Em Aldreu,
Santa Eulália de Rio Covo e Chorente
A Alexandrina
tinha tios em Chorente e em Santa Eulália de Rio Covo (popularmente, Santavaia).
São ambas freguesias do concelho de Barcelos; se Chorente fica perto de Balasar,
Santa Eulália de Rio Covo fica bastante distante, na estrada que vai de V.N. de
Famalicão para Barcelos. Aldreu, de que aqui se começa por falar, essa fica
mesmo a norte do Concelho de Barcelos, já a confinar com Viana.
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Entre os
meus 17-18 anos, eu e a minha irmã partimos daqui para irmos a Aldreu,
com o fim de fazermos flores artificiais por conta das zeladoras e a
pedido do Pároco. Eu já andava doente. Fui para ajudar a Deolinda e
virmos
embora mais depressa. Hospedámo-nos na residên-cia do Pároco. Dois
rapazes dos lados de Viana foram lá e queriam namorar com a Deolinda,
mes-mo nas vésperas de virmos embora. Pediram ao Pároco para jogarmos as
cartas. Pusemo-nos à la-reira e o jogo passou-se em conversa. O Pároco,
quando nos viu, dirigiu-se aos rapazes assim: «Ai, ai! Então estou aqui
há quatro anos e nunca vieram cá jogar e hoje vieram?»
Na noite
seguinte, quando havíamos de vir embora, houve grande trovoada e chuva
que fez muita lama.
Igreja paroquial de Aldreu |
Sendo eu
muito doente, a sobrinha do Pároco em-prestou-me uns socos e a minha irmã
veio descalça. Um quarto de hora depois de sairmos de casa, de-satou a
chover novamente.
O sangue
espirrava-me dos pés, por causa do calçado não ser meu e por ter os pés muito
mimosos, pois havia
muito tempo que me não descalçava. As dores eram muitas e,
por fim, tive de me descalçar, molhando-nos todas. Quando chegámos à estação, o
com-boio tinha partido haviam passado cinco minutos. Minha irmã desatou a chorar
ao ver como eu estava.
Eram nove horas da
manhã. Só havia comboio às 11 horas, mas só parava em Barcelos; não nos convinha
esse comboio. Esperámos na estação. Apare-ceram uns professores de Aldreu que nos
levaram a tomar café.
Só continuámos a
viagem mais tarde, até que chegámos a casa da tia em Santa Eulália. Ela
preparou-nos uma boa refeição e não queria que viés-semos embora por nos ver
cansadas e ser tarde.
Teimámos e
prometemos vir só até Chorente, onde vivia a tia Felismina. De lá viemos até
Balasar, onde chegámos alta noite. Batemos à porta, mas a
mãe não estava em
casa.
Uma vizinha disse:
«Olhem, a Sra. Matilde está a morrer.» A vossa mãe es-tava lá. Fomos ter com ela.
No dia seguinte fui a
casa
da moribunda. Uma sobrinha dela disse-me: «Precisava tanto de ir a casa…» Eu
respondi: «Vá, que eu fico.» E ela: «Não tens medo? – Eu não tenho medo nenhum!»
Daí a pouco, a Sra. Matilde agonizava. Eu rezei sempre aquilo que entendia, mas
sem medo nenhum.
O episódio
seguinte é anterior ao já contado e decorreu em Santa Eulália de Rio Covo.
Em
Santa Eulália de Rio Covo (tinha eu os meus 11 ou 12 anos) viviam meus tios que
adoeceram com uma febre intitulada a espanhola. Minha avó foi tratar deles, mas
adoeceu também. Para olhar por eles foi minha mãe que também ficou doente. Por
fim, fomos nós, apesar de ser novinhas. O meu tio morreu à noite e ficámos lá
até à Missa do sétimo dia.
Foi preciso ir ao
arroz, mas tinha que passar pelo quarto onde meu tio morrera. Ao chegar à porta
do quarto, senti-me tomada de medo. Não entrei. A minha avó veio dar-mo.
À noite, era
preciso ir fechar a janela. Chegando à parte da sala, disse comigo: «Eu hei-de
perder o medo». E passei de-vagar, mesmo com esta intenção. Abri a porta, passei
por onde tinha visto o cadáver e fui ao quarto onde ele morreu.
Desde então, nunca
tive medo. Venci-me a mim mesma, à minha custa.
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