meu Jesus. Animada com as vossas doces palavras fui para o Horto. Nunca vos encontrei, mas a vossa força divina venceu em mim. Senti ; logo no princípio o descaramento com que os soldados se apresentariam no Horto para a prisão. Senti que à frente viria Judas com todo o veneno em seus lábios. Senti no meu corpo os pontapès que um pouco mais tarde, quando me arrastassem pelas cordas, me haviam de dar. Tive no meu coração os Vossos sentimentos, quando víeis à vossa frente todos os pecados e crimes do mundo. Se com todos estes sofrimentos todas as almas se salvassem ! Mas ai, quantos ainda se perdem não se aproveitando do meu sofrer. O Jesus, senti o meu corpo banhar-se em sangue, ficando os vestidos pegados a ele e pegados à terra. Mas mais, muito mais ainda sofreu o Vosso corpo delicado e divino. Na flagelação e coroação de espinhos velastes sempre por mim. Ao abrigo e amparo de um amor santo e puro, senti inebriar-se-me a alma e numa suavidade e paz descansei por algum tempo.

Veio depois a Mãezinha tomar-me em seu regaço, apertou-me em seus braços, acariciou-me. Com tudo isto, tive muitas vezes que chamar por Vós e por Ela. Assustado com a tristeza e abandono, desfalecida a mais não poder, não tinha forças para caminhar. Sempre em vão indicava o Céu ; o abandono era total, tinha que ser sozinha que eu agonizava na cruz. Nessa dolorosa agonia cravou-se-me no coração uma lança ; tinha que sentirn toda aquela dor ainda antes de expirar. Pobre de mim, pobre da Humanidade que não conhece quanto sofrestes, ó Jesus !

Terminada a crucifixão continuei a viver aparentemente sozinha. Ia recordando a retirada que me fizeram do meu Paizinho Espiritual. Mais uma prova do vosso infinito amor, meu Jesus. Fizestes que o Sr. Doutor não só cuidasse de suavizar as dores do meu corpo, mas também que suavizasse a dor dolorosa e profunda da minha alma. Vós que tudo conheceis, serviste-vos dele para preparardes o meu coração para receber a último golpe. Obrigada, meu Jesus ; outra coisa não sei dizer. Deixai-me repetir convosco : A minha alma está triste até à morte. Perdi a luz, perdi tudo. A tua bênção e o teu perdão, meu Amor.

27 de Fevereiro de 1942

Jesus, dai-me as vossas forças divinas, quero a minha dor e sem elas nunca o conseguirei. Chore o meu coração noite e dia se assim o quiserdes, mas alegrem-se os meus olhos, sorriam-se os meus lábios. Seja o vosso santo amor e as almas toda a base do meu sofrer. Estou como a pombinha que nos ares dia e noite bate as asas ; não tem onde poisar, ampara-a o vosso poder. Faltam-lhe as forças, não pode continuar seu voo, cai por terra, não tem quem se compadeça dela se lhe faltais Vós. Jesus, sou eu que vagueio nos ares, sou eu a ser destruída pela tempestade, sou eu a mais indigna das vossas filhinhas em luz e sem amparo. O Jesus, não sabia eu que ainda tinha tanto para Vos dar. Que grande é a minha ignorância ! Pensava já ter-vos dado tudo ; enganei-me, viestes agora fazer a última colheita. Colhei tudo, colhei depressa e colhei-me depois para Vós. Dei-vos definitivamente no dia 20, até quando mo quiseres dar, o meu Paizinho Espiritual. Dei-vos no dia 24 toda a correspondência que dele tinha, a qual me serviu de luz e encaminhou para Vós. Vistes bem quão grande foi o sacrifício, não pelo apego que às cartas tinha, mas sim por me serem pedidas em dias de tanta dor. Quando as tomei nas minhas mãos e para as unir a todas as atava com uma fita branca, ouvistes, meu Amor, o que ia dizendo ? Jesus mas deu, Jesus mas tirou. Ao entregá-las para não mais lhe passar a vista dos olhos parece que todo o meu corpo estremeceu. Mas querendo fazer-me forte, murmurei sempre : Não é o meu Jesus digno de muito mais ? Tudo é pouco para Ele que tanto me ama e tudo deu por mim ; tudo é pouco para lhe salvar as almas. Depois disto, mandei que me tirassem da parede o seu retrato. Isto, meu Jesus, pouco ou nada podeis ter em conta ; eu não tinha por ele a mais pequenina estima, de boa vontade o mandaria lançar ao fogo. A dor que me causou foi só por ver que até com isso pegaram, que até isso servia de base para fazerem a quem estava in ocente. Meu Jesus, custa-me tanto servir de instrumento de sofrimento para os outros ! Contemplai todo o meu sacrifício e lançai os vossos olhares divinos cheios de compaixão.

Está próxima, Jesus, a minha crucifixão. Vêde-me na cruz cravada convosco, de olhos levantados para o Céu, que já não vejo, a bradar sempre : Jesus, Jesus, porque me abandonaste ? Estou sozinha, faltam-me todos os auxílios do Céu e da terra. Aceito para consolar-vos, tudo aceito, tudo sofro para que se fechem as portas do inferno.

Depois da crucifixão

Meu bom Jesus, velais sempre sobre mim, estais sempre a fortificar-me com a vossa graça e força divinas. Animastes-me dizendo :

— “Minha filha, minha loucura, é na tua crucifixão que está toda a salvação das almas. É no teu duro penar que está a minha consolação e na tua completa imolação que está a minha glória, é no teu calvário que está a minha completa alegria. Coragem, coragem ! Não te falta Jesus com a Mãezinha e o teu Paizinho. Tens en ti a graça divina”.

Caminhei para o Horto. Não se podem comparar as agonias e tristezas humanas com as Vossas. Quanto sofrestes por meu amor. Terei eu coragem de negar-vos alguma coisa ? Oh ! não, meu Jesus, não. Dai-me força para que eu não use de tal ingratidão. As trevas do Horto eram aterradoras. Todos os sofrimentos eram pavorosos. Os pecados do mundo eram a prensa mais dura que apertava o meu coração e o Vosso. Era o pecado, só o pecado a causa de todos os sofrimentos ; era o pecado que eu sentia a rasgar-me as veias ; era o pecado que afastava de mim o Céu, deixando-me no maior abandono, obrigando-me a suar sangue. Foi o pecado, só o pecado o algoz de toda a Vossa Paixão. Quanto Vos devo, meu bom Jesus, por sofrerdes em mim e me associardes a Vós. Já não podia resistir mais e segredou-me a Vossa voz divina :

— “Tens, minha filha, sempre à tua frente o amor do teu Jesus”.

Ó meu Amor, sinto desaparecer dia à dia, momento a momento, as forças do meu corpo e da minha alma ! Só quando Vós crucificado em mim poderei vencer. Eu já não vivo, porque tudo em mim é morte. Fui flagelada, fui coroada de espinhos, descansei no vosso divino Coração ; apertava-o com amor ao meu : prender-vos para sempre, não me separar mais de Vós eram os meus desejos. Tive uns momentozinhos que deixastes cair sobre mim a vossa divina Graça e uns raiozinhos do vosso Amor aqueceram o meu coração. Quando descansei na Mãezinha Ela unia aos meus os seus lábios santíssimos demorando-se assim todo o tempo do meu descanso. Isto não são consolações, meu Jesus, bem sabeis que tudo isso desapareceu para mim, são os auxílios que me dais, sem os quais era impossível a minha crucifixão. Fui para o calvário, a cada passo sentia-me cair por terra, a perder a vida. Estava pregada na cruz; das chagas escorria o sangue como dumas fontes. Os insultos que ouvia golpeavam-me todo o corpo. A dor do coração fazia-o ansiar com tanta força que parecia levantar-me o peito a pontos de o abrir. Chamar por vós, bradar ao Céu, tudo era inútil. Só trevas e abandono, só agonia mortal.

Ó meu Jesus, passou a crucifixão, a noite já vai alta e no alto do calvário estou eu de braços abertos, na cruz pregada, na noite mais triste e tenebrosa a bradar sempre: Ó Céu, ó Céu, ó Céu que me abandonaste. Ó terra que me desprezaste e me odeias. O meu brado perde-se num mundo de abandono, o meu eco perde-se num mundo que  não tem fim. Estou só, Jesus, a tiritar de frio e de fome. Estou cega, perdi a luz. Já não existirá no mundo, meu Amor? Todo ele é trevas, todo ele é cegueira. Juntai, meu Jesus, a este duro penar, a dor que me causa ao ser notada a falta do meu Paizinho aqui. Jesus, Jesus, permiti tudo, menos o escândalo; eu não quero que sejais ofendido, mas muito menos ainda naquilo que me diz respeito. Perdoai a todos, perdoai a mim e dai-me a vossa bênção, Jesus.

   

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